Além do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyhau, mais ninguém surgiu a aplaudir a mirabolante ideia do Presidente dos EUA que tem como pilar limpar Gaza da sua população palestiniana para reconstruir o território totalmente arrasado por 15 meses de ininterruptos bombardeamentos israelitas.
Ao expor o seu plano, Trump, ladeado pelo chefe do governo israelita, em Washington, admitiu que se fosse preciso poderia enviar unidades militares norte-americanas para garantir a execução do seu plano.
De todo o mundo chegaram vigorosas críticas a esta ideia, desde logo dos países árabes vizinhos, nomeadamente o Egipto e a Jordânia, que recusaram abrir as fronteiras para permitir a "limpeza étnica" de Gaza, e ainda da Arábia Saudita, dos Emiratos Árabes Unidos, do Irão e da Turquia.
A China, cujo embaixador na ONU, Fu Cong, disse tratar-se de "uma ideia para além de qualquer compreensão", a União Europeia, que, perante a fragilidade da actual Comissão, liderada por Ursula Leyen, deu lugar à recusa generalizada dos Estados-membros, onde até a alemã Annalena Baerbock, ministra dos Negócios Estrangeiros, uma notória amiga de Israel, veio dizer não ser possível resolver o problema da Palestina nas costas dos palestinianos.
Ninguém parece ter querido ficar de fora desta recusa unânime ao plano de Trump.
Do Brasil veio a reacção mais vigorosa, pela voz do seu Presidente, Lula da Silva: "Os EUA participaram do incentivo a tudo que Israel fez na Faixa de Gaza", logo "não faz sentido" Trump reunir com o Governo de Israel e anunciar que vai "ocupar Gaza, que vai recuperar Gaza, que vai morar em Gaza".
"E os palestinos vão para onde, onde vão viver? Qual o país deles?", questionou Lula em entrevista a rádios locais brasileiras durante uma visita ao estado de Minas Gerais.
Em Moscovo, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, insistiu na ideia de que só a fórmula dos "dois Estados" pode servir para abordar a questão palestiniana porque "é a que colhe mais apoio global" e não é razoável estar a procurar alternativas ao que o mundo na decidiu, incluindo no Conselho de Segurança da ONU.
Todos contra, excepto Israel, que não apenas aplaudiu o génio de Trump, com Netanyhau a afirmar que "não há nada de mal neste plano", que é "a melhor ideia de sempre", que vai "criar um futuro melhor para todos" e que o seu autor é "é o melhor amigo que Israel já teve na Casa Branca".
E o ministro da Defesa, Israel Katz, ordenou de imediato às Forças de Defesa de Israel (IDF) que dessem início à preparação para apoiarem o processo de saída da população de Gaza para o Egipto e para a Jordânia, que, apesar de terem recusado a ideia, segundo Donald Trump vão rever as suas posições. Como?, não explicou.
Mas não passou ao lado de alguns analistas Trump ter avançado como argumento para justificar o seu plano a destruição total de Gaza, o facto deste ser "um território inseguro", com "muitos perigos dentro, incluindo explosivos por rebentar", onde vai ser preciso "demolir mesmo os prédios que não foram arrasados" para "evitar acidentes, devido à sua deterioração"... ao lado de Netanyhau, o responsável por essa mesma destruição.
Questionado na Casa Branca como é que mantinha essa ideia em cima da mesa quando jordanos e egípcios já recusaram receber os mais de 2 milhões de palestinianos, Trump, sem explicar como faria o Rei da Jordânia, Abdullah II, e o Presidente do Egipto, Abdel Fattah El-Sissi, mudar de ideia, garantiu que "eles vão acabar por aceitar".
Além da destruição de Gaza, um território com 365 kms2, numa extensão de 40 kms de linha de mar por 9 de largura, com 2,3 milhões de habitantes, no que é uma das mais altas densidades populacionais do mundo, onde morreram, desde 07 de Outubro de 2023, mais de 46 mil pessoas, oficialmente, sendo que por debaixo dos escombros poderão estar mais de 100 mil corpos de desaparecidos.
Entre os mortos confirmados pelas autoridades locais e pelas Nações Unidas, estão mais de 20 mil crianças, sendo que quase 85% das vítimas são crianças, mulheres e idosos, com os sobreviventes deste "genocídio" israelita, como acusam os Tribunais Penal Internacional (TPI) e Internacional de Justiça (TIJ), a sobreviverem em campos improvisados num território onde não ficou intacto nenhum hospital escola ou infra-estrutura social de apoio humanitário.
Face a este cenário, em que o próprio Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, veio publicamente apelar a que o mundo se empenhe em evitar "qualquer acto de limpeza étnica" em Gaza, que é o que o chefe da ONU pensa ser o plano de Trump.
Ao que estas primeiras horas de "choque e pavor" após o lançamento deste "programa" permitiram perceber, a frente Trump-Netanyhau não parece ser capaz de resistir à gigantesca vaga global de críticas e acusações, tendo ambos levado os seus países a abandonar esta semana o Conselho das Nações Unidas para os Direitos Humanos, normalmente um palco de grande visibilidade para as atrocidades globais onde estas são expostas e condenadas.
É que, ainda no final de quarta-feira, o secretário de Estado, Marco Rubio, que responde pela diplomacia norte-americana, veio atalhar caminho garantindo que os EUA não vão enviar militares para Gaza em nenhuma circunstância, desfazendo assim essa possibilidade criada pelo próprio Trump, que disse que se fosse necessário enviaria a tropa.
Rubio explicou que o plano de Trump "não é hostil" e que é apenas uma forma de garantir a reconstrução do território para que as pessoas possam, depois, regressar, o que também contradiz as declarações do seu chefe.
Ao anunciar o seu plano, Trump disse que Gaza seria no futuro "uma Riviera do Médio Oriente", comparando com as famosas Rivieras italiana ou francesa, ou mesmo na Florida, EUA, conhecidas em todo o mundo pelo seu turismo de luxo e resorts para milionários, onde passariam a viver "pessoas de todo o mundo".
A ideia de Trump pode não ter pés para andar, mas há analistas que isso pode surpreender muitos mas não a ele, porque uma ideia destas tirada assim da manga, sem aparente viabilidade pode ter como objectivo desviar as atenções dos media de prolemas mais sérios que o Presidente dos EUA enfrenta neste momento.
Dois deles são a questão das tarifas com que ameaça há meses chineses, russos, canadianos, mexicanos e que, agora, começa a recuar um atrás de outro, sendo uma das razões os efeitos negativos que teriam na inflação nos EUA; e o outro é a questão da guerra na Ucrânia onde as "24 horas" para acabar com o conflito já passaram há muito, mesmo que se trate de um marco simbólico.