Os especialistas não têm dúvidas de que a seguir à confirmação de uma vacina, o mundo vai ter de lidar com outros problemas, desde logo garantir a sua distribuição global e o acesso sem limitações aos países mais pobres, o que pode ser feito através de financiamentos da comunidade internacional, mas criar condições técnicas para a sua distribuição, redes especiais de armazenamento refrigeradas, por exemplo, pode ser um desafio impossível de alcançar para, pelo menos, algumas das vacinas em fase final de testes.

E é disso exemplo a vacina anunciada pela Pfizer, em colaboração com a BioNTech, que garante 90% de eficácia... mas a sua fórmula, que inclui complexo material genético, obriga a que esta seja conservada, para garantir a sua qualidade, a temperaturas negativas de 70º, o que, para muitas regiões do planeta, é muito difícil de conseguir, senão impossível.

África é um bom exemplo, como admitiu ao Novo Jornal um técnico de laboratório farmacêutico, onde em muitos países, se é impossível levar peixe fresco ou fruta e vegetais frescos para as áreas mais afastadas dos centros urbanos, muito mais complexo vai ser garantir que uma vacina com este grau de exigência ali chega porque se trata de regiões, normalmente, com temperaturas e humidade muito elevadas e onde as redes de frio e armazéns refrigerados, já para não falar da ausência de fornecimento de energia continuado, são muito raros ou mesmo inexistentes.

Mas este problema espalhar-se-á por vastas regiões da Ásia e da América Latina igualmente, onde escasseiam infra-estruturas e tecnologia que possam garantir uma cadeia de frio com as condições mínimas exigidas para a conservação de uma vacina com estas características, no máximo, 70º negativos.

E os grupos terroristas?

Um outro problema que o mundo vai ter de analisar em breve, logo que as vacinas estejam disponíveis, é o que fazer com grupos terroristas, como os agregados ao "estado islâmico" ou à al-Qaeda, desde logo os africanos Boko Haram, al-Shabab, entre outros, mas também nas vastas regiões desérticas do Médio Oriente.

As Nações Unidas devem ou não permitir o acesso destes jihadistas à vacina? Ou mesmo nos países em conflito armado?

A Convenção de Genebra garante que os prisioneiros devem receber todos os cuidados médicos que assegurem a sua sobrevivência face a doenças de todo o tipo, mas os tratados internacionais não são, por norma, explícitos na forma como a comunidade internacional deve comportar-se nestas situações, onde a humanidade tem interesse claro em que, mesmo os radicais islâmicos que espalham terror pelo mundo, acedam à vacina.

Há contudo normas éticas e legais internacionais que exigem que em situações de guerra, as partes sejam tratadas por igual em caso de pandemia, como é o actual face ao avanço da Covid-19.

Uma das soluções admitidas por alguns analistas é que estes grupos sejam apoiados nesse acesso à vacina através de organismos internacionais com vínculo mais próximo à igrejas cristãs ou ao Islão.

Isto, porque é facto dado como adquirido que qualquer plano de erradicação da Covid-19 através de uma vacina tem de garantir que não permanecem sem acesso a este medicamento grupos populacionais em locais esconsos do planeta porque isso seria um perigo para o resto da humanidade tendo em conta que se o vírus se mantiver livre em algumas comunidades poderá sofrer mutações que lhe permitam furar as barreiras de imunidade proporcionadas pelas vacinas.

A Organização Mundial de Saúde estima que pelo menos 70% da população mundial tem de ser inoculada com uma vacina para garantir a imunidade global, sendo que a Ásia, com 4,6 mil milhões de pessoas, e África, com mais de 1,2 mil milhões, perfazem bastante mais de metade dos cerca de 7,5 mil milhões de habitantes do Planeta Terra.

Para já, de acordo com o ministro da Saúde das Filipinas, Francisco Duque, país que conta com condições bastante melhores que a maior parte dos países africanos, citado pela Reuters, este país não vai poder usufruir de uma vacina com estas características visto não contar com infra-estruturas de frio adequadas a essas exigências.

Todavia, a Pfizer está consciente destes prolemas e, ainda segundo a Reuters, já fez saber que ao mesmo tempo que desenvolvia a sua vacina, mantinha em curso a preparação de condições que facilitem o acesso à vacina em locais sem condições adequadas, nomeadamente no que diz respeito aos "detalhes logísticos" e ao equipamento de armazenamento tecnologicamente avançado do seu produto para que este chegue aos locais mais reconditos.

O problema da refrigeração vai incidir igualmente nos países mais ricos onde estudos existentes, como é o caso da Coreia do Sul, apontam para que apenas 40% dos seus hospitais estejam equipados com condições de refrigeração adequadas a este tipo de vacina. O mesmo sucede em vários países europeus.