A ideia do congelamento da guerra e o envio de uma força de estabilização europeia para a actual frente de batalha tem sido atribuída a Keith Kellogg, o enviado especial do Presidente norte-americano, Donald Trump, para o conflito no leste europeu, mas conta com a oposição firme do Kremlin.

Os primeiros avisos vieram do ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, no início de Dezembro, quando a ideia ganhou maior tracção entre os media ocidentais, tendo este avisado que essa "fantasia" apenas faz com que a situação se deteriore.

"Acredito que essas fantasias apenas fazem a situação ficar pior e mostram que as pessoas que espalham estas ideias, teimosamente preferem não ouvir as advertências claras do Presidente Putin", apontava Lavrov a 04 de Dezembro.

Mas já a antes, em Julho do ano passado, Vladimir Putin tinha chamado a atenção para a irresponsabilidade que era estar a colocar essa possibilidade em cima da mesa porque não há qualquer aderência a ela por parte de Moscovo que, não apenas a rejeita, como estava, tal como hoje, a ganhar a guerra na frente de batalha.

A esta possibilidade, que, curiosamente, parece agradar ao Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, porque, segundo os planos conhecidos do "pacote" Kellogg, além de congelar a situação militar no terreno, propõe ainda o envio de forças ocidentais para estabilizar a situação na frente e põe em stand by, por uma a duas décadas, a entrada do país na NATO.

E foi perante este cenário em desenvolvimento nos media ocidentais que Zelensky vem alterando a sua postura face a eventuais conversações com o Presidente russo, tendo mesmo feito saber recentemente que o decreto que aprovou em 2022, proibindo negociações com os russos, afinal não o inibe a ele de o fazer, apenas às restantes dimensões do Estado ucraniano.

Tal cenário seria aceitável para Zelensky na medida em que teria de, no mínimo, contar com 200 mil soldados dos países europeus aliados, porque só assim seria possível garantir que "os russos não voltam a atacar".

Porém , na perspectiva de Moscovo, todo este cenário é apenas fruto das "fantasias" ocidentais, porque "em modo ou tempo nenhum tal possibilidade foi ou será aceitável" para a Federação Russa, voltou a avisar o Ministério dos Negócios Estrangeiros.

A nova recusa agressiva de Moscovo veio agora pela voz de Rodion Miroshnik, um diplomata de topo que está actualmente encarregado de investigar os crimes de guerra de Kiev - curiosamente quando os media voltam a mostrar imagens aterradoras de militares ucranianos prisioneiros a serem abatidos por russos a sangue frio -, que avisa que quaisquer forças ocidentais colocadas na Ucrânia serão "alvos legítimos" para as forças russas.

Isto, depois de o comandante do comité militar da União Europeia, Robert Brieger, ter vindo dizer, numa entrevista a um jornal alemão, que o conflito na Ucrânia pode ser terminado com um cessar-fogo e com o envio de uma força de manutenção de paz internacional sob mandato da ONU.

A demonstração de disponibilidade por parte de Zelensky para negociar uma saída para o conflito com Putin está claramente ligada à chegada de Donald Trump ao poder e da sua demonstração de vontade para se encontrar com Putin para chegar a um entendimento que ponha fim à Guerra sem a presença do líder ucraniano.

No entanto, Trump, que apenas se refere a Zelensky para dizer que "ele quer um acordo", tem mostrado não estar disponível para ouvir Kiev, assinou um decreto presidencial onde corta toda a ajuda externa para investigação e análise das situações, exceptuando apenas, segundo a Reuters, Israel e o Egipto.

Embora existam dúvidas e não seja claro se a ajuda para Kiev também está dentro das excepções - a Reuters garante que viu uma nota interna da Casa Branca que demonstra que não está -, Donald Trump parece ter apenas disposição para ouvir Putin, o que deixa Zelensky em muito maus lençóis.

Isto, porque sem o apoio dos EUA, militar e financeiro, o Estado ucraniano colapsa em semanas, visto que, segundo vários analistas, que o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban corrobora, Kiev não tem sequer forma de pagar os salários aos funcionários públicos e as pensões aos seus reformados.

Além da tentativa de forçar uma presença nas conversas entre Trump e Putin, Zelensky quer igualmente conseguir congelar o conflito nas actuais configurações geográficas porque a Rússia está, dia após dia, a avançar quilómetros em novos territórios ucranianos.

Prova disso mesmo é que, nos últimos três dias somou às suas conquistas localidades estratégicas relevantes, como Velika Novossilka, após uma semana de intensos combates, e está muito perto, como sublinha a BBC, de chegar a Pokrovsk, uma das últimas cidades importantes por conquistar na região de Donetsk.

Com a maioria dos analistas a admitirem os avanços russos e a clara redução da capacidade de resistência ucraniana, embora com empenhados e eficazes ataques no interior da profundidade russa com enxames de drones e misseis de longo alcance ocidentais, alguns com grande sucesso, para Zelensky, contar com o apoio de Donald Trump num plano de congelamento do conflito sob garantia de forças ocidentais no terreno, seria, nas actuais condições, uma tábua de salvação que não pode enjeitar.

Recorde-se que Moscovo ainda não tirou uma vírgula às suas condições para travar as hostilidades: a saída das forças ucranianas e o reconhecimento oficial e sob garantias sólidas das quatro regiões anexadas em 2022, além da Crimeia, a garantia constitucional de neutralidade, mantendo-se fora da NATO, sem condições nem limites temporais, e o respeito pela cultura, língua e religião russas no que restar da Ucrânia.