Mas, esse é o prato que, servido à mesa há anos sem arrotarmos, nos vem provocando sérias congestões. É por causa desse prato que estamos agora a pagar alto o preço dos excessivos condimentos partidários, que, durante décadas, andámos a colocar na panela.

Fizemos isso porque, ao longo de anos, fomos cercados por uma tribo de políticos, que, julgando-se superior por encarnar certos valores, acreditava que podia impor soluções partidárias para problemas governamentais.

"É tal a superioridade com que abraça as suas ideias, que a essa gente," como descreve o politólogo espanhol Ignacio Sánchez-Cuenda, "não lhe passa pela cabeça que não sejam compartilhadas por todos".

Por isso, "quando encontra alguém que pensa de um modo diferente atribui essa divergência (...) a um interesse espúrio".

Estamos, pois, perante uma casta que, se se detivesse no alcance da tirada do antigo Presidente português Jorge Sampaio, concluiria, por certo, que, por aqui, também "há mais vida para além das receitas partidárias".

Ao transformar a política numa obsessão pública, podemos não dar conta, mas, ao fazê-lo, andamos a pôr a nu a nossa imperícia no "savoir-faire".

Por excesso de política, consumida ao mata-bicho, almoço e jantar, não podemos, por capricho ideológico, continuar distantes do vasto universo do conhecimento nas suas múltiplas e contraditórias variáveis.

Foi por causa desse "distanciamento social" imposto de cima para baixo que nos tornámos reféns de uma visão política deformada e reducionista, que, há décadas, deposita em quatro a cinco cabeças do mesmo tronco doutrinário o monopólio do pensamento económico do país, que decide o destino de milhões de angolanos, com os resultados (desastrosos) à vista...

Não se proclama aqui a falência da política, mas, em face do chamamento do pragmatismo governativo, não podemos deixar de a aquartelar nas suas fronteiras.

Se não o fizermos, a mistura, transportando frustrações e fracassos, acabará por provocar a combustão, que, há anos, anda a aniquilar a governação. Agora, perante um modelo gasto, só temos uma saída: arrepiar caminho.

Arrepiar caminho para abandonar as teses de uma casta que, reduzindo os seus argumentos a uma dimensão proclamatória, ao longo de anos, vem recusando o debate.

Arrepiar caminho para desafiá-la a abandonar clichés verbais ilusionistas e a deixar de ter medo de confrontar a divergência.

Arrepiar caminho para "chocar de frente" com académicos, economistas, engenheiros, médicos ou juristas que não alinham com as mesmas teses que os comités de especialidade do Governo.

Arrepiar caminho para afastar a omnipresença partidária na tomada de decisões puramente técnicas ou científicas, reconhecendo que a liberdade de divergência de opinião dos cidadãos não é compaginável com o espírito de fortaleza dos partidos...

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