Mas a comparação continua a colocar gravidade nesta pandemia, embora a Organização Mundial de Saúde (OMS) ainda não tenha reconhecido oficialmente que já se trata de uma pandemia, preferindo manter a designação oficial de pandemia com múltiplos focos globais, quando se comparam as listas de infecções globais, as letais e não letais, com a SARS a ficar abaixo das 7.000 e o 2019-nCoV a ultrapassar já as 40 mil.

Mas, se o continente africano costuma surgir nos gráficos das mais sérias pandemias ou epidemias que ciclicamente inquietam os organismos mundiais de saúde pública, neste caso, e depois de mês e meio em que o 2019-nCoV continua a ganhar dimensão geográfica e no número de casos mortais e infecções, o continente africano permanece em contraciclo sem casos reconhecidos pelos governos dos 54 países que o integram.

Isto, apesar de a OMS-África ter emitido uma nota onde descreve 13 países como prioritários - incluindo Angola - para vigilância e medidas profilácticas, com a entrega de kits de despistagem de eventuais casos, devido à fragilidade dos seus sistemas nacionais de saúde, à existência de grandes concentrações humanas em zonas sem infra-estruturas sanitárias, sem resposta médica imediata, e nos quais o coronavírus poderá evoluir velozmente.

Isto, quando da China surgem notícias que acrescentam gravidade à já muito grave situação que o país vive, como a morte de Li Wenliang, o médico que, contrariando o cerco das autoridades chinesas, que optaram por inicialmente esconder a dimensão do problema, e ainda com o desaparecimento de enfermeiras e jornalistas, como Chen Qiushi, que não se calaram e divulgaram para o resto do mundo aquilo que consideraram uma situação de grande gravidade, o que levou o Governo de Pequim a assumir que estava perante um prolema de saúde pública sério.

Nas redes sociais chinesas, apesar do controlo estatal rígido, são cada vez mais aqueles que criticam abertamente o Governo de Xi JInping pela forma como está a lidar com a situação e pela forma como procura esconder informação das pessoas no país.

E foi só depois de confirmada a dimensão avassaladora da progressão da infecção, com cidades inteiras, como Wuhan, onde o coronavírus 2019-nCoV foi inicialmente descoberto, com 11 milhões de habitantes, sob rígidas quarentenas, com a interrupção das deslocações internas em tempo de festejos do Ano Novo chinês, uma das maiores festividades nacionais do mundo, com mais de mil milhões de pessoas em movimento, e outras medidas de elevado calibre, que a OMS foi obrigada a declarar a emergência global de saúde pública.

Isto, quando a média de mortes diárias era, a 31 de Janeiro, quando a OMS declarou a emergência internacional, abaixo de 30 e hoje, 10 de Fevereiro, está quase em 100, com as primeiras mortes de estrangeiros na China confirmadas, sendo a primeira a de um norte-americano, de 60 anos, e em países como as Filipinas, surgiram as primeiras vítimas mortais fora da China, as quarentenas de pessoas que chegam do gigante asiático são já a norma em todo o mundo, quando cada vez mais países encerram fronteiras com este país -a Rússia foi o primeiro a fazê-lo - e quando as grandes companhias aéreas mundiais já deixaram de voar de e para aquele país.

Face a este cenário, a OMS acaba de anunciar que está a seguir para a China uma task force internacional, constituída por virologistas, especialistas em contenção de epidemias, técnicos de laboratório, etc, sendo esta equipa de dezenas de pessoas liderada por um dos mais proeminentes nomes destas emergências, Bruce Aylward, que o director-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, apelidou de "veterano das missões de emergência em saúde pública", tendo-se destacado no combate às epidemias de Ébola em África ou de pólio, em diversos locais do mundo.

Actualmente o vírus que surgiu em Wuhan já chegou a pelo menos 30 países, sendo os mais expostos Singapura, com 40 casos, a Tailândia, com 32, e o Japão, com 27. Na Europa é a Alemanha que conta mais casos. África é o único continente onde o vírus ainda não chegou, pelo menos oficialmente.

No Reino Unido, com oito casos confirmados, o Governo de Londres passou a situação, na escala local, para "séria e de risco iminente", o que permite às autoridades sanitárias optarem por algumas medidas mais radicais em nome da defesa da saúde pública, como, por exemplo, a colocação forçada de indivíduos em quarentena vigiada.

Alguns outros países estão a considerar seguir este exemplo, especialmente na Ásia e na Europa.

Entretanto, os grandes navios de cruzeiros estão a chegar à linha da frente das preocupações mundiais, com vários casos de quarentenas forças de milhares de passageiros, desde Hong Kong à Itália, entre outros locais, como os EUA.

Mas são cada vez mais os países que estão a retirar os seus cidadãos da China, especialmente das cidades mais expostas, como Wuhan, embora outros mantenham a opção inicial, como Angola, de não o fazer, optando por aconselhar a seguir as instruções das autoridades chinesas.

