Há que ter presente que o candidato Donald Trump se apresentou a sufrágio com 34 processos-crime contra a sua pessoa, envolvido ainda na grave suspeição de não aceitar a derrota anterior contra Joe Biden e ter proferido, durante a campanha, declarações insensatas e, algumas, de extrema gravidade.
Qual, então, a razão da dimensão de tão retumbante vitória, com profundos impactos à escala interna e internacional, e ainda difíceis de avaliar?
Os resultados não se explicam apenas pelo facto de o Partido Democrático ter acordado tarde, conduzindo à retirada da confiança em Joe Biden, marcado pela idade avançada e pelos efeitos desta, nem pela substituição por Kamala Harris.
A questão de fundo partiu de uma deficiente análise da realidade por parte do Partido Democrático, apresentando um programa de candidatura sem ter em atenção as profundas e vertiginosas alterações que o mundo e os EUA, em particular, sofreram nos últimos anos.
É importante termos presente que o "velho mundo", o mundo bipolar, desapareceu há escassos 35 anos e hoje a realidade é outra.
A multipolaridade, com a devastadora e não regulada importância das redes sociais, apresenta desafios de tipo novo a exigirem respostas também inovadoras, na questão do género, nos processos migratórios e nas alterações climáticas, entre outros.
Em resumo, o mundo hoje é inseguro e incerto.
Os cidadãos, bem ou mal, preferiram a autoridade, a estabilidade, o retorno a concepções isolacionistas, rejeitando o velho canto da sereia.
Em consciência, ninguém sabe o que aí vem, rejeitando, porém, o que existe.
Não se sabe bem para onde se vai.
A ver vamos...
Como é também sabido, a situação em Moçambique está muito complexa e qualquer pessoa que deseje a paz e a estabilidade anseia para que a tensão existente seja, brevemente, ultrapassada para bem do país e do povo moçambicano.
Sem pretender elaborar juízos de valor sobre as causas directas dessa tensão, decorrente do acto eleitoral e da transparência dele, os jovens, que são a esmagadora maioria da população, não viveram sob o impacto e os efeitos da guerra, num mundo que era outro, bipolar, e essa tensão emerge da percepção por parte deles, do que observam e avaliam.
A existência das redes sociais, a possibilidade de serem efectuados vídeos e tirarem-se cópias com o telemóvel sobre os acontecimentos em direito e à medida que eles ocorrem, confrontando-os com os dados oficiais, conduzem ou podem conduzir a suspeições sobre a transparência do processo eleitoral.
A isto acresce o facto de a esmagadora maioria da população moçambicana não ter experimentado a guerra fratricida, repito, e viver hoje numa situação económica difícil, com a consciência de que a própria oposição tradicional se debilitou, fazendo surgir uma nova liderança nesta, por ausência de resposta dos partidos tradicionais.
Qualquer que seja o resultado da tensão existente, não vejo forma de se superar o quadro difícil que se vive sem que de todos os lados haja contribuições firmes para o diálogo, com os olhos postos no futuro.
Moçambique merece-o.
Também há escassos dias, 11 de Novembro, ocorreu a passagem do 49.º aniversário da Independência de Angola e para o ano haverá uma data redonda, o 50.º aniversário.
Angola, País singular e com potencialidades únicas, saberá seguramente, neste quadro complexo que se vive à escala mundial, com reflexos em todos os azimutes, marchar sob os seus próprios pés, ao aproximar-se o meio século da independência, reforçando o bem-estar e o desenvolvimento.
É simples, porque todos os problemas complexos se resolvem como os simples, tendo em atenção a realidade e analisando-a de forma realista, passe a redundância. É tudo uma questão de método, priorizando-se a política sobre a economia, porque esta é uma consequência daquela.
A avaliação correcta da realidade é muito importante no quadro atual do mundo, como a eleição nos EUA e o que se passa em Moçambique o evidenciam..
*(ex-Secretário-geral da UCCLA)