Padecendo do mesmo défice - ausência de uma clara identidade ideológica - essa regeneração deve ser extensiva aos principais partidos da oposição. Porquê?

Porque temos uma oposição que não sendo nem carne nem peixe e andando literalmente aos papéis, até ao momento, ainda não conseguiu apresentar nem um programa, nem uma ideia acerca do que se pode esperar de si em termos de governação.

Temos uma oposição cuja qualidade da generalidade dos seus políticos é francamente má e que, sem ideias novas, vive ansiosa por usufruir das oportunidades geradas pela chegada "da nossa vez"...

Ora, não tendo o país tempo para novas experiências laboratoriais, na base do consenso, advogo uma profunda reforma das instituições públicas e do seu modelo de funcionamento para que deixemos de ter, por um lado, um Estado escurecido a preto e branco pela oposição e, por outro lado, um Estado pintado de cor de rosa por quem governa.

Advogo essa reforma para que, assente num pacto de regime, consigamos claramente definir que tipo de sociedade e de modelo económico melhor serve os interesses dos angolanos.

Advogo essa reforma para decidirmos, de forma inequívoca, se queremos continuar a ser capturados por uma esquerda sectária e esquizofrénica, que dança ao som de um violino com tons "estalinizantes", ou se aspiramos a construir um Estado funcional, aberto e competente, que, através da via conservadora-liberal, promova a equidade, a racionalidade e a justiça social.

Advogo essa reforma para certificarmos se queremos deixar tudo como está, ou se queremos, na verdade, apostar numa reforma pragmática que saiba reconhecer em primeiro lugar que a riqueza é gerada pelas empresas e não pelo Estado.

Uma reforma que saiba reconhecer que as empresas não funcionam para agregar dividendos políticos para os partidos, mas que se regem pelas normas da boa gestão, buscando unicamente a eficiência, a eficácia e o lucro!

Uma reforma que saiba apostar na diminuição dos funcionários do Estado, na redução da sua pesada máquina burocrática, no emagrecimento dos conselhos de administração, na racionalização dos seusrecursos e na imposição do rigor, da ética e da qualidade da despesa pública.

Uma reforma que saiba calibrar o papel fiscalizador do Parlamento sobre as acções do Governo e que saiba pugnar pela eliminação de políticas públicas assistencialista e dos seus efeitos altamente perversos que podendo, numa primeira fase, satisfazer 500 pessoas, por falta de recursos para suportar o vício das doacções, acabará logo a seguir por não satisfazer mais de 5000 pessoas.

Advogo, neste capítulo, a interiorização da velha máxima de Mao Tsé Tung: " não lhes dês o peixe, mas ensina-lhes a pescar"...

Advogo a reforma para acabar com o recurso às comissões, que, como acontece agora com o problema do lixo em Luanda, tendem a reproduzir o estilo de governação de Salazar - recuperado por José Eduardo dos Santos - que, quando não queria que nada funcionasse, gostava de mudar tudo para que tudo continuasse na mesma...

Por isso, defendo uma reforma para investir no aumento das liberdades públicas, na introdução de inovação e na promoção do conhecimento, na protecção da iniciativa privada, no estabelecimento de uma nova relação com as empresas, no fim da opressão da liberdade económica e empresarial, na redução da corrupção, no estrangulamento do clientelismo e, sem perseguir o ensino privado, na priorização da qualidade do ensino público para que "os erros, os efeitos e os vícios" da actual governação não contribuam para a sua auto-destruição.

Defendo essa reforma na esperança de que, por exemplo, ao nível da sua super-estrutura máxima entre os dois Congressos - o Comité Central - o MPLA venha a pôr fim à confusão reinante entre a injecção de quantidade e o apuramento de qualidade.

Defendo essa reforma na perspectiva de que - como sustentava e bem Nene Pizarro há três semanas numa reunião da cúpula do seu partido em Luanda - assumindo o direito de tendências, de uma forma franca e crítica, o MPLA venha a abrir-se ao debate interno para avaliar e discutir, na hora certa, momentos de crise como o que vivemos nos dias de hoje e, que deveriam ter sido de objecto de discussão já na sua última reunião...

Defendo essa reforma partindo do pressuposto de que, em tempo de campanha eleitoral, os chamados "senadores" do MPLA - os antigos e os novos - não voltarão a resguardar-se em casa, denotando a ideia de que, ao fugir aos debates, afinal, não passam de fraudes políticas.

Defendo essa reforma partindo do pressuposto de que os novos quadros promovidos por João Lourenço, pensando pela própria cabeça, sairão finalmente da sua zona de conforto e - sem gritaria ou vagas de bajulação - saberão dar mostras da sua fibra política e lastro intelectual.

Defendo essa reforma com recurso a cidadãos que tenham a hombridade de reconhecer as suas limitações, dizendo NÃO ao Presidente, perante certas nomeações e desafios para as quais NÃO estão habilitados, não se sujeitando, deste modo, ao ridículo e à humilhação a que se submete hoje a Governadora de Luanda ou a de que foi auto-vítima a última Ministra da Educação.

Defendo essa reforma para que haja também um NÃO por parte de figuras como Valter Filipe que, anestesiado à frente do cofre do BNA, quase levou à implosão da instituição, ou um NÃO para que tenhamos a consciência de que as empresas jornalísticas são para ser dirigidas por gestores e NÃO por jornalistas que, NÃO sendo qualificados nesta matéria, estão habilitados apenas para gerir títulos e conteúdos radiofónicos ou televisivos.

Não basta, porém, ambicionar fazer essa reforma. O MPLA tem de derrubar as sequelas do partido único que minam e corroem a acção e a liberdade de pensamento dos seus militantes.

Não basta ambicionar fazer essa reforma se, do lado oposto, a oposição continuar a apresentar-se como mero e folclórico instrumento de alternância em vez de se impôr como uma verdadeira força alternativa de poder.

Não basta ambicionar fazer essa reforma, se não aposentarmos certos cérebros politicamente atrofiados, que - ora enclausurados na solidão e arrogância do poder, ora trancados na oposição desejosos de também sequestrarem o Estado - bloqueiam qualquer tentativa de afirmação e de solidificação das suas instituições.

Não basta ambicionar fazer essa reforma se não mobilizarmos o espírito privado e se, assistindo ao preenchimento do Estado com sobras do MPLA, não forem abandonadas práticas que insistem em convertê-lo numa espécie de Santa Casa da Misericórdia de políticos sem chão os quais, cada um à pala do seu emblema, tende a transformá-lo, de forma silenciosa, numa extensão territorial do seu espaço partidário.

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