Volodymyr Zelensky, desde a invasão russa em Fevereiro de 2022, nunca esteve tão severamente exposto ao problema da corrupção na Ucrânia como agora que um seu aliado e amigo de longa data aparece envolvido num esquema criminoso de centenas de milhões.

A Ucrânia tem um longo passado de corrupção endémica, com os media ocidentais a sinalizar essa situação com repetidas manchetes antes de 2022, mas este é o primeiro caso que atinge mediaticamente o coração do regime em quatro anos de conflito.

No epicentro deste furacão de corrupção agora tornado público, está o oligarca Timur Mindich, um associado próximo de Volodymyr Zelensky e do seu principal conselheiro, Andriy Yermak, que com outras sete pessoas, incluindo o ministro da Justiça, Herman Galushchenko, entretanto demitido, pagou centenas de milhões para controlar empresas estatais.

No topo das empresas que este grupo criminoso próximo de Zelensky pretendia controlar, segundo avança o Kyiv Independent, um jornal ucraniano até aqui ligado ao regime, está a Energoatom, a agência que detém e que gere a rede de centrais nucleares do país.

Neste esquema, segundo o mesmo site de notícias, o grupo liderado por Mindich, que fugiu do país para parte incerta, pagou mais de 100 milhões de dólares a líderes políticos governamentais de forma a agilizar o controlo de várias empresas públicas.

O esquema foi desmantelado pela NABU, a agência nacional anti-corrupção, financiada e criada por fundos europeus e norte-americanos, que há menos de dois meses Zelensky procurou desmantelar mas foi obrigado a recuar por pressão de Bruxelas e de Washington.

Sobre este assunto, que mereceu apenas ligeiras menções nos media ocidentais, claramente empenhados em não prejudicar a imagem de Zelensky para não fragilizar o seu papel de líder na guerra com a Rússia, o próprio Presidente ucraniano apenas se lhe referiu numa simples frase.

Aludindo à importância de combater a corrupção no seu regular vídeo de fim de dia, Volodymyr Zelensky, citado por The Guardian, avançou que "a corrupção deve ser combatida e que os seus protagonistas devem ser punidos".

Mas sem nomear Timur Mindich, que é o proprietário actual da Kvartal95, uma produtora de entretenimento fundada por Volodymyr Zelensky em 2003, com uma vasta gama de produções, incluindo a série que o catapultou para a fama enquanto actor, "Servo do Povo", a partir da qual foi forjada a sua candidatura real à Presidência porque representava um "Presidente" impoluto e incorruptível.

Recorde-se que ao longo deste quatro anos de conflito firam várias as notícias sobre desvios de grandes quantidades de armas fornecidas pelos aliados da NATO à Ucrânia para o mercado ilegal internacional, com casos a serem relatados de equipamento a aparecer nas mãos dos carteis mexicanos ou de grupos terroristas no Médio Oriente, mas nunca como este assumidos oficialmente.

Há também vários momentos de stresse em Kiev com membros do Congresso norte-americano a exigirem a verificação e vigilância sobre as centenas de milhões de dólares entregues devido a suspeitas de desvios, mas nunca provados cabalmente...

A frágil situação no campo de batalha

Entretanto, a juntar a esta "frente" palaciana, que alguns analistas sublinham estar a ser mais noticiada localmente que nos media ocidentais britânicos, franceses ou alemães, o que permite pensar em lutas tremendas nas entranhas do regime de Kiev, junta-se o aparente colapso em vários pontos da frente de batalha.

Depois de semanas a procurar negar a inevitável queda da estratégica cidade de Pokrovsk-Mirnohrad, em Donetsk, apesar de já estar quase totalmente sob ocupação russa (pokrovsk), ou cercada, na zona de Mirnohrad, eis que a realidade se tornou demasiado evidente para poder continuar a ser negada.

Pokvrovsk-Mirnohrad, um aglomerado de duas cidades-gémeas, que integram uma linha de cidades fortificadas, que envolve ainda Kupiansk, mais a norte, se cair, como parece já estar a suceder, abre uma estrada indefensável para as margens do Rio Dniepre, o maior pesadelo para Kiev e para os seus aliados ocidentais.

