Num novo esforço coordenado com os seus velhos amigos em Moscovo e Washington, Viktor Orban vai estar esta sexta-feira, 07, com Donald Trump na Casa Branca com um tema central na agenda de trabalhos: aproximar ucranianos e russos de uma solução negociada para o conflito na Ucrânia.
Pelo meio, o húngaro vai, porque também está na agenda desta visita aos EUA, procurar obter de Donald Trump um pequeno favor, que é uma excepção para o seu país no contexto das sanções norte-americanas à Rússia e que incidem essencialmente no seu sector petrolífero exportador, porque a Hungria, sem acesso ao mar, depende quase a 100% de um oleoduto russo.
Esta visita, que pode não ser coincidência, porque só se soube dela nas últimas horas, surge num momento em que o Presidente dos EUA, a quem tanto Moscovo como Kiev reconhecem um papel fulcral na busca de uma saída negociada para a guerra, vive uma crise interna política, depois da derrota nas eleições intercalares desta terça-feira, 04, e económica, com o desemprego e a inflacção a níveis perigosos para a sua reputação enquanto gestor da maior potência económica do mundo.
É que a guerra da Ucrânia, que tem merecido especial atenção de Trump (ver links em baixo), é uma das razões para a derrocada eleitoral recente, especialmente ao ver "um comunista", como chamou a Zohran Mamdani a ganhar a câmara de Nova Iorque e dois democratas a vencerem para governadores na Virgínia e Nova Jersey, com os eleitores a exigirem dele que se foque na resolução dos problemas internos...
O risco das intercalares do ano que vem
E com as mais importantes eleições intercalares de meio de mandato, onde pode perder as maiorias nas duas câmaras do Congresso, Senado e Representantes, já daqui a menos de um ano, a que se soma a recente derrota no Senado, de maioria republicana, o seu partido, quanto às tarifas impostas à China e à Índia, entre outros países, eliminando-as, "roubando" ao Presidente a sua principal arma de pressão na política externa, a opção em cima da mesa poderá ser um recuo para o cerne das suas promessas eleitorais: a política e a economia interna.
Se assim for, como alguns analistas apontam como provável, esta visita de Viktor Orban a Washington assume uma importância ainda mais clara, porque Trump, que, recorde-se, ainda há duas semanas agendou e cancelou, em escassos dias, um encontro com Vladimir Putin em Budapeste, a capital, precisamente, da Hungria, com a Casa Branca a ter nova oportunidade para "facilitar" as negociações entre os russos e o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky.
Para isso, como tem, por exemplo, sublinhado o norte-americano John Mearsheimer, um dos mais reputados analistas de política internacional, professor da Universidade de Chicago com dezenas de livros publicados neste âmbito, os EUA têm de assumir que a guerra na Ucrânia só decorre ainda ao fim de 4 anos porque é Washington que fornece as armas e o apoio logístico necessário.
E este conflito será, nessa lógica, conduzido para o seu fim se os Estados Unidos interromperem o apoio militar a Kiev e impuserem a Zelensky um "road map" claro para chegar a um entendimento com Vladimir Putin, o que a Trump nem ficará longe do que disse e com o que se comprometeu durante a campanha, que foi sair de uma guerra que é "a guerra de Joe Biden", o seu antecessor, e que nunca teria começado se ele fosse Presidente.
Os contornos, porém, desta visita de Orban a Washington serão clarificados nas esperadas declarações de ambos ao final do dia, mas não será um surpresa total se Trump anunciar passos concretos e sólidos para levar Zelensky a ceder face às exigências de Moscovo para acabar com o conflito, aproveitando ainda o facto de os russos estarem solidamente a avançar na frente de batalha.
Esses avanços são especialmente visíveis no Donbass, na região de Donetsk, onde os ucranianos ainda dominam cerca de 25% desta geografia anexada pela Rússia em 2022, sendo que actualmente o foco está nas cidades de Pokrovsk-Mirnohrad, parte de um eixo de cidades-fortaleza que, sendo penetrado, deixa os ucranianos em muito maus lençóis e os russos com caminho aberto para as margens do Rio Dniepre, o maior pesadelo de Zelensky e os seus comandantes militares.
