Anos logo após contrair o matrimónio no Huambo, no quintal e nos terrenos adjacentes à minha casa (Bairro Capango Urbano), plantei um abacateiro, batata-doce, abóbora, couves, tomate e alface. Havia terra e água disponíveis. Essa pequena horta do Huambo revelou-se crucial nos anos que se seguiram, em que o Huambo era alimentado por colunas que demoravam semanas para ir e regressar do litoral, com mantimentos. Por meses e anos, aquela pequena horta socorreu-nos, pois tirávamos a rama, o lombi, a batata-doce e a abóbora que fazíamos sopas maravilhosas. No quintal construí uma pequena capoeira, com galinhas e patos, que fornecia ovos e carne. Portanto, graças à pequena agricultura, conseguimos fazer face aos momentos difíceis que se viviam naquela altura.

Passei anos vivendo no estrangeiro, inicialmente em apartamentos, punha plantas nos vasos e tinha muito gosto de ver o tomate e a batata que colhia desses vasos. Depois, que mudei para casas, passei a fazer uma pequena horta no quintal, fazendo nos vasos e no jardim pequenas plantações de hortícolas. Regressado ao País, comprei um espaço no Bairro Tchioco, adjacente à estrada que liga o Aeroporto Internacional da Mukanka no Lubango-Huíla, com cerca de 1,2 hectares, onde construí a minha casa e passei a fazer as minhas pequenas plantações. Com o apoio do meu saudoso amigo e colega Lucas Bahu (em memória), plantei limoeiros, laranjeiras, tangerineiras, abacateiros, nespereiras e mamoeiros. Em 2012, quando ainda decorriam as obras da casa, semeei batata rena, no pequeno canteiro de 12x5, totalmente orgânico, nem usamos estrume. Ficámos espantados com a colheita, tirámos perto de 500 kg de batata. Impressionou-me a produtividade, o terreno era altamente fértil. Contratei imediatamente um homem que passou a cuidar da horta. Fizemos pequenos canteiros com diversas variedades de hortícolas, de modo que não houvesse interrupção. Passamos a não comprar tomate, cebola, alface, cenoura, pimenta, beringela, etc. Era tudo na base de estrume bovino que comprava ao soba nas proximidades da estação do Caminho-de-Ferro de Moçâmedes. A história repetiu-se, no período da pandemia da COVID-19, ficámos fechados e a horta e o galinheiro socorreram-nos, mais uma vez!

Ganhei muito gosto e muito motivado a fazer o aproveitamento do espaço. Os resultados que vinha tendo eram bastante animadores, impulsionava-me a fazer mais e melhor. Creio que 3 anos após plantar as fruteiras, começámos a colher as primeiras frutas (limão, tangerina, laranja), que muito me lembraram as laranjas do pomar do meu falecido pai. A minha luta era igualar a qualidade das laranjas e tangerinas do pomar do meu pai, pois, devido à acidez do solo, as laranjas não saíam com a doçura que estava habituado do pomar familiar. Foi assim que contactei o Engenheiro João Saraiva do Jardim da Yoba, aquém estou grato, pelas orientações que me passou, em aplicar calcário e fosfato diamónico (DAP), a mais ou menos um metro do caule da árvore. Hoje, as minhas laranjas são tão doces e sumarentas, como as do meu pai. Por se tratar de fruteiras regadas ao longo do ano, temos frutas o ano todo. Há três semanas fomos ao Lubango, trouxemos dois sacos cheios de limões. A limonada que tomo, e/ou o sumo de laranja, é das frutas do meu pequeno pomar, o que me dá um gozo extraordinário.

No mesmo espaço, passei a produzir milho e feijão. Inicialmente, não estava a ter resultados satisfatórios. Até que um dia convidei os meus colegas professores cubanos, para uma churrascada em minha casa, quando um deles, o Professor Rodolfo Ortelio, pessoa de extraordinárias valências, viu a minha plantação de milho e me disse que não estava bem, iria me ensinar a fazer melhor! Na safra seguinte, pedi as instruções devidas, o Professor se dignou em voltar à minha casa e dar-me as instruções precisas de como proceder. A agricultura exige o domínio das melhores práticas para se tirar o melhor rendimento. A verdade é que desde aquela data, passámos a tirar nunca menos de 2000 quilos de milho e nunca menos de 100 quilos de feijão. Nos últimos anos, com a assistência dos Engenheiros David Maciel e Ademir Soares da Silva, da Carrinho Agri, passei a estar no topo das colheitas, quer de milho, como das hortícolas.

