Apesar desta medida abranger todos os ilegais e não apenas os angolanos, que as autoridades congolesas estimam em dezenas de milhar, o objectivo é dar uma primeira resposta à expulsão dos milhares de congoleses, nas últimas semanas, das províncias diamantíferas de Angola.
Embora o Governo de Kinshasa utilize o termo "expulsos", a Polícia Nacional garante tratar-se de saídas voluntárias no âmbito da "Operação Transparência", que tem como finalidade regrar o mercado diamantífero artesanal e a imigração ilegal nas províncias da Lunda Sul e Norte, Bié, Zaire e Malanje.
No entanto, esta medida, anunciada nas últimas horas pelo vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Agée Mutembo, está a ser fortemente criticada pelas forças políticas da oposição, por ser pouco expressiva.
Oposição exige mais firmeza
Uma das reacções negativas, por ser uma resposta escassa, veio do histórico PUNA (Partido para a Unidade Nacional), cujo presidente, Toussain Alonga, segundo o site mediacongo, defendeu que, face às expulsões de congoleses de Angola, deveriam ser os angolanos a serem visados em primeiro lugar e de imediato.
Também o deputado da União para a Nação (UNC), Juvénal Munubo, apontou o dedo à diplomacia congolesa, afirmando que esta "não é respeitada", pedindo uma "intervenção imediata" do Parlamento de Kinshasa.
"O Parlamento não pode ficar em silêncio face a esta situação, é urgente uma comissão de inquérito para se apurar o que se passa e a real dimensão deste problema", disse Manubo.
Noutra reacção, desta feita após o Conselho de Ministros de terça-feira, o Governo de Joseph Kabila condena a forma como as autoridades angolanas "não respeitaram os direitos humanos" e a "perda de vidas humanas", criticando ainda fortemente o facto de "não ter sido cumprido o princípio de pre-aviso ao país de origem" que se exige em todas as situações de expulsão de ilegais "de forma a permitir salvaguardar as mínimas condições de acolhimento".
O comunicado do Conselho de Ministros congolês avança ainda que vão ser utilizadas as vias diplomáticas para fazer chegar a Luanda o "vivo protesto e a indignação" do Governo de Kinshasa.
MIREX ainda não se pronunciou
O NJOnline continua a aguardar por uma reacção a esta crise por parte do Ministério das Relações Exteriores.
No entanto, o comandante-geral da Polícia Nacional, Paulo Almeida, já se pronunciou sobre esta iniciativa angolana para regularizar as áreas diamantíferas, o negócios que nela se faz e combater a imigração ilegal, refutando que tenham ocorrido excessos por parte das forças da ordem nacionais.
Advertiu para a existência de rumores que visam dificultar o cumprimento dos objectivos da "Operação Transparência", sublinhando que a PN não está preocupada com essas informações e que permanece "firme" para atingir os objectivos desta missão que está a ser conduzida "para o bem do país".
Apesar desta ser a primeira medida de resposta ao que se está a passar em Angola, onde a "Operação Transparência" já levou mais de 250 mil congoleses a deixar o país por estarem em situação ilegal, expulsos, na visão de Kinshasa, saídas voluntárias, garantem as autoridades angolanas, o porta-voz do Governo de Joseph Kabila e ministro da Comunicação, Lambert Mende, anunciou que foi criada uma task force, que inclui ministros dos Negócios Estrangeiros e do Interior, para averiguar o que se está a passar e definir um plano de resposta a esta crise.
Recorde-se que a maior parte dos congoleses que estão a regressar ao seu país estão a chegar à cidade de Kamako, próximo da fronteira, na província do Kasai, onde as organizações humanitárias e agências da ONU estão a tentar dar resposta à situação para evitar uma crise mais vasta, como o Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados (UNHCR) já admitiu que pode estar ao virar da esquina, devido à ruptura dos serviços locais.
Alerta para possível crise humanitária
O UNHCR adverte que "expulsões massivas são contrárias às obrigações assumidas pela Carta Africana (documento criado no âmbito da União Africana com um conjunto de disposições no âmbito dos Direitos e Garantias a que os países membros estão obrigados) e, por isso, pedimos aos dois lados que respeitem os Direitos Humanos dos envolvidos, porque sem essa cooperação, esta situação pode facilmente gerar uma crise humanitária na já frágil região do Kasai", escreve o UNHCR.
Recorde-se que o Kasai foi, durante o ano de 2017, palco de violentos confrontos envolvendo milícias, que provocaram mais de 4 mil mortos, milhares de feridos e cerca de 3 milhões de deslocados, sendo que, destes, cerca de 40 mil fugiram para a Lunda Norte em busca de refúgio, onde ainda se encontra a maior parte em campos de acolhimento criados pelas autoridades angolanas com apoio do UNHCR, do UNICEF e dos Médicos Sem Fronteiras, entre outros.
O UNHCR recorda que os serviços estatais estão muito fragilizados no Kasai e a capacidade de resposta severamente diminuída, o que pode gerar um acrescento de dificuldades e abrir caminho a uma nova e grave crise humanitária.
No mesmo comunicado, esta agência da ONU alerta para a continuada chegada diária de centenas de pessoas ao lado congolês, a maior parte a pé, por falta de transportes, carregando os seus parcos haveres, "com relatos de terem sido alvo de violência, incluindo violência sexual, perseguições, roubo de bens, intimidações, rusgas..." em ambos os lados da fronteira.
O UNHCR adverte para a situação em continua degradação na cidade de Kamako, na fronteira com Angola, devido a sobrepopulação e à falta de resposta dos serviços locais, com pessoas a dormir nas ruas, enfrentando perigos diversos.
Equipas do UNHCR e de outras agências da ONU já estão ou estão a caminho de Kamako e da província do Kasai para presar a assistência humanitária possível, focando a sua atenção nas crianças, mulheres e idosos. O transporte destas pessoas para as suas casas é a prioridade.
Sublinhando o Alto-Comissariado para os Refugiados que existe a possibilidade "ainda a ser confirmada" de que entre os "expulsos" de Angola estão, entre outros, muitos dos refugiados que encontraram protecção na Lunda Norte no ano passado, no decorrer do caos provocado pelas milícias no Kasai.