Fi-lo intencionalmente para alertar os poderes públicos para a desastrosa condução a que tem sido votado o que considero ser provavelmente um dos nossos maiores desafios políticos: a gestão de cérebros.

Mas, as dores de cabeça provocadas pelas dores nos calcanhares nesta matéria, não são de agora. Vêm de longe. Vêm de um tempo em que, ainda em vésperas da Independência, começamos a alimentar a (falsa) ideia de que, das guerrilhas, chegaria uma fornada de quadros altamente qualificados e à altura de ocupar o vazio criado pelo abandono de Angola dos funcionários portugueses da administração colonial.

Pura ilusão!

Afinal, não estávamos senão perante um grande equívoco e o nosso primeiro grande mito. Um mito que, ao introduzir o nivelamento por baixo, acabou por gerar uma verdadeira "carnificina" na gestão dos poucos recursos qualificados que poderiam assegurar o funcionamento da máquina colonial.

Das matas, afinal, não chegara senão uma insignificativa leva de quadros que, saída de Angola há catorze anos e completamente impreparados, não tinha a mínima noção do que era a administração pública e da pujança económica de um país que nada tinha a ver com a maioria dos países africanos por onde haviam passado durante o exilio.

Não espanta que, por esta razão, Agostinho Neto tivesse tido o cuidado de reunir no topo da pirâmide governativa gente conhecedora da complexa máquina administrativa herdada dos portugueses para lidar com alguns dos mais intrincados dossiers.

Sem surpresa Lopo do Nascimento ocuparia o cargo de primeiro Primeiro-Ministro de Angola independente em detrimento de Saidy Mingas, a escolha preferida dos "maquizards".

Porquê?

Porque, embora tivesse limitações, saído de Angola em 1973, Lopo do Nascimento era um dos raros membros da cúpula do MPLA que detinha conhecimento muito próximo da realidade urbana e do ambiente político e de negócios em que estava envolvido Angola por altura da Independência.

A tentativa de Agostinho Neto fazer prevalecer essa intenção, cedo, porém, se esboroou.

"Descer com as massas para subir com as massas", passou a ser a palavra de ordem dominante como fórmula mágica para acabar com as injustiças sociais.

Não tardou que, nessa senda, passássemos a ter operários analfabetos a dirigir grandes empresas, enfermeiros e motoristas a liderar Ministérios, guerrilheiros a integrar tribunais, escriturários sem nunca terem ouvido falar na Convenção de Genebra, a mandar em embaixadas e até um criador de gado (búfalos) chegou a ser Comissário Provincial...

A capacidade de resistência a essa vaga de populismo, que alastrou a todas as esferas da nossa vida pública, aos poucos foi-se esgotando.

E acabou mesmo por provocar a desmoralização e a desmobilização de muitos dos poucos quadros qualificados formados pela máquina colonial, que passaram a ser vistos com desconfiança pelos novos poderes políticos.

Ao termos nascido tortos nesta matéria com a imposição de critérios populistas e demagógicos inspirados na primazia da cultura revolucionária sobre a competência e o profissionalismo, a honestidade e a seriedade e o rigor e a lisura, nunca mais conseguimos endireitar a coluna...

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