Os misseis israelitas atingiram a sede do Hamas em Doha a 09 de Setembro, gerando uma convulsão global, que levou mesmo os EUA a garantirem que Israel, o seu principal aliado no Médio Oriente, não voltaria a cometer o mesmo erro.
O erro a que se referiu o próprio Presidente Donald Trump foi Israel ter atacado um aliado norte-americano de peso, como é o Catar, onde Washington tem a sua maior base militar na região, não porque o Catar era o placo das negociações entre Telavive e o Hamas para estabilizar Gaza.
Até porque Israel já abateu líderes do Hamas em Beirute, no Líbano, Teerão, capital do Irão, Damasco, na Síria, entre outros locais, com a intervenção da sua "secreta" mais conhecida, a Mossad, mas nunca tinha feito um ataque com misseis americanos disparados de aviões americanos com alvos, provavelmente, definidos através dos satélites norte-americanos.
Logo a seguir a este ataque, o primeiro-ministro Benjamin Netanyhau justificou-o lembrando que os "terroristas são para abater estejam onde estiverem", o mundo árabe muçulmano no Médio Oriente realizaram um encontro alargado em Doha tão raro, ou ainda mais, que o ataque israelita na capital de um aliado relevante dos EUA, que iria sempre enfurecer, pelo menos na retórica, a Casa Branca e em Telavive isso era mais que sabido...
Na capital do Catar, a 16 de Setembro, menos de uma semana após os 10 misseis Hellfire terem atingido a sede do Hamas em Doha, a alguns quarteirões desse local, dezenas de líderes dos países árabes e muçulmanos, da Arábia Saudita à Turquia, passando pelo Irão, Iraque ou a muito cautelosa, e o país árabe mais "amigo" de Israel, Jordânia, condenaram a ousadia israelita, mas não só...
Estes países, que não estavam juntos há largos anos, se é que alguma estiveram todos na mesma sala com o mesmo propósito, além das Assembleias-Gerais da ONU, exigiram ainda aos EUA que travem a crescente e letal agressividade israelita, que imponham a Telavive um calendário claro de negociações para a paz em Gaza e anunciaram a preparação de medidas para a sua defesa comum.
Apesar de não ter sido dado nenhum passo concreto nesse desígnio, estes países admitiram encetar conversações para a criação de um mecanismo de resposta comum a ataques externos, naquilo que os analistas afirmam ser semelhante ao Artigo 5º da NATO, que garante que todos os 33 países da Aliança Atlântica (Europa Ocidental e EUA e Canadá) contra-atacam o agressor inicial.
Apesar desse tipo de mecanismo ser de muito complexa aplicação, desde logo porque o Irão, que está em situação de guerra iminente com Israel faz parte do grupo de países convidados para este encontro de urgência em Doha pelo Emir do Catar, Hamad al-Thani, alguns analistas admitem que nada será como dantes no Médio Oriente.
Isto, porque o ataque ao Hamas em Doha, numa flagrante violação do espaço soberano de um país, demonstrou que as acções de Israel não são medidas por qualquer tipo de ligação diplomática ou atendem ao xadrez de interesses, como seria o caso o Catar devido à sua proximidade com os Estados Unidos.
Além da possibilidade de uma corrida às armas como nunca foi visto, existe a possibilidade de os países mais robustos economicamente, ou tecnologicamente, como a Arábia Saudita, o Irão e a Turquia, poderem mesmo ver-se obrigados a avançar para criar o seu próprio arsenal de armas nucleares, visto que essa parece ser a única forma efectiva de dissuasão para Telavive.
Alias, Israel é o único país do Médio Oriente que comprovadamente possui ogivas nucleares próprias, embora a Turquia possua esse tipo de armamento no contexto da NATO, sendo que a "arma nuclear islâmica" é normalmente vista como sendo o Paquistão, que, não correspondendo geograficamente ao Médio Oriente, faz fronteira com o Irão, o que o liga a esta região de facto.
E em Islamabad não é raro que o Governo paquistanês "ofereça", como o fez na recente fase de guerra entre o Irão e Israel, o seu arsenal nuclear como protecção contra qualquer ameaça desse género feita por Israel, como sucedeu recentemente, quando o ministro da Defesa, Israel Katz, deixou essa ameaça de forma subliminar com a possibilidade de Teerão arder por completo.
Isso mesmo está agora a acontecer com a Arábia Saudita e o Paquistão a anunciarem ao mundo um Pacto de Defesa Mútua que é, claramente, direcionado para a ameaça israelita, porque, apesar de os sauditas terem uma histórica relação difícil com o Irão, os paquistaneses já ofereceram o mesmo tipo de "protecção" a Teerão.
Nalguns media internacionais está a ser noticiado, através de fontes anónimas a partir de Riade que os sauditas avançaram agora para este pacto com o Paquistão, depois de terem reatado as relações diplomáticas com o Irão, através de mediação russa e chinesa, porque deixaram de poder confiar no seu histórico aliado que são os EUA no controlo das "garras afiadas" de Telavive.
Com este movimento entre Riade e Islamabad, Telavive já conseguiu o impensável: afastar aqueles que eram, até aqui, os países com os quais mantém há décadas melhores relações devido à influência norte-americana, que é a Arábia Saudita e o Catar, além de que daí resultou igualmente um histórico reaproximar entre a Turquia e o Irão, o Irão e a Arábia Saudita ou mesmo a Jordânia que, sendo o mais vulnerável dos aliados dos EUA na região, "ousou" estar em Doha para condenar o ataque israelita à sede do Hamas na capital do Catar.
Com a dispersão das atenções de Washington pelos vários cenários em que tem interesses, desde logo a guerra na Ucrânia, bem como a crise interna, não apenas económica mas com a questão da segurança dentro dos EUA, depois do assassinato de Charlie Kirk, (ver aqui) a ter consequências dramáticas no xadrez local, resta saber se Donald Trump tem bombeiros suficientes para apagar o "fogo" que Israel pode ter ateado com o ataque ao Hamas em Doha.