Entretanto, o director-geral da OMS fez nas últimas horas uma declaração na rede social Twitter que acrescenta gravidade ao actual cenário global, que foi a constatação de que estão a surgir casos de contaminação fora da China entre pessoas que nunca estiveram naquele país, mesmo que seja ali que surgem a esmagadora maioria dos casos de contaminações e de mortes por coronavírus.

"A detecção de casos pode ser indicação de uma transmissão mais laga noutros países; podemos estar a ver apenas a ponta do iceberg ", disse o chefe da OMS, Tedros Ghebreyesus.

"Num contexto de emergência pública internacional, todos os países devem fazer acrescidos esforços para se prepararem paraa possível chegada deste vírus e para o conter imediatamente. Isto exige capacidade laboratorial para diagnósticos rápidos e seguimento das pessoas que tenham interagido com os casos conformados", disse ainda.

Nestes dias muito poderá mudar na China e no resto do mundo porque as autoridades de Pequim determinaram que as pessoas, fora das cidades mais afectadas, ainda em quarentena, vão voltar ao trabalho e mesmo as pessoas que foram impedidas de viajar para o exterior, vão poder fazê-lo a partir de agora.

O vírus em Angola

A par das medidas em curso aplicadas pelo Ministério da Saúde, como o controlo à chegada nas várias fronteiras do país, é a comunidade chinesa em Angola que está a aplicar as medidas mais dramáticas, como explicou o seu embaixador, Gong Tao, em Luanda.

Evitar as viagens de e para a China e a redução da mobilidade interna são algumas das medidas auto-impostas pela comunidade chinesa em Angola de forma a contribuir para o combate global em curso contra o coronavírus.

Segundo o embaixador chinês em Angola, Gong Tao, em conferência de imprensa na passada semana, estas medidas que estão a ser seguidas pelos membros da comunidade chinesa em Angola, que ultrapassa os 250 mil, são voluntárias, porque, apesar de ter lançado um alerta internacional de saúde pública, a Organização Mundial de Saúde (OMS) não proibiu a movimentação de pessoas e bens.

Isso está a ser realidade também junto daqueles que se deslocaram por estes dias à China para comemorar junto das suas famílias o Ano Novo Lunar, a maior festa chinesa, e estão a retardar o regresso no âmbito das medidas preventivas consideradas adequadas.

Os que regressaram há poucos dias, para evitar quaisquer riscos, estão a proceder ao auto-isolamento.

O diplomata chinês, em conferência de imprensa realizada na sexta-feira em Luanda, admitiu que o vírus de Wuhan vai ter um impacto negativo nas relações económicas entre os dois países, mas notou que o mais importante é estancar esta pandemia porque os negócios podem esperar, "têm tempo".

Tao disse que a embaixada tem estado em permanente contacto com as autoridades angolanas, partilhando informações e cooperando no que diz respeito à assistência sanitária.

A embaixada está "muito atenta" no que diz respeito à comunidade chinesa, monitorizando a situação, sublinhando que para a representação diplomática de Pequim em Luanda, a saúde do povo angolano é tão importante como a do povo chinês.

Mas o Governo angolano procedeu nas últimas horas a algumas medidas mais intensas, como a quarentena obrigatória para todos aqueles que cheguem ao país oriundos de regiões chinesas mais expostas à doença, como a província de Hubei e a sua capital, Wuhan.

Para isso, foi criado uma unidade hospitalar de urgência na Barra do Kwanza, onde estão, actualmente, pelo menos 40 pessoas, como foi anunciado pelo Ministério das Relações Exteriores.

O vírus, o que é e o que fazer, sintomas

Estes vírus pertencem a uma família viral específica, a Coronaviridae, conhecida desde os anos de 1960, e afecta tanto humanos como animais, tendo sido responsável por duas pandemias de elevada gravidade, como a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS), transmitida de dromedários para humanos, e a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), transmitida de felinos para humanos, como início na China.

Inicialmente, esta doença era apenas transmitida de animais para humanos mas, com os vários surtos, alguns de pequena escala, este quadro evoluiu para um em que a transmissão ocorre de humano para humano, o que faz deste vírus muito mais perigoso, sendo um espirro, gotas de saliva, por mais minúsculas que sejam, ou tosse de indivíduos infectados o suficiente para uma contaminação.

Os sintomas associados a esta doença passam por febres altas, dificuldades em respirar, tosse, dores de garganta, o que faz deste quadro muito similar ao de uma gripe comum, podendo, no entanto, evoluir para formas graves de pneumonia e, nalguns casos, letais, especialmente em idosos, pessoas com o sistema imunitário fragilizado, doentes crónicos, etc.

O período de incubação máximo é de 14 dias e durante o qual o vírus, ao contrário do que sucedeu com os outros surtos, tem a capacidade de transmissão durante a incubação, quando os indivíduos não apresentam sintomas, logo de mais complexo controlo.

A melhor forma de evitar este vírus, segundo os especialistas é não frequentar áreas de risco com muitas pessoas, não ir para espaços fechados e sem ventilação, usar máscara sanitária, lavar com frequência as mãos com desinfectante adequado, cobrir a boca e o nariz quando espirrar ou tossir, evitar o contacto com pessoas suspeitas