Pelo menos dez embarcações industriais foram vistas a pescar, nos últimos dois dias, no perímetro entre Benguela e Namibe, a três milhas das praias, fora da área que a lei define para a prática do arrasto, com a agravante, segundo denúncias, de terem capturado centenas de toneladas de carapau, espécie sob protecção especial até terminar o mês de Agosto.

O facto está a agitar armadores da Baía-Farta, a 26 quilómetros da cidade de Benguela, sobretudo pela quantidade de arrastões que se fizeram à pesca do pelágico mais valioso, nesta altura em desova.

São embarcações ao serviço de empresas chinesas com participação de angolanos, baseadas nos dois maiores pólos pesqueiros do País, um deles com uma fábrica de conservas, no Tômbwa, e outro à espera de uma unidade de conservas de atum e outras espécies.

Entre os autores da denúncia, armadores de Benguela e do Namibe, ligados aos ramos artesanal e semi-industrial, houve quem tivesse aventado a hipótese de algumas apreensões, mas o Gabinete Provincial de Benguela do Ministério da Agricultura e Pescas disse não ter conhecimento.

"Nem em relação a uma suposta apreensão no Namibe", assinalou um alto dirigente do sector, ao admitir estar por dentro desta denúncia.

A verdade, tal como confidenciou fonte bem posicionada no pelouro dirigido pelo ministro António Francisco de Assis, é que se encontra retida no Namibe, sob custódia da fiscalização pesqueira, um arrastão russo com cerca de trezentas toneladas de carapau a bordo.

"Não se sabe se faz parte do grupo visto a três milhas nas últimas horas, mas foi apreendido por prática de pesca ilegal", ressaltou a fonte.

Estas movimentações, quase três meses depois de João Lourenço ter defendido, em Lisboa, na Cimeira Mundial sobre os Oceanos, combate à pesca ilegal mediante cooperação a nível da CPLP, são vistas como retrocesso na luta pela recuperação da biomassa do carapau, encetada há mais de quinze anos, tendo passado pelos ex-ministros Salomão Xirimbimbi, Afonso Pedro Canga e Victória de Barros Neto.

Apesar do período de veda, o carapau está a ser adquirido em centros frequentados por peixeiras/zungueiras, como atesta a imagem captada pouco depois de a denúncia ter chegado ao Novo Jornal.

"Nós, praticamente, temos uma empresa, com pequenos barcos. Quem nos fornece são os nossos pescadores, eles também conseguem o carapau e a cavala", disse Joana Ngueve, peixeira que deambulava pela cidade das "Acácias Rubras".

O Gabinete da Agricultura e Pescas anunciou, pouco depois, a apreensão, há algumas semanas, dentro do período de veda, de carapau transportado da localidade do Cuio, município da Baía Farta, em duas carrinhas com capacidade superior a cinco toneladas.

Ao NJ, em 2021, já o presidente da Aliança Empresarial de Benguela, Adérito Areias, homem da pesca e do sal, tinha afirmado que "o País não sabe ao certo o que pesca", numa alusão, entre vários factores, à débil fiscalização na costa angolana.

Há sempre carapau na rede lançada para outras espécies

As embarcações industriais que operam em Angola acabam de sair de uma inspecção que reforçou a necessidade de trégua ao carapau, a vigorar há já dois meses, apontando para a captura da sardinha, outra espécie pelágica muito consumida pela população.

Mas há, embora se observe a veda, uma excepção à regra, conforme avançou fonte oficial que prefere não ser identificada.

Se um industrial tiver de capturar, por exemplo, 20 toneladas de sardinha, não terá como separar o carapau que, involuntariamente, venha a ser apanhado. "Aí, conforme a legislação, pode capturar, no tocante ao carapau, até 10 por cento da quantidade de sardinha a que tem direito. Estamos a falar, neste caso, de duas toneladas de carapau", avançou, sem nunca ter comentado o teor das denúncias que envolvem os >.

A área estabelecida por lei é de seis a doze milhas, dependendo da classe de cada uma das embarcações que praticam a pesca por arrasto.

Quatro milhas estão para os agentes da pesca ao cerco, os semi-industriais.

Há quase cinco anos que Angola já não recorre às importações (a cifra era de 90 mil toneladas/ano) para fazer face ao período de veda do carapau.