Por detrás deste crescendo da tensão entre Washington e Teerão estão os ataques aos dois petroleiros que, na quinta-feira da semana passada, navegavam próximo do Estreito de Ormuz, uma passagem marítima de enorme importância estratégica planetária, que separa o Golfo Pérsico, bordejado por países como o Irão, o Iraque e a Arábia Saudita, e o Mar de Omã, que é a porta de entrada e de saída dos gigantescos petroleiros que levam o petróleo saudita, iraniano e iraquiano, entre outras fontes, para o mundo.

Como o NJOnline descreveu no Domingo, foram dois destes petroleiros que foram atacados na quinta-feira, segundo os EUA, pelo Irão, de acordo com o Irão, por alguém que não as suas Forças Armadas que pretende gerar condições para justificar um ataque, apontando, sem nomear, o dedo a Israel e aos EUA ou a Arábia Saudita, os seus maiores inimigos.

Os dois petroleiros que os EUA dizem terem sido atacados pelo Irão, no Golfo de Omã, pertenciam ao Japão - o Kokuka Courageous - e a um armador da Noruega, apesar de navegar com pavilhão das Ilhas Marshall - o Front Altair - e as explosões ocorreram quando o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, estava em Teerão em conversações com o líder supremo iraniano, Ali Khamenei, e com o Presidente iraniano, Hassan Rouhani.

Ora, a presença de Shinzo Abe em Teerão é um dos mais fortes argumentos do Irão para sublinhar não fazer sentido a acusação feita pêlos EUA porque se sabe que o Japão é um dos mais empenhados aliados comerciais de Teerão e Abe um empenhado intermediário para evitar que a situação chegue à confrontação militar.

A Noruega é outro dos países que está a fazer mais esforços para que o diálogo possa evitar o recurso às armas e, por isso, alega o Irão, através do seu ministro dos Negócios Estrangeiros, "é completamente sem sentido pensar-se que o Irão se prejudicaria desta forma".

Mohammad Javad Zarif afirmou mesmo que estes ataques "não são apenas suspeitos, são mais que isso", disse sem especificar, citado pelas agências, acrescentando apenas que a coincidência das explosões e a presença do primeiro-ministro japonês em Teerão deve ser "analisada com toda a atenção".

Recorde-se que o Irão está de novo sob fortes sanções dos Estados Unidos que o impede de exportar, entre outros "castigos", o seu crude - o Irão é o 3º maior produtor da OPEP e o 5º maior do mundo -, depois de o Presidente Donald Trump ter, unilateralmente, contra os restantes parceiros - China, Rússia e União Europeia - abandonado o acordo nuclear que fora assinado em 2015 pelo seu antecessor, Barack Obama, e que a Agência Internacional de Energia Atómica, que supervisiona o programa nuclear iraniano, garante estar a ser cumprido integralmente.

Tudo indica que os EUA estão neste momento em busca de uma justificação sólida para lançar um ataque contra o Irão, com o apoio militante de Israel e o beneplácito da Arábia Saudita, defendido de forma acérrima pelos chamados falcões de Washington, o secretário de Estado, Mike Pompeo, e o conselheiro para a Defesa, John Bolton, ambos defensores da guerra punitiva contra o regime iraniano.

Com este envio de mais mil militares para a região do Médio Oriente, onde já estão pelo menos 2.000 em conjunto com a 5ª frota naval, que agrupa um porta-aviões e vários navios de guerra de apoio às dezenas de aviões-bombardeiros, os EUA dão mais um perigoso sinal de que o caminho para o confronto militar é cada vez mais largo.

A par deste envio de militares, Washington aumentou o cerco comercial e económico ao Irão, amentando as sanções, desta vez ameaçando os países que negoceiam com Teerão de que serão banidos do sistema financeiro global se não interromperem esses laços.

São "políticos sem experiência"

Face a este envio de mais mil militares dos EUA para a região, o Presidente do Irão, Hassan Rouhani, que tem mostrado uma postura paciente e um tom longe da gritaria guerreira de Trump, disse que o seu país "não tem qualquer desejo de guerra com nenhuma nação" e não vai declarar guerra a ninguém.

Rouhani disse ainda, numa entrevista, já hoje, à TV iraniana, que o que o país enfrenta neste momento não são os EUA ou qualquer outro país, mas sim um grupo de políticos norte-americanos inexperientes e com ainda menos experiência sobre esta região do mundo".

E sublinhou que, para já, todos os esforços feitos por estes políticos inexperientes" para enclausurar o Irão "foram coroados de total insucesso", mantendo as garantias de que não foi o Ião quem esteve por detrás dos ataques aos petroleiros "porque isso não faria qualquer sentido".

Para já, o Irão parece não mostrar receio dos EUA e, para além de manter há várias semanas as suas forças armadas em prontidão máxima, vai anunciado passos importantes no enriquecimento de urânio, o material radioactivo essencial para o fabrico de bombas nucleares.

Enquanto isto, os tradicionais aliados dos EUA, como o Reino Unido, antiga potência colonial no Irão, já vieram posicionar-se contra Teerão, e, do outro lado da barricada, a China e a Rússia têm feito estratégicas declarações onde manifestam discordâncias claras com os EUA, enquanto o Japão, que é um tradicional aliado de Washington, já manifestou publicamente a ideia de que não existem provas para aquilo que é a acusação feita contra os iranianos.

Numa primeira abordagem a esta questão, que assume especial importância porque é real a possibilidade de uma guerra desestabilizadora de todo o Médio Oriente, com repercussões mundiais garantidas é real como nunca foi, o Japão pediu oficialmente aos EUA mais provas sobre as acusações de que foram os iranianos a lançar os ataques aos petroleiros, que, recorde-se, o Irão negou desde o primeiro minuto e de forma veemente.

Alias, vários analistas ouvidos nas horas seguintes aos ataques por media internacionais, mesmo que próximos do Irão, dizem que esta pode ter sido uma mal preparada acção dos EUA para culpar o Irão, o que só seria possível se os estrategas de Washington não tivessem percebido que os dois petroleiros estavam ao serviço do Japão e da Noruega, dois países que o Irão não quereria incomodar de todo por interesse próprio.

Mas, recorde-se igualmente que o chefe da diplomacia norte-americana, Mike Pompeo, veio a terreiro descrever as razões da acusação ao Irão, nomeadamente o tipo de armas usadas, o conhecimento necessário para levar a cabo uma operação destas e os recursos para a sofisticação mostrada na sua execução.

Mas, como recorda o Governo de Tokyo, através da agência de notícias japonesa, Kyodo, citando o ministro dos Negócios Estrangeiros nipónico, se o Irão detinha tal capacidade, "também os EUA e Israel (- os dois mais importantes inimigos declarados do Irão em todo o mundo -) têm essa mesma capacidade" lembrando que os EUA têm na região uma das suas mais importantes frotas navais, a 5ª, incluindo um porta-aviões e dezenas de bombardeiros e outro tipo de aviões de guerra.

Face a isto, nos próximos dias deverá revelar-se fundamental a questão da prova sobre a autoria dos ataques aos petroleiros, factor que pode inibir ou conduzir a uma guerra aberta nesta estratégica região do globo.