Hoje, 02 de Fevereiro, quatro dias passados sobre o ataque à base norte-americana na Jordânia, onde morreram três "marines" e 34 ficaram feridos, sem que a prometida vingança de Washington contra o Irão tenha acontecido, os mercados aliviaram a tensão e o petróleo voltou a enterrar-se na fasquia dos 70 USD.

E nem a insistência da OPEP+, a organização que desde 2017 junta os Países Exportadores (OPEP) e a Rússia à frente de um grupo de nove produtores/exportadores independentes, para manter os mercados equilibrados, na continuidade dos cortes à produção superiores a 3,6 milhões de barris por dia (mbpd) parece ajudar a matéria-prima a descolar do porto de abrigo que parece ser a fasquia dos 70 USD.

Porém, como notam vários analistas, esta sensação de segurança pode esfumar-se rapidamente se o Médio Oriente entrar em ebulição com novos ataques dos rebeldes Houthis, do Iémen, aos navios que procuram o Canal do Suez, ou com o esperado ataque dos EUA a interesses do Irão como vingança pelo ataque à sua base, Torre 22, na Jordânia, protagonizado pela Resistência Islâmica, um grupo radicado no Iraque mas que é apoiado por Teerão.

Para já, o que mais sobressai neste intrincado jogo do gato e do rato no Médio Oriente, que reemergiu após 07 de Outubro, quando o Hamas protagonizou um ousado e mortífero ataque ao sul de Israel, e sobre o qual Telavive justificou a resposta sobre Gaza que já tirou a vida a 27 mil civis, dentre estes 12 mil crianças e 8 mil mulheres, é que o as grandes economias globais querem o barril barato para lidar com as suas crises económicas internas e nem o risco de uma guerra descontrolado nesta região que responde por 35% do crude consumido no mundo parece conseguir furar essa vontade.

Com o barril de Brent a valer, perto das 14:20, hora de Luanda, desta sexta-feira, 02, 78,42 USD, uma descida de 0,34% face ao fecho de quinta-feira, deixando a ênfase nos mais de seis dólares que perdeu em apenas quatro dias, fica cada vez mais longe a fasquia dos 100 USD que as grandes casas financeiras, como a JPMorgan e a Goldman Sachs, previam que a medida alcançaria no 1º trimestre de 2024.

Para as petroeconomias, como ainda é a angolana, a esperança de um barril a aproximar-se dos 100 USD reside agora, não só na evolução da situação militar no Médio Oriente, mas também na reunião de Março da OPEP+, organização que Angola abandonou recentemente, onde Rússia e Arábia Saudita poderão avançar para cortes mais volumosos na produção do "cartel".

Todavia, esta organização, apesar de responder por mais de 45% do crude diariamente extraído em todo o mundo, tem cada vez influência na variância dos mercados porque os países "independentes", como a Guiana ou o Brasil estão a conseguir, ao contrário de Angola, subir de forma substantiva a produção, podendo, só estes dois outsiders colocar em breve mais 6 milhões de barris por dia nos mercados, se as perspectivas dos analistas estiverem certas.

Actualmente a produção global ronda os 102 mbpd para uma procura que oscila em torno dos 103 mbpd, mas que é uma cifra artificial devido aos cortes da OPEP+ e às injecções de reservas norte-americanas para diluir o efeito da estratégia do cartel liderado por russos e sauditas.

Com este cenário em pano de fundo, a semana vai terminar com uma perda de 5% nos mercados, sendo um dos decapantes dos recentes ganhos um possível acordo para breve entre Israel e o Hamas, sobre o conflito na Faixa de Gaza, que é a fogueira-mãe de todas as faíscas que estão a espalhar-se pelo Médio Oriente, incluindo o escaldante braço-de-ferro entre Washington e Teerão.

Para Angola, as contas...

Para Angola, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, ter o Brent nos 78 USD permite, embora não seja o antidoto definitivo, diluir alguns dos efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista, até porque o país enfrenta também o problema da persistente redução da produção diária.

Com OGE 2024 elaborado com um valor de referência médio para o barril de 65 USD, estes valores actuais permitem um relativo optimismo, mas aumentar a produção é o factor-chave, o que ficou mais fácil depois de Angola ter, em Dezembro passado, anunciado a saída de membro da OPEP, o que deixa um eventual acréscimo da produção fora dos limites impostos pelo cartel aos seus membros como forma de manter os mercados equilibrados entre oferta e procura.

O crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.

O Presidente da República, João Lourenço, deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,12 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.

O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.

Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.

Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.

A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.