Apesar de termos feito alguns progressos desde 2002 no que diz respeito ao combate à fome, estes resultados foram desiguais e insuficientes. Assistimos a melhorias, sobretudo, numa época em que a economia do País conheceu um período de franco crescimento. No entanto, a fome, a insegurança alimentar e a subnutrição continuaram presentes. Nos dias de hoje, esta situação tende a agravar-se, afectando milhões de pessoas, especialmente nas zonas rurais, onde a pobreza extrema e a insegurança alimentar continuam profundamente enraizadas.

As populações vulneráveis, especialmente mulheres, jovens e minorias etnoliguisticas, muitas vezes designados como povos indígenas (Koi-Sans, Mumuhilas, Mucubais, etc), são afectadas de forma desproporcional. Se esta tendência se mantiver, até 2030, milhões de adultos e crianças continuarão afectados pela desnutrição nas suas diferentes formas, e o País ainda estará longe de alcançar as metas globais de nutrição. Problemas como os conflitos internacionais, as alterações climáticas, recessões económicas, subida de preços dos alimentos no mercado internacional, hábitos alimentares não saudáveis e quedas nos preços ou na produção de petróleo já não são as únicas causas da insegurança alimentar e desnutrição em todo o País como muitos pretendem fazer crer.

Não devemos também ignorar outros aspectos, tais como a ausência de políticas adequadas e investimentos necessários para transformar os sistemas agro-alimentares, sendo causas que perduram ao longo dos anos, tendo sido identificados por diversas pessoas em outras ocasiões. Neste sentido, seria expectável que abordássemos com algum foco as razões pelas quais estas políticas e investimentos não foram implementados e/ou, caso tenham sido, não foram efectivos ao ponto de sentirmos uma tendência de redução dos níveis de fome, subnutrição e insegurança alimentar.

Há quem afirme que uma das razões centrais é o escasso financiamento público para tudo o que diz respeito à implementação dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, outros vão mais longe e apontam como causa raiz a falta de um compromisso político mais consistente com os desafios que enfrentamos. Eu recordaria que as evidências indicam que os países com os níveis mais altos de insegurança alimentar e múltiplas formas de desnutrição são justamente os países que menos financiamento dedicam a esta questão ou que menos políticas assertivas possuem. Será este o nosso caso? Seria interessante/importante se surgissem mais espaços de reflexão onde os participantes pudessem fazer um balanço abrangente de quanto do financiamento para segurança alimentar e nutrição está disponível anualmente e de quanto mais será necessário para apoiar as políticas e investimentos destinados a abordar todas as causas e os principais factores de insegurança alimentar e desnutrição até 2030.

Acredito que tal exercício feito de forma inclusiva, transparente, envolvendo todos os actores relevantes e partes interessadas, iria levar-nos ao reconhecimento das principais lacunas ao nível das políticas que visam garantir a segurança alimentar e nutrição e mobilizar ideias inovadoras a respeito. Digo isto porque considero que deve estar entre as nossas principais prioridades enquanto país, uma reflexão profunda com um olhar alicerçado no pensamento lateral, onde procuramos caminhos em torno do que existe em termos de políticas, legislação, recursos financeiros e intervenções para acabar com a fome e garantir que todas as pessoas tenham acesso a alimentos seguros, nutritivos e suficientes.

Cerca de quarenta e nove anos volvidos desde o alcance da independência e 22 anos desde o fim da guerra fratricida, acabar com todas as formas de desnutrição não é apenas um investimento no futuro, mas nossa obrigação. Os desígnios da nossa independência não serão alcançados plenamente enquanto não conseguirmos garantir o direito à alimentação e nutrição adequadas às gerações actuais e futuras. Espero que, nesse sentido, possamos, para além das estatísticas e da visão geral, olhar para estas questão essenciais de modo que possamos crescer com sustentabilidade enquanto país.

*Coordenador OPSA