O processo-crime que envolve a ex-ministra das Pescas, instaurado em Dezembro de 2019 pela Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal do Ministério Público (DNIAP), órgão da PGR, está concluído e foi remetido ao Supremo para julgamento, após o fim da fase de investigação e instrução preparatória.
Segundo uma fonte judicial, o processo encontra-se em segredo de justiça, mas desde o dia 21 que decorre a instrução contraditória no Tribunal Supremo, que se remeteu ao silêncio sobre o assunto quando contactado pelo Novo Jornal.
A instrução contraditória é uma fase normal em qualquer processo-crime, durante a qual, o arguido tenta convencer o juiz de que a acusação não tem razão, apresentando os seus argumentos e provas. Dessa fase resulta a ida ou não do caso a julgamento,
Segundo a fonte do Novo Jornal, o processo decorre no TS distante da imprensa, a pedido da arguida, em sede desta fase de instrução.
Victória de Barros Neto é alvo de um processo-crime por suspeita de enriquecimento ilícito com fundos dos Estados angolano e namibiano.
Em 2019, a PGR afirmou que o processo-crime que tramitava no DNIAP contra a então deputada MPLA "por suspeitas de locupletamento de valores monetários pertencentes aos Estados angolano e namibiano, resultantes da comercialização de pescado na zona costeira conjunta, no período em que exercia o cargo", decorria sob investigação.
Victória de Barros Neto foi ministra das Pescas e do Mar nos governos de José Eduardo dos Santos (entre 2012 e 2017) e de João Lourenço, que a reconduziu no cargo para depois a exonerar em Janeiro de 2019.
No dia 8 de Outubro de 2019, o Novo Jornal chegou a noticiar, com base no jornal The Namibiam, que a Comissão Anti-corrupção da Namíbia (ACC, sigla em inglês) estava a investigar um negócio que envolvia quotas de pesca no valor de 150 milhões de dólares namibianos (à data 9,9 milhões USD) atribuídas pelo Governo de Windhoek ao Governo angolano, que terão alegadamente sido tomadas de forma ilegal por políticos dos dois países.
O jornal revelava que em causa estavam dois ministros namibianos, ambos detidos no país vizinho e a aguardar julgamento, e um antigo ministro angolano (Victória de Barros Neto), gestores do Investec Asset Management, uma firma multinacional que gere investimentos e fundos, e uma empresa namibiana, a National Fishing Corporation of Namibia (Fishcor) e associados.
Esta investigação desenvolveu-se, segundo o jornal, em torno de um acordo que Angola e a Namíbia assinaram em 2014, e, alegadamente, esses políticos, com o envolvimento de cúmplices, ter-se-ão apossado dessas quotas de pesca com um valor de quase 10 milhões de dólares norte-americanos, colocando-as à venda a valores do mercado internacional.
O acordo em questão, assinado em 2014 entre a Namíbia e Angola, tinha como uma das primeiras áreas de cooperação a formação de uma joint venture e a alocação de quotas de pescas à denominada Namgomar SA Pesca, e que teve como foco principal, no início, a pesca de espécies como o carapau, uma das espécies mais importantes para o sector angolano das pescas e de longe a espécie mais consumida pela população.
Dentro deste acordo estava a entrega pela Namíbia a Angola de uma quota de 25 mil toneladas métricas de carapau, entre 2014 e 2016, que terão, segundo esta investigação, total ou parcialmente, sido vendidas nos mercados a companhias de pesca privadas em benefício dos envolvidos, num valor estimado de 70 milhões de dólares namibianos. No período de 2016 a 2019, esse valor rondaria os 150 milhões.