Ainda não se sabe o que o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, e Marco Rubio, o secretário de Estado norte-americano, decidiram no seu primeiro encontro digital, mas já é claro que os líderes europeus da chamada "coligação da vontade" em derrotar a Rússia se mantêm firmes na sua convicção analógica para impedir que Putin e Trump desenhem a paz para a Ucrânia a seu belo prazer.
É já na sexta-feira, 24, que a "coligação da vontade", o grupo ad hoc dos países europeus da NATO empenhados em manter acesa a chama da guerra em Kiev, volta a reunir em Londres, com o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, o francês Emmanuel Macron e o chanceler alemão, Frederich Merz, na linha da frente do esforço para fazer descarrilar os planos de Trump e de Putin.
Já aquando da reunião em Anchorage, no Alasca, entre Putin e Trump, aquilo que parecia um plano definido e sólido para acabar com o conflito no leste europeu, acabou por ruir sob a pressão da "vontade" europeia, numa histórica viagem relâmpago (ver links em baixo) dos líderes europeus a Washington, onde o Presidente norte-americano começou a retrair-se do que tinha anunciado a 15 de Agosto quando recebeu o homólogo russo.
E foi desse momento, com as famosas fotografias dos líderes europeus alinhados nos corredores da Casa Branca à espera, como se fossem alunos em formatura para exame, a correrem mundo, para desmembrar o que parecia uma sólida decisão das duas superpotências militares e se revelou, afinal, um castelo de cartas...
O "comboio da paz"
Agora, quando Trump e Putin procuram voltar a colocar nos carris o "comboio da paz" para a Ucrânia, o mundo assiste, mais uma vez, à fúria europeia para manter a guerra na Ucrânia até que Moscovo aceite negociar nos termos definidos pelos aliados de Kiev e não de acordo com um plano traçado entre a Casa Branca e o Kremlin.
E os primeiros sinais de que as brechas na decisão anunciada após a chamada telefónica Putin-Trump na semana passada, de onde saiu a ideia do encontro em Budapeste, se estão a expandir, surgiu nas declarações das últimas horas do norte-americano que voltou a dizer que Kiev pode mesmo ganhar a guerra.
Estas palavras retomam, inesperadamente, ou talvez não, a publicação na sua Truth Social, há semanas, onde diz que a Rússia vai ser derrotada e perder os territórios que actualmente controla na Ucrânia, embora ele tenha agora acrescentado que duvida que tal possa suceder...
O que está confirmado, para já, é que, afinal, os mísseis Tomahawk (ver links em baixo) prometidos à Ucrânia por Donald Trump não vão ser enviados, com o Presidente Volodymyr Zelensky a sair de mãos a abanar da reunião desta semana em Washington, embora o próprio tenha assumido ser "realista" quanto a isso, e alguns media norte-americanos tenham divulgado que o ucraniano, sem jornalistas presentes, voltou a ser fortemente pressionado para ceder à Rússia.
Cedência que a Casa Branca quer que seja efectiva na questão dos territórios, com Trump a defender publicamente que os russos fiquem com o que já controlam, abandonando a ideia de continuar a avançar no terreno, enquanto a Zelensky restaria, se fosse cumprido o desejo do americano, ficar com as partes das regiões anexadas legalmente por Moscovo mas ainda por conquistar militarmente.
Zelensky, o irredutível...
O que vai Zelensky fazer é, porque o próprio o confirmou, recusar a ideia de Trump, exigir pelas armas a saída dos russos de todos os territórios da Ucrânia, embora para isso precise não apenas do apoio europeu, que é todo o possível mas longe de ser suficiente, e dos EUA, que é cada vez mais reduzido e pode ser totalmente eliminado se o encontro de Budapeste correr de feição a Putin...
A haver qualquer alteração, embora isso não seja provável, porque Zelensky telefonou aos líderes europeus logo após o segundo encontro cáustico com Trump na Casa Branca, na passada sexta-feira, 17, antes de falar com a imprensa, essa só poderá emergir da reunião da "coligação da vontade" da próxima sexta, 24, em Londres...
Para que tal possa acontecer, como alguns analistas já avançaram como possibilidade, é que, estando conscientes da vontade férrea dos europeus em impedir um acordo russo-americano sólido, Lavrov e Rubio decidam pela pressão sobre os europeus - o que só poderá ser feito por Washington - para não atrapalharem as decisões que saírem de Budapeste...
O que se sabe para já é que a retórica de Zelensky sobre este regresso da "vontade" a Londres volta a centrar-se na questão das garantias de segurança para a Ucrânia após o fim da guerra, sendo que tanto Zelensky como os seus aliados em Londres, Paris e Berlin o que querem é colocar uma força militar da NATO, sem a chancela da organização, na Ucrânia para evitar novos ataques russos.
O que é muito do que Moscovo já definiu como linha vermelha, tal como, em síntese, a questão da neutralidade de Kiev fora da NATO, sem militares ocidentais no terreno, a aceitação internacional da soberania russa sobre as regiões anexadas na Ucrânia...
Nada menos que... tudo!
Além de já ter vindo reafirmar que Kiev não aceita menos que a expulsão dos russos dos seus territórios, nesta deslocação a Londres, e, depois, a Bruxelas, para a reunião do Conselho Europeu, Volodymyr Zelensky vai deixar claro que a Europa terá de aumentar o esforço para apoiar a máquina de guerra ucraniana, mesmo que os EUA esfriem o seu apoio.
E, com uma crise profunda às costas, especialmente na Alemanha, França e Reino Unido, muito devido ao corte da energia russa barata e abundante devido às sanções, os europeus têm cada vez menos flexibilidade financeira para dar a Kiev o que Kiev exige...
Mas não está nada perdido, porque, neste momento, sem dinheiro próprio nos cofres, Bruxelas, como o disse sem rodeios a líder da Comissão Europeia, Ursula Leyen, está em processo acelerado de recorrer aos mais de 140 mil milhões de euros de fundos russos congelados no sistema financeiro europeu para os entregar a Zelensky...
Só que este processo está a ter constrangimentos pesados, porque se o dinheiro que a Rússia depositou nos bancos europeus antes da guerra acabar nas mãos do inimigo, a credibilidade e segurança do sistema financeiro europeu fica em escombros, porque os países que ali têm também as suas poupanças, ficam a saber que se desalinharem das opções de Bruxelas, podem ver o seu dinheiro voar...
Apesar de a chefe do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, já ter vindo dizer que tal movimento tem de respeitar a lei e que só pode acontecer se todos os países com fundos russos alinharem pelo mesmo diapasão - uma impossibilidade absoluta, porque a China nunca o fará -, o que deverá acabar com tal pretensão para evitar o descrédito total dos bancos europeus, Zelensky a a sua "coligação da vontade" insistem que esse dinheiro deve ser desviado para Kiev seja qual for o mecanismo usado para lhe dar "conforto" político, porque legal será impossível...
Neste espaço temporal, que deve rondar as duas semanas, para o encontro de Budapeste, Zelensky e o trio europeu de falcões de guerra, Macron, Starmer e Merz, têm muito trabalho pela frente para fazer descarrilar o processo negocial entre americanos e russos.
E Sergei Lavrov e Marco Rubio outra carga de trabalhos para impedir que os europeus obstinados com uma derrota russa no campo de batalha, como Ursula Leyn, por exemplo, ainda não desdisse como objectivo principal, tenham sucesso na sua batalha contra a "pax" russo-americana no contexto do conflito ucraniano.