Para conseguir mudar o rumo dos EUA, tanto interna como externamente, o 47º inquilino da Casa Branca já tem preparados largas dezenas de decretos presidenciais, a que os norte-americanos chamam ordens executivas, para assinar assim que tomar posse.
A mudança esperada, percepcionada pelo rodízio de promessas e garantias, é de tal magnitude que há mesmo quem, com ironia, já diga que se prepara para usar tanto poder para criar um novo fuso horário no Planeta Terra, o seu próprio tempo, a "hora Trump".
Como um pêndulo a baloiçar do tecto do Capitólio, onde, ao contrário da tradição, terá lugar a cerimónia de posse, devido ao frio extremo no exterior, enquanto estiver a jurar fidelidade à Constituição dos EUA, está também a sua promessa eleitoral de ser "ditador por um dia".
Com esse poder absoluto de ditador (ver links em baixo), mesmo que sob a condição de figura de estilo, Donald Trump pretendeu definir o azimute para o seu movimento eleitoral, MAGA, que em inglês é a sigla para "fazer a América grande de novo" a partir da Casa Branca.
Mas nem seria necessário cumprir a promessa de governar por 24 horas como ditador, porque o 47º Presidente dos EUA, a partir das 12:00 locais, terá com ele todo o Congresso, a Câmara dos Representantes e o Senado, cujas maiorias são agora republicanas.
E o que vai o "ditador" dos EUA por um dia fazer com tanto poder? O próprio já explicou: vai querer dar início a uma gigantesca expulsão de imigrantes ilegais dos EUA, vai querer promover a exploração recorde de petróleo no país e, entre outras prioridades, acabar com a guerra na Ucrânia e no Médio Oriente ou espalhar tarifas extra sobre as importações da China, do Canadá, da Europa...
O Usain Bolt dos decretos
Há mais que estas prioridades, mas se o seu lote de decretos presidenciais abranger estes temas com a assertividade prometida, e repetida no comício que realizou este Domingo, em Washington, 24 horas antes de assumir o cargo, então esta segunda-feira, 20, será histórica nos EUA.
Para já, ainda nesse comício, Trump prometeu fazer de si mesmo durante o longo processo de inauguração da sua Presidência, que é o mesmo que dizer, o "entertainer", prometendo aos norte-americanos, e ao resto do mundo, que esta segunda-feira será "um dia divertido para ver televisão".
O que ele queria dizer é que, por causa do frio extremo esperado em Washington para a hora da cerimónia, até 12º negativos, dentro do Capitólio só podem estar umas escassas centenas de pessoas, não podendo vingar-se da luta pelos números de assistência no exterior, que em 2017 o deixaram bastante atrás de Barack Obama.
O que ele pretende com a promessa de um grande momento televisivo é conseguir substituir a desforra da derrota nos números da assistência "ao vivo" para a batalha das audiências, onde deve ter, desta vez, a sua oportunidade para brilhar, como tanto gosta...
A imagem que está a ser usada em alguns meios para exemplificar o que se espera nas horas seguintes à tomada de posse é uma corrida de 100 metros barreiras na forma de assinatura de ordens executivas até lhe doer a mão, disparando em todas as direcções, desde a imigração ilegal ao tema dos direitos "trans", ao seu filme preferido que é o "Drill, baby drill", que é como quem diz, "produzir mais e mais petróleo" etc.
E tudo em nome do seu slogan mais sublinhado, "Make America Great Again", com uma ligeira nuance, que foi a frase "maior que alguma vez foi" ao longo dos 248 anos de existência dos EUA, o que pode ter várias interpretações, sendo uma delas fazer deste país geograficamente maior que nunca.
Isto, porque os dias que antecederam este 20 de Janeiro foram marcados, entre vários temas, como é usual na vida política do frenético e imprevisível Donald Trump, pela ameaça de anexar o Canadá, de invadir a Gronelândia, uma gigantesca ilha no Ártico, pertencente à Dinamarca, e o Canal do Panamá.
Há analistas que defendem que Trump atirou para a pantalha mediática este melindroso tema para ofuscar as suas promessas mais sérias de acabar com a guerra na Ucrânia em 24 horas e expulsar em tempo recorde milhões de imigrantes ilegais, porque, como sucede regularmente, fez promessas que não é possível cumprir nos tempos e nos modos apontados.
