O Presidente da Ucrânia não perdeu tempo e está a tirar dividendos da crise político-militar que abalroou a Rússia na sexta-feira com a insurreição tentada por Yevgeny Prigozhin, líder dos mercenários do Grupo Wagner, deslocando-se à linha da frente, no Donbass, para elogiar as suas tropas e agradecer-lhes o empenho nos combates que "vão garantir a vitória da Ucrânia" em breve.
Volodymyr Zelensky diz mesmo que os avanços ucranianos "são evidentes em todos os sectores" da frente de guerra, cuja extensão passa os mil quilómetros, embora estas certezas sejam de muito difícil confirmação, até porque do outro lado das trincheiras se conta uma história diferente, onde os ganhos são russos e a contra-ofensiva de Kiev está a colapsar nos seus intentos.
"Estamos a vencer os racistas russos através da acção heróica dos nossos bravos soldados", disse o líder ucraniano, que é visto em vários vídeos a cumprimentar os seus militares, e a dizer alto a "honra sentida" com esta visita e a agradecer o esforço dos seus comandantes e soldados por "estarem a proteger o país, a soberania, as famílias e os filhos da Ucrânia".
Na visita que fez aos seus homens a escassos quilómetros das sangrentas trincheiras, quando ainda se ouviam os ecos da rebelião de Prigozhin em Moscovo, Zelensky congratulou-se pelo "dia feliz" que encontrou no mapa dos avanços ucranianos e disse aos militares que "o país precisa de mais dias assim" porque é com estes sucessos que se ergue o calendário da derrota russa e do triunfo da Ucrânia.
O objectivo evidente do líder do regime ucraniano com esta investida sobre a frente de combate é, claramente, tirar proveito da confusão gerada pelo motim Wagner, dando como certo que a ausência dos aguerridos mercenários de Prigozhin das trincheiras levaria a um desfalecimento da moral russa para combater.
Esse facto, segundo alguns analistas, terá efectivamente sucedido momentaneamente, porque os homens de Prigozhin estava posicionados na retaguarda dos combates, depois de limparem Bakhmut, para servirem de tampão a um eventual avanço ucraniano sobre as linhas de defesa russas erguidas nos últimos meses, enquanto Kiev anuciava alegremente que mais cedo ou mais tarde lançaria as suas brigadas criadas pela NATO sobre os invasores.
Mas foi, ao que tudo indica, sol de pouca duração, porque as forças russas, que estão rapidamente a substituir os homens do Grupo Wagner pelas forças Ahkmat do líder Tchetcheno Ramzan Kadyrov, que ultrapassam em bravura e ferocidade em combate os mercenários de Prigozhin, rapidamente se recompuseram do trauma.
Também de difícil confirmação, os media russos estão esta terça-feira a divulgar sucessivas imagens de ataques conseguidos sobre as forças ucranianas e de armamento ocidental, especialmente os alemães Leoprd 2 e os norte-americanos Bradley, destruído nos campos de batalha ucranianos.
Conhecendo a galvanização que o motim Wagner proporcionou nas fileiras ucranianas, o Presidente russo, Vladimir Putin, fez uma curta mas incisiva declaração à Nação russa na tarde de segunda-feira, onde procurou colocar um ponto final na crise, o que está longe de ser verificado no terreno, como notam vários analistas, garantindo que a sua atenção continua focada na resiliência da economia russa e na procura de uma vitória decisiva na Ucrânia.
Também na segunda-feira, horas, antes, o ex-chefe do Grupo Wagner, que agora está, segundo noticiam os media russos, na Bielorrússia, no início do seu exílio, embora ainda muito esteja por dar como certo, havendo mesmo quem mantenha dúvidas sobre o que ira fazer com os seus quase 10 mil homens que vão acompanhar Prigozhin, explicou a sua intempestiva acção, dando o dito por não dito, depois de afirmar querer mudar o poder em Moscovo, disse agora que o objectivo era apenas salvaguardar os interesses da sua "empresa" e não depor Putin.
O fio dos acontecimentos desde o início do kotim Wagner pode ser revisitado aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui...
Entretanto, segundo relata esta terça-feira o norte-americano Politico, em Kiev está a chegar uma forte pressão dos seus aliados ocidentais para que as forças ucranianas consigam avanços importantes no terreno.
Face a essas pressões, que passam por pedir explicações para a lentidão do avanço no terreno, apesar da entrega gigantesca de equipamento militar ocidental como Kiev exigia, a resposta, segundo este media, que cita fontes ucranianas, o poder aéreo russo muito superior, o mau tempo e os campos minados antes das primeiras linhas defensivas erguidas pelos russos nos últimos meses.
A insatisfação dos aliados ocidentais de Kiev está a ser vista como excessiva e a gerar mal-estar evidente na entourage de Zelensky, diz ainda o Politico.
As razões avançadas por alguns analistas militares ocidentais é que os russos estão a fazer uma defesa avançada à contra-ofensiva ucraniana, contra-atacando repetidamente para impedir ganhos territoriais a Kiev, mesmo antes de os combates atingirem a primeiras das múltiplas camadas defensivas russas.
Isto tem sido possível, efectivamente devido à superioridade aérea russa e ao tempo mais que suficiente para Moscovo erguer uma muralha defensiva quase intransponível, com o território em questão coberto por coordenadas geográficas para maior eficácia da artilharia, os campos minados que conduzem os veículos ucranianos para pontos onde são esperados por obuses e drones, etc.
Apesar desta realidade, segundo o Politico, os aliados norte-americanos e europeus de Kiev, independentemente da mortandade entre as unidades ucranianas, estão a exigir de forma cada vez mais rugosa ataques mais intensos e avanços mais consistentes sobre as muralhas russas.