Vladimir Putin, apesar do secretismo que envolve todas as suas deslocações para as proximidades da linha da frente, esteve na linha de fogo ucraniano quando, a 20 de Maio, fez uma visita "surpresa" à região de Kursk.

Ainda não se sabe se foi uma coincidência, com os operadores dos drones ucranianos a detectarem, por acaso, a comitiva do chefe do Kremlin que se dirigia de helicóptero a Kursk, e aproveitaram a oportunidade, ou se a intelligentsia ocidental lhes passou essa informação.

Mas o certo é que o helicóptero presidencial viu-se sob ataque dos drones lançados por Kiev, como confirmou o comandante da unidade de Defesa Aérea russa na região, general Yuriy Dashkin, tendo estes sido destruídos pela guarnição de protecção ao Presidente russo.

O ataque ao helicóptero de Putin, confirmado oficialmente, que coincidiu com uma vaga de mais de mil drones ucranianos lançados sobre Moscovo - provavelmente a razão para os media ocidentais não destacarem este episódio.

Esse ataque massivo com drones sobre a capital russa, com o episódio do helicóptero de Putin pelo meio, ocorreu num momento em que Moscovo e Kiev voltaram a falar directamente para preparar um cessar-fogo, em Istambul, Turquia.

E levou, não se sabendo se numa retaliação aos ataques à capital da Federação ou à tentativa de assassinato de Vladimir Putin, a três noites consecutivas dos maiores ataques com misseis e drones russos ao território ucraniano desde o início da invasão russa, em 2022.

Este ataque russo nas três noites anteriores levaram mesmo, devido à sua intensidade, o Presidente norte-americano a criticar fortemente Putin, dizendo que o Presidente russo "ficou completamente louco" ao permitir esta escalada, admitindo que os EUA podem ripostar com novas sanções e até novos fluxos de apoio a Kiev tanto militar como financeiro.

A essas ameaças de Donald Trump, o Kremlin, através do seu porta-voz, Dmitry Peskov, optou por desvalorizar, explicar que se trataram de respostas a ataques prévios dos ucranianos, agradeceu o empenho na procura da paz e disse que tal reacção se deve à "forte pressão emocional" a que o Presidente dos EUA está sujeito por restes dias.

Mas notícias veiculadas pelos media ocidentais, o destaque vai claramente para a vaga violenta de ataques russos contra Kiev e outras dezenas de cidades ucranianas, com fortes acusações dos aliados europeus de uma intenção do Kremlin de fazer desmoronar o processo de negociações de Istambul.

E para não dar destaque aos ataques ucranianos que precederam os russos, os media ocidentais viram-se forçados a não dar a relevância que a possibilidade, mesmo que reduzida, de assassinato de Putin sempre teve, como foi o caso do drone que em Maio de 2023 chegou a entrar no espaço do Kremlin, tendo sido abatido in extremis já no seu interior.

Até porque a exposição do helicóptero do Presidente russo mostra uma fragilidade na segurança mais apertada a Vladimir Putin que cria fortes constrangimentos no Kremlin, especialmente no que diz respeito à sempre muito apertada vigilância sobre tudo o que envolve o líder russo.

A vaga de misseis e drones russos sobre a Ucrânia precedeu uma escalada europeia no apoio a Kiev, que, depois da aprovação de novas sanções a Moscovo, a Alemanha eliminou todas as restrições a KIev no uso dos seus misseis de longo alcance, os Taurus, para ataques dentro do território russo.

A Alemanha era o único país com este tipo de misseis, depois de a França e o Reino Unido terem feito o mesmo com os seus Scalp-EG e o Storm Shadow, a não permitir o uso aberto do seu Taurus, todos misseis de cruzeiro com alcances de mais de 500 kms, e que a Rússia considera serem a confirmação definitiva da co-beligerância europeia nesta guerra.

Isto, porque como ficou claro por notícias veiculadas em 2024, envolvendo generais alemães, o uso deste tipo de projecteis só é possível com a envolvência de técnicos da NATO devido à sua sofisticação e complexidade bem como a necessidade do uso de dados obtidos por satélite, que a Ucrânia não possui, para a definição dos alvos a atingir em solo russo.