Porém, no seu discurso de Domingo, que pode ser visto como uma síntese menos contida do que vai dizer hoje no discurso da tomada de posse, o ainda Presidente-eleito voltou a meter esteróides nas palavras e reafirmou as garantias de que vai "com rapidez histórica" resolver "todas as crises que afectam o país".
Mais uma nuance
Há, como é costume, sentindo-se apertado pela impossibilidade de fazer o que prometeu, uma nova nuance nestas palavras, porque se refere unicamente às crises que afectam directamente os EUA, e a guerra na Ucrânia é do outro lado do Atlântico é a guerra de Joe Biden e não a sua guerra.
E no que diz respeito às outras promessas mais flamejantes, como a expulsão acelerada de migrantes ilegais ou o seu "drill, baby drill", isso é mais fácil de diluir no braseiro mediático, porque basta-lhe mostrar as ordens executivas a serem assinadas... já a guerra no leste europeu, tropeçou nas próprias palavras porque garantiu que estava tudo preparado mesmo antes de tomar posse...
Já quanto ao show televisivo prometido, o road map é este: "Todas as decisões palermas e radicais tomadas pela Administração Biden vão ser anuladas em horas", o que vai dar, prometeu, "longas horas de grande espectáculo televisivo" porque "é tudo para assinar num só dia" mesmo que o normal fosse fazê-lo no prazo de semanas.
Entre essas dezenas, quiçá centenas, de decretos, estarão seguramente aqueles que vão perdoar e libertar da justiça todos os seus apoiantes que a 06 de Janeiro de 2021 invadiram o Congresso, naquilo que muitos viram como uma tentativa de golpe de Estado onde morreram várias pessoas e centenas foram detidas...
"Amanhã (esta segunda-feira, 20) todos os que estão nesta sala vão ficar muito contentes quando virem a minha decisão sobre os reféns do 06 de Janeiro... vão ficar muito, muito contentes", disse ainda o tempestuoso Trump no comício que fez no Capital One Arena, em Washington.
Parte do espectáculo de Trump pode ter mesmo lugar antes de se sentar à mesa da Sala Oval para assinar a papelada, porque é da praxe que o antecessor e a mulher receba o novo Presidente e a mulher para lhe mostrar os cantos à Casa Branca...
Já se sabe que Melania Trump não aceitou o convite, o que faz com que Trump assuma sozinho a simpatia devida ao convite de Joe e Jill Biden, explicando-lhes, por exemplo, o que queria dizer quando disse que iria reverter em tempo recorde as decisões "palermas" da sua Administração...
Há, no entanto, uma vitória que Trump já leva no bolso antes de assumir o poder da caneta presidencial, que é o acordo de cessar-fogo entre Israel e o Hamas, que, ainda no Domingo voltou a insistir que se deveu apenas à sua intervenção na condição de Presidente-eleito, mesmo que Bidene tenha assumido também para si esses louros.
Talvez possam discutir este assunto também à hora do chá que Joe e Jill Biden lhe vão oferecer... Mas pode não ser o único, poderão ainda trocar umas impressões sobre a rede social Tik Tok, que Biden proibiu nos EUA e Trump já disse que vai anular essa decisão rapidamente.
Os fogos de Hollywood, Musk e o filme "Drill, baby drill"
Uma curiosidade para os observadores poderá ser acompanhar a visita que disse que vai fazer logo a seguir à inauguração do seu segundo mandato, sendo o segundo Presidente entre os agora 47 desde 1776, ano da independência dos EUA, que assume o poder intercaladamente, a Los Angeles, Califórnia, para se inteirar in loco sobre a situação dos fogos que destruíram milhares de casas, incluindo dezenas de actores conhecidos, e mataram dezenas de pessoas, nas últimas duas semanas.
Todos os especialistas ligaram esta avalanche de fogo às alterações climáticas, mas Trump é o negacionista nº 1 do efeito da poluição dos combustíveis fosseis no clima global em ebuliente alteração e, agora, perante mais esta evidência, o que irá ele dizer às vítimas, incluindo alguns dos actores que poderiam entrar no "filme" que pretende "realizar" que é o "Drill, baby drill"?
A resposta só ele sabe qual será, por agora, mas no mundo maravilhoso de HollyWood, tudo é possível, dependendo apenas a mestria do guionista e do realizador, sendo, neste caso, parece que cena estarão dois dos mais convencidos génios MAGA: Donald Trump e Elon Musk.
E é em Elon Musk que que está concentrada uma boa parte das pequenas curiosidades para os próximos quatro anos... não serão os Estados Unidos da América pequenos demais para estes "gigantes"?!