Nem a Casa Branca nem o Kremlin podiam, sem correr riscos incalculáveis, verdadeiramente incalculáveis, e com todas as cartas em cima da mesa, incluindo a III Guerra Mundial, se um encontro entre os dois líderes das duas maiores potências militares mundiais acontecesse sem o resultado final já escrito, embora seja igualmente verdade que quando se trata de Donald Trump, tudo é possível...
E este resultado já estará, como o fazem notar a maioria dos analistas, sendo que a opinião prevalecente é que os EUA chegaram ao limite do que podiam fazer para sair da guerra na Ucrânia sem grandes cedências aos russos.
Guerra sobre a qual Donald Trump diz, desde que chegou ao seu segundo mandato, em Janeiro deste ano, que "é a guerra de (Joe) Biden", embora sem aceitar que Kiev tivesse, pelo menos até aqui, de ceder grandemente às exigências de Moscovo, faltando apenas saber o que é que Putin ofereceu, se é que ofereceu alguma coisa, para suavizar a derrota tanto de norte-americanos como dos seus aliados europeus na Ucrânia.
Isto, porque se esta não era, (é) a guerra de Trump, foi a guerra dos EUA até agora, porque o conflito não teria durado mais que umas semanas se os EUA não tivessem mergulhado biliões de dólares e um fio contínuo de armas no mar de sangue ucraniano que começou com a invasão russa a 24 de Fevereiro de 2022 mas tem as suas raízes profundas em 2014, com o golpe de Estado financiado e organizado pelos EUA, com apoio europeu, no qual foi deposto o Presidente aliado de Moscovo Viktor Yanukovich.
Recorde-se que foi nessa altura que as regiões do Donbass (Donets e Lugansk) se rebelaram contra Kiev e a Crimeia se desligou da Ucrânia, em clara revolta contra os novos destinos que estavam a ser desenhados na capital para todo o país, que seria o afastamento de Moscovo e uma aproximação estratégica ao ocidente com a integração na NATO e na União Europeia, planos que foram por água-abaixo com as mexidas no xadrez decididas por Putin com a ordem da invasão da Ucrânia.
Desde que chegou à Casa Branca para o seu segundo mandato, a 20 de Janeiro último, Donald Trump mudou o "chip" em Washington, primeiro com o retomar do diálogo, mesmo que incipiente, com a Rússia, que estava com saldo negativo devido a uma aposta de Joe Biden no corte total de relações com o Kremlin assente na ideia de que seria possível derrotar os russos na Ucrânia e forçar uma mudança de regime em Moscovo.
Tal não sucedeu e isso, se já não era claro para os analistas ocidentais, era-o já para muitos analistas independentes e pró-russos, é-o agora, levou a que, quase 4 anos depois, a Ucrânia esteja à beira do colapso, os seus aliados europeus exangues e com evidentes dificuldades em manter o apoio militar e mesmo financeiro, devido a brechas no seio da União Europeia, enquanto em Washington, a nova Administração Trump corre (corria?) o risco de chegar a "velha" sem ter conseguido libertar-se do pântano no leste europeu.
O Presidente norte-americano e os seus estrategas tentarem uma derradeira estratégia para levar Moscovo a ceder, que foi o "bluff" das tarifas de 500%, primeiro, e 100%, depois, sobre os parceiros comerciais mais importantes da Rússia, a China e a Índia, que continuaram a comprar o petróleo e o gás russos em gigantescas quantidades, permitindo não apenas manter a economia russa sem vacilar excessivamente perante enormes sanções e ainda financiar a guerra na Ucrânia sem grandes tremuras no Kremlin.
Pelo menos, como é relevante recordar, Trump tinha feito um ultimato vigoroso a Moscovo dando 50 dias, que depois reduziu para 12, onde, findo este prazo, entrariam em acção as tarifas se Moscovo não cedesse e fosse a correr para a mesa das negociações com Kiev para acabar com a guerra, obtendo apenas concessões mínimas do Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky.
Se a China e a Índia, cedessem ao bluff americano, cortando as importações da energia russa, Moscovo tremeria como o capim fustigado pelo vento sul e isso levaria, mais tarde ou mais cedo, o Kremlin a ceder, pelo menos em grande parte, às reivindicações ocidentais, embora seja difícil perceber até onde a maior potência nuclear do mundo não seria tentada a fazer um "all in" ao bluff norte-americano com a ameaça atómica...
