Esta notícia apanhou tudo e todos de surpresa porque ainda há pouco tempo a ideia de um cessar-fogo com o Hezbollah foi arrasada pelo chefe do Executivo de Telavive e pelo seu Governo de radicais ideológicos e extremistas religiosos, embora alguns media internacionais já tivessem avançado que as forças israelitas estavam longe do desempenho militar contra o Hezbollah que julgavam poder acontecer...

Mas a justificação mais evidente, parece agora claro, é já resultado dos mandados de captura emitidos na semana passada pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes de guerra e contra a Humanidade em Gaza por Netanyhau, o seu antigo ministro da Defesa, Yoav Gallant, e contra o comandante militar do Hamas, que pode já estar morto.

Segundo alguns analistas, com um cessar-fogo, a questão dos mandados do TPI, que não perdem validade ou efectividade, deixarão de estar na actualidade mediática, aliviando a carga sobre o seu Governo e sobre si próprio, tanto internamente como no exterior.

A proposta de cessar-fogo foi elaborada pelos Estados Unidos e levada a Israel e ao Líbano/Hezbollah pelo enviado especial do Presidente Joe Biden, Amos Hochstein, que compreende, em síntese, o fim do conflito na zona de fronteira entre o norte de Israel e o sul Líbano.

Tecnicamente, o cessar-fogo tem como princípio gerar o tempo necessário para as partes, Israel e Hezbollah desenharem a forma como retiram as suas unidades de combate da faixa de cerca de 30 kms entre a linha de fronteira e o Rio Litani, no sul do Líbano.

Esta evolução da "paz" no terreno está a ser noticiada por vários media israelitas e surge como uma cedência de última hora de Netanyhau, que, efectivamente, está a ficar sem soluções, seja porque a continuidade da guerra em duas frentes, Gaza e Líbano está a destruir a economia do país...

... seja porque a incapacidade mostrada na libertação dos reféns ainda na posse do Hamas em Gaza - que podem ser em número superior à centena - desde o assalto ao sul de Israel, a 07 de Outubro de 2023, está a liquefazer o que restava de capital político interno de Benjamin Netanyhau, sendo os mandados de captura do TPI uma espécie de golpe de misericórdia.

Segundo os media locais, a proposta norte-americana compreende a aceitação pelas partes de que os Estados Unidos liderarão um organismo internacional de controlo da efectivação do acordo, que tem o apoio, segundo uma sondagem, de uma grande maioria, mais de 60%, dos israelitas.

O aperto é de tal ordem que, nas últimas horas, foi noticiado no país que o Governo de Netanyhau cortou todos os contactos com o jornal Haaretz, o media israelita mais crítico do Executivo que e composto, além do Likud, por três pequenos partidos liderados peros políticos mais radicais e extremistas deste a fundação do país, em 1948.

A nuance escondida nesta evolução

Os mandados de captura do TPI têm um papel substantivo nesta evolução da cedência de Netayhau, mas não são tudo...

Em Washington, como ficou claro com a autorização de Joe Biden aos ucranianos para usarem os misseis de alcance intermédio para atacar alvos na profundidade da Federação Russa (ver links em baixo), o objectivo, ou um dos objectivos, foi dificultar a vida ao Presidente-eleito, Donald Trump, quando a 20 de Janeiro chegar à Casa Branca.

Trump tem como obrigação, porque foi a sua promessa mais sonora de toda a campanha eleitoral no capítulo da política externa dos EUA, acabar com a guerra na Ucrânia, o que fica claramente mais difícil com o uso dos misseis dos EUA para flagelar alvos russos em profundidade.

Mas Trump também prometeu com empenho redobrado apoiar de forma ilimitada Israel a derrotar o Hezbollah e o Hamas, prometendo a Netanyhau não apenas armas e dinheiro para esse efeito, mas também as capacidades militares dos Estados Unidos.

Ora, se Joe Biden conseguir este cessar-fogo entre Israel e o Líbano/Hezbollah, além de lhe criar atrito suplementar na imposição da paz na Ucrânia, dificulta-lhe sobremaneira o cumprimento da promessa de ajudar Israel a derrotar os seus inimigos islâmicos no Médio Oriente, incluindo o Irão.

Na frente externa da complexa política norte-americana, nas derradeiras semanas em que detém o poder na Casa Branca, Joe Biden e a sua equipa estão a conseguir "castigar" Donald Trump criando-lhe substantivas dificuldades para brilhar nos primeiros dias do seu regresso aos comandos dos EUA.

Pode não chegar como vingança pela derrota nas eleições, mas alivia bastante o sufoco dos democratas no regresso dos republicanos ao poder em Washington... e é uma dor de cabeça para Trump, seguramente...