O antigo homem forte do Serviço de Inteligência e Segurança Militar (SISM) está em prisão domiciliária desde Junho.
Já o general, alegou, perante o colectivo de juízes, que não desrespeitou o Presidente João Lourenço, e que lhe estão a imputar crimes que não cometeu.
"O primeiro magistrado desta Nação quem é? É o senhor Presidente da República, camarada João Lourenço. Se ele falhou não me imputem a falha dele", afirmou, numa referência à sua recusa em aceitar que deveria entregado os documentos militares, onde se incluem os referentes à batalha do Cuíto Cuanavale, ao seu substituto, o general Miala, após ter sido exonerado, sem que antes houvesse uma reunião entre João Lourenço e José Eduardo dos Santos.
"Hoje estou a ser condenado por ter descoberto a vitória sobre a Batalha do Cuíto Cuanavale, essa vitória é minha, e aqui foi dito que eu tenho fidelidade canina para com o ex-presidente José Eduardo dos Santos, mas a ligação que tenho com o ex-Presidente Eduardo dos Santos, também a tive com Agostinho Neto", afirmou.
"O senhor digníssimo magistrado do Ministério Público (MP) não sabe, mas eu, quando comecei a trabalhar com o camarada Agostinho Neto, era capitão, isso em 1978, substituindo um grande comandante da guerrilha", disse.
"O Presidente João Lourenço é novo, mas nunca o desrespeitei, se eu o tivesse desrespeitado, como se diz aqui, eu não me teria encontrado com Miala. O Miala nunca vai ser, em circunstância nenhuma, meu chefe", esclareceu, salientando que está há mais de dois anos sem ver o general Miala.
"A última vez que vi o senhor Miala foi no óbito do irmão mais velho do camarada Eduardo dos Santos. Eu passei por ele, ele bem tentou ver se falava comigo, mas eu passei por ele, a minha relação com o Miala não é relação que efectivamente me permitisse encontrar-me com ele uma ou duas horas", declarou.
Durante o seu depoimento, o réu afirmou que não só teve "lealdade canina" com José Eduardo dos Santos, como também muito respeito ao ex-Presidente.
"Porque que o senhor Miala não está aqui, porque que a senhora Patrícia não está aqui, se foram eles que se serviram de intermediários, houve dolo neste processo. Eu estive durante 16 anos a chefiar o Serviço de Inteligência de Segurança Militar, será que só produzi informação sobre a Batalha do Cuíto Cuanavale? A minha actividade como chefe da Segurança da Inteligência Militar não se circunscreveu a ir buscar documentos à África do Sul... E repito, foi o meu engenho, a minha arte e a minha vivência que me permitiram ir buscar estes documentos. Estes documentos não foram pesquisados por elementos do SISM, são a minha conquista pessoal", revelou.
O advogado do general Zé Maria, Sérgio Raimundo, pediu ao tribunal para anular o processo contra o seu constituinte porque, segundo a defesa, "as acusações são falsas".
"O tribunal recebeu a acusação sem receber o contraditório, o tribunal não pode levar em consideração este processo. Todo esse processo deve ser declarado nulo e arquivado porque não tem fundamentos para incriminar o meu constituinte", apelou, salientando que os fundamentos apresentados pelo Ministério Público não correspondem à verdade.
O caso tem estado a ser julgado no Supremo Tribunal Militar, no interior das instalações do Comando do Estado-maior do Exército, e os factos remontam a Novembro de 2017, quando o réu foi informado pelo ministro da Defesa que seria exonerado das suas funções e que posteriormente passaria à reforma.
"Na reunião do Conselho de Segurança Nacional realizada no dia 20 de Novembro de 2017, foi decidida a referida exoneração e a indicação do substituto do mesmo. Uma vez exonerado, devia ocorrer um acto formal de passagem de pasta, do anterior chefe para o substituto", disse o representante do Ministério Público, revelando que sem que este acto ocorresse, o general Zé Maria ordenou ao coronel Eurico Manuel, então chefe dos transportes do Serviço de Inteligência e Segurança Militar, que fosse ao seu gabinete e retirasse documentos e os guardasse em local por ele indicado".
"Entre os documentos retirados do gabinete do general pelo seu subordinado constam documentos classificados como sendo de caractér militar, onde se incluem também os referentes à batalha do Cuíto Cuanavale", explicou, no início do julgamento, o Ministério Público.
Segundo a acusação, os documentos referentes à batalha do Cuíto Cuanavale "foram obtidos de forma onerosa, conforme atestam as folhas 106 e 140 dos autos, num valor acima de mais de dois milhões de dólares norte-americanos, e cujo receptor foi o cidadão luso-sul africano-moçambicano, Manuel Vicente da Cruz Gaspar", continuou.
Estão arrolados como testemunhas no processo-crime contra o general Zé Maria os jornalistas da TPA Ernesto Bartolomeu, Isidro Sanhanga e Mário Vaz, pelo facto de os mesmos terem apresentado documentários e programas que reportavam factos sobre a batalha do Cuíto Cuanavale.
Estão de igual modo arrolados no processo como declarantes os deputados Higino Carneiro e Monteiro Leal Ngongo e o ex-presidente da República de Angola, José Eduardo dos Santos.
Fazem parte do colectivo de juízes o conselheiro presidente do Supremo Tribunal Militar, general António dos Santos Neto, e os adjuntos tenente general Carlos Vicente e Fernando Tavira, juízes conselheiros.