Orban, o ponta de lança
É precisamente neste contexto, desfavorável a Kiev, que Orban pode marcar pontos, mas não apenas em Washington e Moscovo, também na União Europeia, onde emerge como um dos raros líderes que se opõe ao apoio europeu a Kiev e obstaculiza a entrada da Ucrânia no bloco europeu, embora nesta parte conte com o apoio de mais países que, por ora, não o manifestam mas são conhecidos... desde logo os países do sul que, com a entrada ucraniana, perderão uma boa parte dos fundos de coesão comunitários.
Curiosamente, ao mesmo tempo que Orban chega a Washington, em Kiev, Volodymyr Zelensky, mesmo depois de Trump ter vindo a público dizer que não vai fornecer os famosos mísseis Tomahawk aos ucranianos, como o próprio chegou a admitir, provocando a fúria russa, com o Kremlin a avisar que isso seria uma escalada imprevisível, divulgou um vídeo onde garante que a Ucrânia está a negociar com os americanos o fornecimento de dezenas destas armas.
Apesar disso, esta informação de Zelensky não foi ainda confirmada pelos EUA, mas Trump e o seu enviado especial para contactos com os russos, Steve Witkoff, segundo avança a RT, divulgaram nas últimas horas que, mesmo contrariando as evidências, "existem progressos muito importantes" no contexto das negociações para a paz na Ucrânia.~
Esta ideia foi avançada por Donald Trump após um encontro com vários líderes de países asiáticos na Casa Branca, esta quinta-feira, sublinhando o seu redobrado empenho para resolver este conflito, que diz ser o 9º em oito meses, embora ninguém perceba esta contabilidade do Presidente norte-americano...
"Estamos a olhar agora para a Ucrânia, e é possível que uma solução apareça em pouco tempo. Ainda não está definida, mas já fizemos muito, há um forte progresso nessa direcção", apontou Trump, no que foi secundado por Witkoff.
Este foi ainda mais longe, sublinhou as dezenas de encontros com Putin em Moscovo este ano, notando que "tem havido muita discussão, incluindo questões técnicas que têm de ser resolvidas para que seja possível um encontro ao mais alto nível - Zelensky e Putin - e o senso existente é que já foi feito muito progresso nesse sentido".
Putin aposta em Trump
Como o Novo Jornal também noticiava esta quinta-feira (ver aqui), há muito que se sabe que o Kremlin aposta muitas das suas fichas em Trump como abre-latas para um acordo de paz com a Ucrânia e Putin confidenciou ao norte-americano que deposita nele essa esperança porque o próprio Presidente russo assume o falhanço de o conseguir nos últimos 10 anos.
Aqui chegados, e atendendo ao que vários analistas têm apontado, parece que uma sucessão de acontecimentos, que vão da crise económica interna à derrocada eleitoral desta semana, passando pela obrigatoriedade de Trump se focar nas promessas eleitorais que lhe deram a vitória, é possível que o imbróglio ucraniano seja agora ainda mais secundário para a Casa Branca e que esteja em curso um plano para sair de cena nesta guerra, como tem sido admitido desde que este regressou ao poder a 20 de Janeiro deste ano.
A eventual derrota ucraniana na batalha pela cidade estratégica de Pokrovsk, sendo notado que os russos estão a empenhar uma grande quantidade de meios, equipamento e humano, nestes combates, pode ser um factor de aceleração de uma solução negociada, porque o risco de Kiev perder, nessa circunstância, ainda mais territórios, é grande.
Para piorar o cenário do lado ucraniano, além das cidades de Pokrovsk e MIrnohrad estarem à beira de cair, também a ainda mais relevante cidade de Kupiansk, no mesmo eixo-fortaleza mas já na região de Kharkiv, segundo as chefias militares russas, estará nas mãos de Moscovo em uma semana.
Kupiansk, com 5.500, é uma das cidades em que os russos afirmam terem mais de 10.500 soldados ucranianos cercados e sem capacidade de fuga, a outra é Pokrovsk, com 5.000, a quem deram a oportunidade de se renderem para salvas as suas vidas, embora os combates continuem e Kiev negue veementemente que estas localidades estejam perdidas, garantindo que as suas forças estão mesmo a afastar o inimigo para fora das suas "muralhas".
Perante este cenário alargado, é hoje possível afirmar que a guerra na Ucrânia pode estar a ser decidida em duas frentes bem definidas, na batalha diplomática em Washington e nos combates rua a rua em Pokrovsk e Mirnohrad, no Donbass, e em Kupiansk, em Kharkiv. Em breve se saberá o resultado.











