Os últimos anos têm sido muito desafiantes para os artistas, com o encerramento das salas de espectáculo, devido à Covid-19. Como tem sobrevivido musicalmente?

É um período desafiante não só para os artistas, mas também para toda a sociedade. Estamos a viver um momento atípico, estamos todos a atentar readaptar-nos e a ver como podemos levar o nosso trabalho adiante. É um ano desafiante, não que nos anos anteriores as coisas fossem fáceis, mas agora estamos num formato diferente, sem grandes públicos, reduzidos a restaurantes e bares. Particularmente, não é algo que me incomoda muito, porque gosto de espectáculos de carácter intimista. Mas, a gente sente falta do nosso público, e acredito que eles também sentem a nossa falta. Temos de nos adaptar a essa nova realidade, e é o que estamos a fazer.

Inicia a carreira musical nos finais dos anos 90, com o álbum Meu Lado Zouk, sendo, na altura, uma das vozes femininas mais sonantes do País. Hoje, mais de 20 anos depois, embora muitos dos artistas com os quais partilhava palco tenham desistido, continua a alegrar os seus fãs. Qual é o segredo dessa resiliência?

Sou uma artista bastante focada, bastante determinada nas coisas que quero, sempre soube que iria construir uma carreira. Se reparar, sou uma artista que não tem muitos álbuns no mercado, lanço álbuns quando tenho histórias para contar, sejam elas minhas ou de outras pessoas, por outro lado, tenho o facto de a música ser a minha grande paixão. Quero fazer músicas que sejam intemporais, acho que vim ao mundo para deixar alguma coisa, e é nisso que me foco. Penso que os anos de carreira não determinam muito. Outra coisa, nunca estive preocupada com o imediatismo. O meu foco é levar a minha música aos meus fãs, de uma forma que várias gerações a possam ouvir. Eu tenho uma música que gravei há 20 anos, que é o Um Sol para Cada Dia, que é das que continuam a ser as mais pedidas nos espectáculos.

Em 2011 lançou o álbum Butterfly Eleven (borboleta onze), nos Estados Unidos da América. Parecia iniciar uma carreira internacional, mas hoje vemo-la mais por cá. Porquê?

Nesta altura, eu vivia nos Estados Unidos da América e, musicalmente, consumia tudo que era deles. E, desde o início da minha carreira, fui bem clara: eu cresci com influência de Soul e R&B norte-americanos, porque o meu pai foi músico. Cresci a ouvir Louis Armstrong, Otis Reding, Percy Sledge e Aretha Franklin e tenho essas influências na minha musicalidade, sem tirar, obviamente, que eu tenho um gosto bastante ecléctico em relação à música e ouço tudo. Quando eu fiz o álbum Butterfly Eleven, estava a viver nos Estados Unidos, para mim fazia todo o sentido fazer um CD que fosse maioritariamente em inglês. Acho que a música feita em Angola e por angolanos é música angolana, independentemente do estilo e da língua que se cante. Quanto à ambição particular de músicos que quererem internacionalizar a sua carreira, acho que é benéfico. Por exemplo, ganhei muitos prémios fora, aliás, fui a primeira artista feminina a ganhar prémios fora de Angola. E tudo serviu para elevar o nome do País.

Muitos questionam o segredo por trás da boa aparência física que tem, pois, apesar do tempo, continua jovem. Afinal, qual é o segredo?

(Risos) se calhar deve ser a genética. Os meus pais também parecem muito mais jovens do que na verdade são. Ou, se calhar, é pelo facto de eu ter uma estatura pequena e pelo facto de eu estar de bem com a vida e aceitar, principalmente no meu ramo, na área musical, que não há momentos constantes de pico: onde as pessoas estão sempre no auge. Aceito bem essas variações. Tenho um foco, que é levar a música para o meu público. Eu tenho um público que me é muito fiel, e isso ajuda-me a estar bem. Estamos num ano atípico, mas nem tudo foi mal, pois, este ano, aproveitei parar um pouco, para compor e reflectir sobre tudo quanto é importante.

No seu entender, quais os principais desafios do mercado musical angolano?

Os desafios continuam a ser os mesmos. Penso que a forma como olham para os músicos e para a nossa classe tem de mudar. Não estamos aqui para mero entretenimento de algumas pessoas. Somos uma classe que deve ser olhada com carinho, porque um país sem cultura não funciona. Muito do que acontece no nosso mercado é por esforço individual dos artistas, embora não trabalhemos sozinhos. Há anos que o Ministério da Cultura devia olhar mais para a nossa música. Lembro-me de que há muitos anos, muitas vezes paguei os meus bilhetes para trazer prémios para Angola. Estou registada na Sociedade Portuguesa de Autores, porque infelizmente não temos uma sociedade de autores em Angola, que funcione. Não é que ela não exista, é que não funciona. Continuamos a ver casos de artistas que fizeram música a vida toda e não têm os seus direitos salvaguardados, e isso é uma realidade em que todos nós, artistas, devíamos unir-nos para mudá-la.

Recentemente, a Sociedade Angolana de Direitos de Autor (SADIA) e a Unison anunciaram a assinatura de um acordo para a cobrança de direitos digitais na União Europeia e no Reino Unido. É uma boa notícia.

Deus queira que, de facto, as coisas funcionem, porque não acho justo, por exemplo, as nossas músicas tocarem nas rádios e nos canais de televisão e não recebermos nada. Lá fora tudo isso é salvaguardado, ou seja, os artistas não precisam de se valer de ter hit [música que faz muito sucesso] para que possam ter dinheiro.

É uma situação que deve ser alterada.

Sim, com urgência.

Fale-nos dos trabalhos musicais em carteira.

Lancei dois singles no início do ano, o Sempre Foste Tu e o Já te Conheço, com Rui Orlando, que já atingiu mais de dois milhões de visualizações em tão pouco tempo. Estou muito feliz por isso. Estamos a trabalhar no E.P que vamos lançar em Novembro. Para mim, nesta altura, não faz muito sentido lançar um álbum, devido à conjuntura. Temos também em carteira projectos sociais, mas que prefiro ainda não avançar detalhes.

Recentemente, entrou para a LS Republicano. Como está a ser essa nova etapa da sua carreira?

Está a ser muito bom. Tenho uma relação profissional e de amizade longa com o Republicano. Nesta altura da minha vida, já não dá para trabalhar sozinha, precisava de ter uma estrutura maior e penso que, actualmente, não há uma produtora maior que a LS.

No princípio de Junho, assinou contrato com a Fortaleza Seguros, através do qual passou a fazer parte dos activos de comunicação da seguradora. Quer falar sobre essa parceria?

É um desafio. Sinto-me muito lisonjeada pelo facto de estarmos juntos nesta parceria. Penso que vamos fazer um trabalho muito bom, vamos crescer juntos. A Fortaleza tem um leque de produtos e serviços disponíveis, muito virados para o seguro de saúde, que acho importantíssimo, sobretudo nesta fase, em que o País, em particular, e o mundo, em geral, estão a ser assolados pela Covid-19.

Uma mensagem para os artistas da nova geração.

É importante perceber que a carreira musical não é um trabalho fácil, é preciso muita disciplina, foco e dedicação. Talento não basta, é necessário muito trabalho e dedicação. Contudo, nunca devemos desistir dos nossos sonhos.