Tal não aconteceu e o que se verificou foi que nem Pequim nem Nova Deli se sujeitaram à pressão norte-americana, que, como muitos analistas já tinham sublinhado, não poderia efectivar as ameaças de sanções secundárias à China e à Índia porque isso levaria a uma entropia na economia global e uma resposta que poderia ser demolidora para os EUA com o corte de minérios estratégicos que só a China possui em quantidades suficientes para as indústrias automóvel, militar e aeroespacial norte-americanas.
Este encontro da próxima sexta-feira, um tête-à-tête Trump-Putin no Alasca, um Estado norte-americano que já foi russo até 1867, ano em que o império russo o vendeu aos EUA por 7.2 milhões USD, e onde ainda é sólida a presença cultural e religiosa russa, e que faz fronteira de facto com a Federação, tem um significado claro: a derrota da Ucrânia.
O que vai constar do acordo entre russos e norte-americanos ao detalhe é difícil que perceber a esta distância, mas os analistas independentes consideram que Washington vai impor a Kiev - o que só é possível devido à absoluta dependência dos EUA para a Ucrânia manter a resistência - não apenas a cedências dos territórios já conquistados no leste ucraniano, como a neutralidade garantida pela desistência cabal de aderir à NATO, e a firme aceitação de que a Ucrânia não terá, no que restar do seu território, quaisquer forças militares ocidentais...
Ora, se este é o desenho possível para o acordo que Trump e Putin terão em cima da mesa quando começarem o seu histórico tête-à-tête no Alasca, sem que se conheça, pelo menos até agora, Domingo, 10, o local preciso, já se sabe que em Kiev Volodymyr Zelensky anunciou com veemência que a Ucrânia não vai aceitar a concessão de quaisquer territórios a Moscovo, o que, se o líder ucraniano mantiver, significará que a guerra vai continuar até que os ucranianos consigam resistir com o apoio único dos aliados europeus.
Tal cenário não está, portanto, descartado, mas uma certeza emerge deste contexto que muda à estonteante velocidade das mudanças de planos anunciados pelo Presidente norte-americano, se em Kiev e nas capitais europeus mais empenhadas na procura de uma derrota russa - Londres, Berlin e Paris -, a opção for manter a guerra, sem a intelligentsia e as armas norte-americanas, os ucranianos estariam condenados a uma derrota sem condições...
Alguns analistas notam mesmo que é essa iminente e inevitável derrota, com ou sem apoio norte-americano, desde que a NATO não entre na guerra em pleno, ou seja, com o envio de forças para o terreno, o que mudaria tudo como um terramoto, que está também a forçar os EUA a impor uma saída negociada a Kiev porque dificilmente os EUA deixariam de aparecer na lista dos derrotados com o colapso ucraniano...
Uma dúvida que permanece é sobre o papel dos aliados europeus de Kiev, sobre se estão, como parece, pelo menos pelas palavras que se conhecem tanto do chanceler alemão Friedrich Merz, como do primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, ou o Presidente francês, Emmanuel Macron, dispostos a dar continuidade ao conflito, e como vai, nesse caso, reagir Donald Trump.
Tanto Zelensky como os líderes europeus estão a apostar na ideia de que não vai ser possível obter a paz no leste europeu, pelo menos uma paz que seja sustentável e duradoura, sem a Ucrânia, o Reino Unido e a União Europeia directamente envolvidos nas negociações onde, ao que tudo indica, nem Putin nem Trump os querem, pelo menos para já.
Uma resposta possível, a mais visível a olho nu e a esta distância, de acordo com vários analistas, a uma decisão pela continuidade da guerra, é que os EUA se retirem totalmente, com as suas armas e a sua gigantesca capacidade de recolha de informação, sejam os satélites nos céus, sejam a rede de células da CIA no terreno, deixando os europeus e os ucranianos com um problema sem solução nas mãos e uma inevitável e rápida derrota em toda a linha face à avassaladora superioridade militar russa, cuja máquina de guerra está a avançar de forma acelerada sobre as posições de Kiev.