Este é o congresso da afirmação do poder de João Lourenço e da apresentação de uma estratégia de poder. Ele vai passar uma mensagem de poder e autoridade, de visão e estratégia, de controlo da máquina partidária e coesão interna. Trata-se de um congresso com uma providência cautelar em curso e com muitas cautelas sobre algumas resistências, divergências e correntes internas. Este é um "Congresso Cautelar".
O 6.º Congresso Extraordinário, de Setembro de 2018, foi do afastamento de José Eduardo dos Santos e a eleição de João Lourenço para líder do MPLA, ou seja, foi o congresso do fim da bicefalia. O 7.º Congresso, em Junho de 2019, foi para a análise do processo das autarquias e alargamento do Comité Central. Este 8.º Congresso Extraordinário, com o lema "MPLA- Servir o povo e fazer Angola crescer", é apontado como o congresso da alteração dos Estatutos e do regresso da bicefalia, o congresso da estratégia para afastar ou "asfixiar" toda e qualquer resistência externa.
Era importante João Lourenço procurar alargar o diálogo geracional no MPLA, alargar os espaços de debate sobre a democracia, liberdade de expressão e afirmação da democracia interna. Dar um novo olhar sobre o País, um olhar para além da visão partidária. Dar-lhes uma visão da política como espírito de missão, de cidadania e sentido patriótico. Fazer perceber à nossa geração que não estão no MPLA para ser "quantidade", mas, sim, para trazer "qualidade" ao partido e ao debate político. Fazer-lhe perceber que o cartão do partido hoje já não é e nem deve ser um instrumento de afirmação política, económica e social.
Este é um MPLA que vive ainda um conflito grande e antigo com a sua história e a sua memória. Muitos são os jovens militantes que precisam de saber a história da fundação do MPLA, do seu local e data, bem como dos seus fundadores. Tivemos agora, a 10 de Dezembro, a celebração dos 68 anos do MPLA, mas, para além das marchas, mensagens efusivas e discursos, pouco ou nada se fala do local da sua fundação. Sem dizer que nem se fala dos seis "pais fundadores" do MPLA, nomeadamente Viriato da Cruz, Mário Pinto de Andrade, Lúcio Lara, Hugo Azancoth de Menezes, Matias Miguéis e Eduardo Macedo dos Santos.
A memória dos fundadores nem é evocada no aniversário do partido e nem nos seus congressos. Ainda estão vivas e a residir em Angola as viúvas de Viriato da Cruz (Maria Eugénia) e a de Hugo Azancoth de Menezes, Salete Guerra Menezes. Sem esquecer a filha de Viriato da Cruz, as filhas de Mário Pinto de Andrade, os filhos de Lúcio Lara, os filhos de Hugo Azancoth de Menezes e também de Eduardo Macedo dos Santos, que vivos estão e cujo partido os esqueceu. Nem convites recebem para ir aos congressos, nem cartão de militantes têm e nem fazem parte das estruturas do Partido. Um partido que não honra a memória e o legado dos seus fundadores tem a necessidade de acautelar o discurso sobre a sua história e trajectória.
Existem, no seio do MPLA, correntes e militantes que não concordam com estas alterações estatutárias, que não concordam com liderança de João Lourenço e a sua estratégia de governação. Culpam-no pelo fracasso do combate à corrupção e afirmam que a forma como ele foi conduzido tem dividido e fragilizado o partido. O recente processo de renovação de lideranças na JMPLA também não ajudou a criar coesão entre diferentes sectores do partido e foi um acto que ocorreu muito próximo deste congresso do MPLA.
O MPLA também te sente prejudicado em termos de imagem, autoridade e popularidade, pelas falhas de governação e alguma instabilidade governativa. O partido sente a penalização nas urnas, porque, muitas vezes, a sua estratégia de governação é ignorada pelo Executivo. A actual situação política, económica e social do País, os índices de pobreza e a fome, a crise e falta de credibilidade do sistema judicial, o desemprego, as desigualdades sociais, a corrupção, a falta de compromisso institucional e com o País, a instrumentalização e manipulação da comunicação social, a desinformação, a intolerância, a indiferença, o discurso de ódio, entre outras coisas, criam várias situações preocupantes para quem governa.
João Lourenço sabe que terá de agir na antecipação, terá de evitar que o surpreendam e o condicionem, terá de frear estas correntes que pretendem avançar e tomar-lhe a liderança do MPLA. Tenho também dito que é preciso que essas correntes internas não se esqueçam de que João Lourenço não pode ser visto apenas como parte do problema, mas também como parte da solução. É que não é só o futuro do líder do partido que está aqui em jogo, é também o futuro e a manutenção do MPLA como partido no poder. É preciso reflectir sobre isso e acautelar também neste Congresso Extraordinário e "cautelar" de 16 e 17 de Dezembro
O "Congresso Cautelar"
Tenho dito que a capacidade de o MPLA permanecer como um grande partido de Governo estará sempre na qualidade, na actualidade, na inteligência do seu discurso, na elevação e substância do debate que propõe à sociedade, na definição de uma agenda real, de uma estratégia de futuro e visão para identificar, discutir e solucionar os principais problemas dos cidadãos.