Na semana passada, depois do Presidente norte-americano divulgar a sua "declaração de guerra comercial" a quase todos os países do mundo, excepção feita, entre poucos mais, à Rússia e à Coreia do Norte, da China e da União Europeia chegaram ameaças de retaliação.

Em Pequim, a resposta foi quase imediata, com a aplicação de taxas de 34% às importações Made in USA, e na União Europeia começaram a aparecer nos media anúncios da retaliação com a taxação de uma vasta lista de produtos importados dos Estados Unidos.

O efeito foi imediato e na semana passada além da queda bolsista geral e pesada, em três dias, o crude perdeu quase 8 por cento, caindo dos 74 USD por barril de Brent, a referência maior para as ramas exportadas por Angola, para os 64 USD... mas não iria ficar por aí.

Já esta segunda-feira, 07, no que foi acentuado por um relatório da Goldman Sachs onde esta casa financeira prevê que a guerra tarifária de Donald Trump vai atirar a economia do mundo para uma recessão severa, o barril de Brent voltou a "esvaziar".

De tal modo que perto das 08:40, hora de Luanda, o barril de Brent estava a perder mais 4,45%, estatelando-se nos 62,66 USD, mais de 7 dólares abaixo do valor médio de referência usado pelo Governo angolano para elaborar o OGE 2025... e um recorde negativo de mais de quatro anos.

Um cenário que se se mantiver, pode ser uma dor de cabeça excruciante para a equipa económica de João Lourenço - onde uma revisão do OGE não pode ser afastada totalmente -. já a braços com um quadro severo na inflação, uma crise cambial galopante e números em agravamento na pobreza e no desemprego.

Isto, porque, como é sabido, Angola é um dos países cuja economia mais depende das exportações de energia, especialmente o petróleo, que ainda responde por cerca de 90% das exportações, 35% do PIB e 60% das receitas fiscais, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.

O actual cenário internacional, que não era tão dramático há anos, tende a empurrar os preços para ainda mais longe do valor estimado no OGE 2025, que é de 70 USD.

Essa a razão pela qual Angola é um dos países mais atentos a estas oscilações, devido à sua conhecida dependência das receitas petrolíferas, e a importância que estas têm para lidar com a grave crise económica que atravessa.

E por detrás deste cenário dramático na perspectiva dos exportadores da matéria-prima mais dependentes desse sector, como é Angola, está a guerra lançada por Trump ao espalhar taxas pelo mundo de forma quase aleatória, como o parece mostrar a aplicação que "calhou" às ilhas da Antártida Heard e McDonald, que são apenas habitadas por pinguins.

Apesar destas ilhas não serem habitadas, elas são, na verdade, territórios administrados pela Austrália, que, explicam as autoridades tarifárias norte-americanas, podem servir como entreposto para contornar as tarifas, mas permite, ainda assim, evidenciar que a Casa Branca está a apostar as fichas todas nesta "guerra" e a não querer deixar pontas soltas.

Com tarifas espalhadas nos quatro cantos do mundo, a maior economia mundial gerou uma vaga de críticas e de contra-medidas, como a China já fez e os europeus apresentam hoje o seu plano retaliatório, abre caminho a uma recessão igualmente global, como nota generalidade dos analistas.

E com os mercados a anteciparem já uma redução substantiva do comércio global e uma recessão mundial ao virar da esquina, como aponta a Goldman Sachs, entre outros, o petróleo é o sector onde os efeitos nefastos chegam primeiro...

E a acrescentar a este cenário aterrador para as economias petrodependentes, a OPEP+, organização que junta desde 2017 os Países Exportadores (OPEP) e a Rússia, entre outros "independentes", não podia ter escolhido pior o timing para iniciar o seu plano de reposição da produção que reduziu nos últimos anos para manter os mercados equilibrados.

E começou, com mais 138 mil bpd desde 01 de Abril, sem ter ainda feito ainda qualquer alteração a esse plano que prevê manter a retoma nos próximos meses ao longo do ano de 2025, repondo pelo menos pate significativa dos cerca de 6 mbpd enxaguados desde 2020, ano focal da pandemia da Covid 19.

E no que diz respeito a Angola, apesar de ser o 2º maior produtor subsaariano, se no caso das tarifas pouco ou nada pode fazer para mudar o mindset de Donald Trump, na OPEP deixou de ter qualquer peso depois de abandonar a organização no início de 2024.

Apesar deste quadro depressivo para o sector petrolífero actual, nem tudo parece ser aterrador para o futuro próximo, porque tanto a Goldman Sachas como alguns bancos de referência, ainda mantém, mesmo com uma ligeira correcção em baixa, a perspectiva de que o barril de Brent estará, no fim do ano, ainda acima dos 70 USD de médio para os 12 meses.

Olhando para esta crise tarifária a partir de Luanda, o Executivo de João Lourenço pouco ou nada pode fazer para tirar drama a este filme que já se viu noutras épocas, mas o Governo deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,1 mbpd.

O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.

Aliás, o Governo do Presidente João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.

Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.

A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.