Foi em Davos, na Suíça, onde, via teleconferência, o Presidente norte-americano se dirigiu aos mais ricos do mundo, no Fórum Económico Mundial, para conseguir dois objectivos: mostrar que tudo o que o seu antecessor, Joe Biden, fez ao longo de quatro anos é para desmantelar e que os EUA estão em acelerada retoma das relações "normais" com a Federação Russa.

Isto, apresentado com o mesmo tom que o caracteriza, de quem não está a apresentar ideias à audiência, mas antes a dizer ao mundo como vai ser daqui em diante, seja na economia, no ambiente, na segurança, na abordagem às guerras na Ucrânia e no Médio Oriente... chamando-lhe uma "revolução do senso comum" que agora está a começar.

Dessa revolução, durante a qual não ficara de pé uma única medida tomada pela anterior Administração democrata, faz parte a extinção de todos os limites legais à exploração e extracção de combustíveis fósseis nos EUA por razões ambientais, o que deverá ter um poderoso impacto nos mercados internacionais do petróleo e gás, o que afectará, em breve, as exportações angolanas.

Isto, porque Trump quer baixar os preços dos combustíveis porque é esse o caminho mais curto para reduzir a inflação, que é um dos cavalos de batalha da sua Administração e foi, ao longo dos últimos anos o combustível para o combate político entre republicanos e democratas nos EUA durante o reinado de Joe Biden.

E disse isso mesmo no discurso proferido no Fórum de Davos, apontando como desígnio maior "reunir todos os meios e ferramentas disponíveis para atacar e derrotar a inflação e reduzir o custo de vida dos americanos", acrescentando que, pelo caminho, vai garantir "o maior corte de impostos na história dos EUA".

Não é novidade que o foco principal de Trump, como o foi na sua primeira passagem pela Casa Branca, entre 2017 e 2021, é a política doméstica e que os problemas externos são abordados ainda nessa perspectiva, de ajudar a resolver problemas internos, como é o caso da guerra na Ucrânia, que ele vê como uma pedra no caminho das suas políticas caseiras pelo impacto que tem, seja nos gastos com o apoio a Kiev, seja no aumento do preço do crude via sanções aplicadas à Rússia...

E é por isso que, como notam alguns analistas, o Presidente norte-americano tem vindo a redireccionar a abordagem ao tema, apontando para uma solução mais abrangente que envolva os tratados de segurança global, como é o caso do controlo da expansão dos arsenais nucleares e da segurança euroasiática, como, de resto, o chefe do Kremlin tem dito que quer abordar com o seu homólogo em Washington.

Para isso, não apenas voltou a frisar a urgência de um encontro com Vladimir Putin, como disse ao mundo que o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, está "pronto para um acordo", voltando a defender que "é tempo de acabar com o campo de morte" em que se transformou o conflito no leste europeu, apelando ainda à China e o Presidente Xi Jinping, para ajudar nesse esforço porque ele tem "muita influência sobre esse processo", e que quer igualmente ver envolvido na discussão sobre redução dos arsenais nucleares.

"Vamos tentar desnuclearizar o planeta porque isso seria uma coisa maravilhosa para a Humanidade e acho que vamos conseguir fazê-lo", disse Trump, numa versão de pacifista que também não constitui uma novidade porque já no primeiro mandato apostou em retirar os EUA das suas guerras além-fronteiras e ameaçou mesmo sair da NATO.

Numa demonstração de que o seu foco está intramuros, naquilo que pode ser um aviso à navegação para todos aqueles que esperavam grandes investimentos norte-americanos nos seus países, como é o caso de Angola, o que Trump quer é ver o investimento externo chegar aos EUA por troca das "mais baixas taxas entre todas as Nações do mundo".

E quem não quiser aceitar esta proposta, é simples, avisou: "Quem quiser exportar para os Estados Unidos os seus produtos que poderiam ser produzidos localmente, terão pela frente tarifas de milhões para pagar para poderem entra no mercado norte-americano".

Com esta lista vasta de compromissos para galvanizar a economia nacional, Trump, como já advertiram vários economistas, pode estar a criar um problema gigantesco para si mesmo, porque ao impor tarifas robustas sobre as importações e ao mesmo tempo expulsar milhões de imigrantes, a inflação terá tudo para crescer, obrigando a Reserva Federal a ter de agir de novo para baixar a inflação aumentando as taxas de juro que vão levar a um encolhimento da economia, num ciclo pouco ou nada virtuoso.

Mas se tal vier a suceder, então ainda mais o Presidente Trump se virará para as questões internas, passando os problemas externos ainda mais para baixo na hierarquia das suas prioridades, o que vai, é quase certo, defraudar expectativas em toda a abrangência da rosa-dos-ventos mas especialmente onde os EUA estão embrenhados com os seus milhões, sendo disso exemplo a Ucrânia e, eventualmente, o gigantesco investimento no Corredor do Lobito, uma aposta da anterior Administração...