E foi por isso que o Kremlin voltou agora, depois do anúncio feito pelo chanceler alemão, Friedrich Merz, a avisar que esta decisão de Berlin "é uma má opção" porque, além de ser "arriscada", contraria os esforços de Moscovo para conseguir uma resolução pacífica do conflito.

Dmitry Peskov, o porta-voz do Kremlin, disse, citado pela TASS, afirmou que essa decisão da Alemanha "vai totalmente contra as aspirações a uma resolução pacífica do conflito", acrescentando que é ainda "uma opção muito perigosa... se tiver mesmo sido feita".

E tudo indica que sim, porque foi o próprio chanceler Merz que Kiev "já não tem quaisquer restrições ao uso dos misseis de longo alcance franceses, britânicos, norte-americanos ou alemães".

Peskov já disse em diversas ocasiões, sempre que um dos países ocidentais era acrescentado à lista dos fornecedores deste tipo de arma a Kiev, que isso faz destes membros da NATO "participantes directos" na guerra porque o seu uso só é possível com dados obtidos pelos satélites daquela organização militar transatlântica,

Como recorda a russa RT, o Presidente Putin alterou a doutrina nuclear da Federação para permitir o uso do arsenal nuclear de Moscovo em determinadas situações de ataques por um ou mais países da NATO com armas convencionais mas com uma retaguarda nuclear.

Apesar da doutrina nuclear russa ter sido alterada, e depois de centenas de ataques com este tipo de armas sobre alvos na profundidade do território russo, o Kremlin manteve o dedo longe do botão vermelho embora tenha realizado exercícios com os seus sistemas móveis com ogivas nucleares.

Todavia, há uma diferença entre os Storm Shadow/Scalp EG e os Taurus alemães, que, além destes serem mais sofisticados e terem um alcance superior, mais cerca de 200 kms que o sistema franco-britânico, possuem características que lhe permitem perfurar sistemas de bunkers com larga espessura de betão armado, o que é uma ameaça poderosa, por exemplo, à ponte de Kerch (Crimeia).

Esta escalada ocorre quando Moscovo e Kiev estão em fase, como ficou definido em Istambul, há cerca de um mês, de preparação de propostas de memorando com as etapas das conversações que deverão levar a um cessar-fogo e, idealmente, a um acordo de paz.

Entretanto, numa notícia alarmante, a agência Reuters vem agora contextualizar esta escalada alemã no pressuposto de que Berlim se está a preparar para uma guerra com a Rússia, o que condiz com a postura de falcão de guerra de Merz quando comparado com o anterior chanceler Olaf Scholz.

Durante a sua campanha para as eleições alemãs, Merz sempre defendeu uma postura mais agressiva para com a Rússia, como o demonstra a entrega agora dos sofisticados misseis Taurus que Scholz nunca aceitou por considerar que era uma escalada demasiado arriscada.

E estes misseis alemães representam, efectivamente, segundo vários analistas, um sério risco de escalada porque a Rússia só não tem ainda contramedidas como desenvolveu para os outros, incluindo os ATACAMS norte-americanos

Segundo a Reuters, as forças armadas alemãs estão a cumprir um plano apressado de armazenamento de armas até 2029, ano em que os analistas militares da Bundeswer crêem que haverá uma guerra de larga escala entre russos e a NATO.

Num documento a que a Reuters acedeu, uma directiva produzida pelos chefes militares alemães, a prioridade é o apetrechamento dos sistemas de defesa aérea, tanto para os misseis russos conhecidos, como para os seus drones cada vez mais sofisticados, além de criar projecteis capazes de atingir alos em solo russos com um alcance muito mais largo que os 500 kms dos Taurus e a guerra electrónica 2.0, que dizem estar a Alemanha muito atrás de outros países.

Em anteriores reacções a esta escalada ocidental, o Kremlin avisou que se vir provada a ameaça oriunda dos países europeus da NATO, não hesitará em usar os seus igualmente novo misseis balísticos hipersónicos Oreshnik para anular essas ameaças, independentemente de onde se localizem no espaço da Europa ocidental.