Há um ano, dei conta de uma propriedade da família Carrinho, no vale da Catumbela, nos antigos terrenos da açucareira, onde em parceria com a Dona Leonor Carrinho, passámos a entretermo-nos a fazer agricultura, lembrando as nossas raízes. O que parecia uma brincadeira, passou a algo sério. No ano passado, colhemos cerca de 6 mil quilos de milho, comemos maçaroca até nos fartarmos, ficámos com uma parte para o nosso pirão e ainda tivemos um lucro acima de Kz 1 500 000,00. Sim, de facto, é incompreensível termos a actual situação de fome e miséria que vemos em todo lado. Na presente campanha, mais precisamente em meados do mês de Junho, no espaço de pouco menos de 2 hectares, semeámos feijão-manteiga, uma parte e a outra parte feijão catarino. Nas bermas de cada canteiro, metemos milho. Metemo-nos no programa de fomento da Carrinho Agri, que adiantou a semente, os fertilizantes, os pesticidas e concedeu a assistência técnica. Por incrível que pareça, sem ter produzido o que era esperado (em circunstâncias normais, 2 hectares de feijão deveriam resultar em 3000 mil quilos no mínimo), tiramos 1400 quilogramas de feijão. Ficámos com feijão para todo o ano e entregamos o resto à empresa que fomentou a produção, pagando Kz 1 500,00, o quilograma de feijão. Pagámos a nossa dívida dos insumos recebidos, temos feijão na nossa dispensa, essencialmente, encheu-nos de orgulho, porquanto o feijão que estamos a comer foi por nós cultivado, fruto dos ensinamentos que recebemos dos nossos progenitores.

No pequeno espaço adjacente ao terreno, onde fazemos feijão e milho, estamos a fazer hortícolas, temos neste momento plantados repolho, couves, tomates, cebola, pimento, quiabos e beringelas, em canteiros pequenos, tal como faço no Lubango. Tudo feito com o estrume bovino, ou seja, produtos orgânicos. Alguém dirá que temos o privilégio de termos a assistência dos melhores profissionais, o que não têm outros produtores. O que não é de todo verdade, porquanto, o espaço que estamos a usar existe há alguns anos, estes técnicos já cá estavam, para além de que ninguém se dignou a fazer o aproveitamento que estamos a dar neste momento, aliás, o espaço é de 37 hectares, nós apenas estamos a usar 2 hectares. Por outro, como referi no artigo sobre os roubos no vale da Catumbela, há muita gente, entre elas mulheres, que tiram o sustento naqueles espaços, vendendo a sua força-de-trabalho num período e no outro trabalhar na sua própria lavra. O importante a reter do texto é a necessidade de forjar as crianças no trabalho. Há dias, um dos meus filhos (vive em Burlington - Ontário/Canadá) enviou uma fotografia com a sua colheita de batata, colhida no seu quintal. A agricultura exige conhecimento e dedicação, pois, como se diz, "a agricultura não espera e não pára". Se faltar semente ou fertilizantes no momento da safra, depois já se torna tarde e/ou inapropriado fazer uma determinada sementeira. O que se pode também reter é que a agricultura tem um potencial enorme, é algo não muito complicado, pode ser feito por qualquer um. Então, o que se passa, por que estamos a sucumbir com fome? Com determinação, cada um pode resolver o problema da fome, com os recursos disponíveis e ao alcance de todos. Se tem um espaço de terreno, tem saúde e tempo. Entre no programa de fomento, em pouco menos de 3 a 4 meses terá resolvido o problema da fome e vai ter algum dinheiro em mão. Andar a deambular pelas cidades e/ou vilas, não é solução, voltemos para os campos, fazendo a agricultura, pois a procura dos produtos agrícolas está a valorizar os produtos e vale a pena investir na agricultura. Já se vêm muitas pessoas a fazer a agricultura, bem-haja!

*Economista