E já nas últimas horas, o próprio Zelensky, depois de serem conhecidas imagens de colunas militares russas a entrarem em Pokrovsk sem oposição, veio admitir que a situação nesta cidade, conhecida como Krasnoarmeysk pelos russos, é cada vez mais difícil.

Entretanto, mais a sul, em Zaporizhia, é o próprio CEMGFA ucraniano, o general Oleksandr Syrskyi, curiosamente de origem russa, pais (então URSS) onde nasceu e estudou, na região de Vladimir, que vem admitir um "agravamento sério" na frente de batalha de Oleksandrivka e Huliapole.

Nestas duas direcções dos combates, devido à escassez de meios humanos e material de guerra, segundo Syrskyi, numa publicação nas redes sociais, "o inimigo está a avançar e a capturar localidades", confirmando assim o que vários canais de guerra pró-russos e neutrais estão a apontar já há vários dias.

Já se implora a Zelensky

Tendo em conta esta situação dramática para as forças de Kiev, especialmente em Pokrovsk, notícia esta quarta-feira, 12, o Financial Times, dezenas de especialistas militares e organizações cívicas ucranianas e ocidentais, estão a "implorar" a Zelensky para aceitar que as unidades cercadas ou prestes a serem cercadas possam retirar de modo a salvar as vidas de milhares de soldados.

Estes pedidos surgem depois de quase três semanas de aperto do cerco russo a Pokrovsk-Mirnohrad, com as chefias militares ucranianas a procurarem manter posições, enquanto as linhas de logística terrestres, estradas e caminhos-de-ferro, eram tomadas pelas unidades de Moscovo.

Apesar de, como chamou à atenção o especialista militar major-general Agostinho Costa, há mais de uma semana, apenas uma estreita faixa de menos de 1 km está disponível para a retirada, deixada assim propositadamente pelos russos para a saída da tropa, mas controlada pela artilharia e drones para evitar a saída de material militar.

Com escassa possibilidade de retirada, a não ser através de um acordo com os russos, vários políticos e organizações ucranianas estão a pedir a Zelensky que salve aquelas centenas, ou milhares, de homens encurralados em Pokrovsk, mas também em Kupiansk, mais a norte, na região de Kharkiv, onde se estima estarem 5 mil soldados cercados.

O britânico Financial Times cita a este propósito o antigo deputado Vitaliy Deynega que assume que a situação é "mais complicada agora e menos controlada" apelando às chefias militares e políticas que retirem dali os homens "enquanto é possível".

Porém, o que Deynega diz é o que é repetido por Zelensky, que o cerco ainda não é efectivo e, assim, os militares ainda podem deixar as zonas de Pokrovsk e Kupiansk, mas a realidade é já diferente, segundo vários bloggers de guerra, que garantem que só um acordo para a retirada com os russos, ou a sua rendição pode salvar aqueles homens.

O mesmo Financial Times e alguns media ucranianos já estão a assumir o que noutros media, nalguns casos pró-russos, é avançado há largos meses, que a escassez de homens nas fileiras ucranianas começa a ser impossível de resolver.

Isto já está a ser assumido mesmo pelo general Oleksandr Syrskyi no caso da frente de Zaporizhia, e resulta de crescentes deserções, como media fortemente pró-ucranianos, entre estes a Euronews e a DW já admitiram e que, segundo várias fontes, já ultrapassaram as 300 mil...

E o mesmo Financial Times, citando um instituto polaco de análise, Rochan Consulting, largas partes da frente de guerra, devido â escassez de soldados, já só é coberta e protegida na parte ucraniana por drones.

Entretanto (ver links em baixo), depois de uma série de episódios circenses em torno de um encontro com o Presidente russo Vladimir Putin na capital húngara, Budapeste, que Donald Trump se apressou a avançar e a cancelar, eis que o Presidente norte-americano volta a anunciar esse mesmo encontro, agora o final de Novembro.

O Kremlin ainda não se pronunciou sobre esta nova agenda Trump-Putin, mas em Moscovo, sobre este tópico, o comentário tem sido sempre a favor do vento gerado pelo furacão Trump: o Presidente russo não deverá recusar o convite.

Mas também não deverá alterar a posição russa (ver links em baixo) sobre as condições para acabar com a guerra, como o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, repetiu ainda esta terça-feira, 11.