Angola e o Equador partilham o petróleo como uma das principais fontes de receita do país, embora o país sul-americano tenha ainda o turismo como um sólido alicerce para a sua economia, cujo Produto Interno Bruto (PIB) chega aos 103 mil milhões de dólares norte-americanos, menos cerca de 20 mil milhões que o angolano.
No entanto, a população do Equador fica-se pelos 17,3 milhões quando em Angola quase toca os 30 milhões, e a produção de petróleo local é menos de um terço da angolana, cerca de 500 mil barris por dia no país sul-americano, segundo dados da OPEP, e mais de 1,4 milhões em Angola.
A crise de um e do outro lado começou a emergir em 2014, quando o preço do barril do petróleo iniciou uma forte queda, de mais de 110 USD por barril para menos de 30 no início de 2016.
E o pedido de ajuda ao Fundo Monetário Internacional (FMI) começou a ser pensado e desenhado mais ou menos na mesma altura, sendo que Angola assinou o acordo em Dezembro de 2018 e o Equador fez o mesmo pouco depois, no início deste ano.
Luanda acordou um empréstimo do programa económico de Angola apoiado por um acordo alargado ao abrigo do Programa de Financiamento Ampliado (EFF, na sigla em inglês), de 3,7 mil milhões de USD e Quito acordou nos 4,3 mil milhões de dólares norte-americanos.
Com as obrigações incluídas nos acordos com o FMI, o Equador apressou-se a colocar no terreno as reformas urgentes, com o fim dos subsídios aos combustíveis no topo da lista, até porque o país gasta anualmente com esta rúbrica mais de 1,3 mil milhões de dólares de forma a manter o preço da gasolina nos 0,49 cêntimos de dólar.
Com o anúncio do fim dos subsídios aos combustíveis, a gasolina, por exemplo, deverá passar a custar 1,10 USD, pouco mais do dobro do que era o seu custo a 30 de Setembro, o que gerou uma vaga de protestos populares pouco ou nunca vistos no país.
A indústria petrolífera foi em grande parte suspensa e as forças de segurança e militares foram obrigados a tomar de assalto, com grande violência, as ruas de Quito e de outras localidades do país, deixando o Equador a ferro e fogo.
De tal modo que o Presidente Lenin Moreno foi obrigado a mudar a capital de Quito para Guayaquil para evitar o desmoronamento do Estado a partir das ruas em alvoroço permanente desde que no início deste mês ficaram a ser conhecidas as consequências do fim dos subsídios estatais aos combustíveis.
Em Angola, onde o Governo gasta oficialmente pouco mais de 2 mil milhões de dólares nos subsídios aos combustíveis, mais 700 milhões USD que no Equador, a opção do Executivo de João Lourenço foi protelar a extinção dos subsídios, pelo menos até 2020, optado por uma transição suave, embora como o Ministério dos Petróleos já admitiu, e o FMI garantiu, esse fim dos subsídios tenha já calendário macado por ser insustentável face à crise que o país atravessa.
Para melhor controlar os fluxos monetários para o país, vitais nesta fase e para fazer face à crise, o Governo de Quito decidiu, de forma inesperada, abandonar a OPEP (Organização de Países Produtores de Petróleo), o que o desobriga dos mecanismos de controlo da produção, passando o país a poder definir os preços e o volume produzido.
Esta semelhança da moldura da crise, apesar de num e noutro país se terem definido timings diferentes de resposta e da implementação de medidas, como a questão do fim dos subsídios aos combustíveis - que no Equador foi claramente o fósforo que acendeu a fogueira dos protestos - pode levar Luanda e o FMI a reescalonar as medidas e as reformas mais severas para a população, visto que o impacto está, pelo menos como possibilidade, à vista nas ruas de Quito.
A maior parte dos manifestantes nas ruas de Quito pertencem à larga maioria de indígenas que habitam as zonas montanhosas dos Andes equatorianos, mas também milhares de estudantes das universidades e ainda os sindicatos, com grande influência nas manchas urbanas e periurbanas, perfazendo aquilo que é uma larga amostra do caldo cultural em que se ergue a sociedade do Equador.
A violência foi de tal modo inesperada que o Presidente Moreno, para além de mudar a capital, declarou o estado de emergência e colocou todas as suas forças de segurança, incluindo o Exército, nas ruas, para tentarem travar o avanço dos manifestantes armados de paus, que, dia após dia, chegam do interior às cidades a pé ou nos meios de transporte disponíveis, mesmos os mais rudimentares, parecendo que a única coisa que importa é chegar ao local dos protestos, como tem sido profusamente divulgado nos media internacionais.
Com a produção petrolífera diminuída para um terço e a economia travada nas ruas em alvoroço generalizado, Lenin Moreno deixou-se encostar às cordas, estando neste momento a bater em retirada, com a mudança da capital de Quito, no interior do país, para Guayaquil, a cidade mais populosa do país, localizada na costa centro-sul do Equador, sem que, segundo relatam hoje as agências de notícias, se perceba como é que estes protestos poderão ser travados devido ao crescendo dos manifestantes nas ruas.
Uma das possibilidades é que o Governo retroceda na decisão de acabar com o subsídios aos combustíveis, mantendo-os em preços claramente abaixo do mercado, até porque, quando se compara com os países vizinhos, percebe-se que gasolina custa metade do que custa na Colômbia ou no Peru.
Para já, Moreno ofereceu-se para negociar com os lideres indígenas, mas sem que tenha dado garantias de que vai retroceder na questão dos combustíveis, acusando a oposição e o seu antecessor, Rafael Correa, de estar por detrás dos protestos, juntando a este o Presidente da Venezuela, NIcolás Maduro, que Moreno diz estar a financiar os manifestantes para conseguir um "golpe de Estado" no Equador.
Todavia, embora negando estar a fomentar os protestos, Rafael Correa exigiu a realização de eleições antecipadas.
A oposição, quase em uníssono, tem apontado o dedo tanto a Moreno como ao FMI. Mas o facto de as alternativas serem escassas, o Presidente equatoriano não deverá ceder totalmente, até porque se o fizer, esta e as reformas seguintes serão ainda mais negadas... nas ruas.