Para este especialista, o serviço da dívida, de 13,0 biliões de kwanzas, deverá absorver o equivalente a 65,5% das Receitas Próprias do Estado e representar mais de 42% dos pagamentos totais do Estado no ano de 2025, ou seja, "depois de em 2024 ter absorvido 107% das receitas próprias do Estado e ter representado 58% dos pagamentos totais, esses níveis representarão uma melhoria, mas ainda assim insuficiente para o alívio desejável da pressão sobre a tesouraria e para a abertura do espaço fiscal requerido para despesas prioritárias". Em face disso, segundo Neto Costa, "é de antecipar que as dificuldades enfrentadas em 2024, com o pagamento das remunerações dos efectivos da função pública e em honrar oportunamente as ordens de saque emitidas para o pagamento do fornecimento de bens e serviços se mantenham".

Asfixia com o serviço da dívida mantém-se

O economista considera que "não é de se esperar que, com o actual curso das finanças públicas e, sobretudo, do endividamento, o problema da asfixia que o serviço da dívida representa para o Tesouro Nacional seja resolvido a médio prazo", o que o leva a defender a urgência na implementação de um programa de estabilização macroeconómica e de ajustamento estrutural, que contemple a restruturação da dívida de modo a que o mais rápido possível se reduza o serviço da dívida para não mais de 20% dos pagamentos anuais do Tesouro Nacional, libertando-se assim espaço fiscal para as despesas prioritárias.

A ministra das Finanças referiu que "a estabilidade e o crescimento sustentado de Angola dependem de uma gestão prudente, equilibrada e transparente da dívida pública", tendo reiterado isso como compromisso. O economista adverte que o que será determinante para esse efeito "é a racionalização dos recursos públicos, traduzida na sua aplicação eficiente em acções (programas, projectos e actividades) prioritárias que asseguram a resolução dos problemas existentes, tendo como objectivo a melhoria contínua do bem-estar dos cidadãos", afirmando que "esse não parece ser o caso, uma vez que, por exemplo, dos 49% dos desembolsos internos previstos captar com a emissão de Obrigações do Tesouro, avaliados em 3,7 biliões de kwanzas, 9% (320 mil milhões de kwanzas) vão ser destinados à capitalizações e 10% (383 mil milhões de kwanzas) para a regularização de atrasados".

E acrescenta: "O montante das "capitalizações", como se pode adivinhar, destina-se, fundamentalmente a manter "vivas" empresas públicas que não realizam os objectivos para os quais foram constituídas, actuando antes como fontes de renda para alguns dos seus gestores e responsáveis das instituições tutelares via "negócio consigo próprios"; e "enterrar" recursos em instituições financeiras públicas (bancos e fundos), em nome da suposta promoção e fomento da actividade económica privada, que mais não é do que um atalho para contornar um problema transversal a todo o investimento produtivo e de médio e longo prazo: o seu elevado risco".

E esse elevado risco, segundo Neto Costa, decorre da instabilidade macroeconómica e de factores estruturais subjacentes a um quadro político-institucional que mina a confiança dos investidores e a eficácia das políticas públicas. De todo o modo, defende, "tem-se incorrido em atrasados internos de forma significativa, o que é consequência da desorçamentação e da inscrição de desembolsos de financiamentos de difícil captação, como é o caso do presente PAE 2025 no que se refere ao financiamento externo", o que "põe em causa" a pretendida gestão prudente, equilibrada e transparente da dívida pública.

Executivo "não respeita limites aprovados" pela Assembleia Nacional em sede dos OGE

O economista refere, a propósito da prudência, equilíbrio e transparência da gestão da dívida, o facto de, "persistentemente, os limites aprovados pela Assembleia Nacional, em sede dos OGE, para o aumento do endividamento governamental, não serem respeitados pelo Executivo".

"Assim é que, em 2022 foi aprovado um aumento máximo de 351 mil milhões de kwanzas, mas registou-se quase 1,2 biliões de kwanzas; em 2023 foi aprovado uma redução de 800 milhões, mas verificou-se um aumento de 1,3 biliões; e em 2024 o limite máximo fixado para o aumento líquido da dívida governamental foi de 281 mil milhões, mas ela aumentou 1,2 biliões.

Neto Costa levanta questões de coerência de algumas asserções do PAE 2025: "Tal é o caso de se referir como um pilar a promoção da redução dos títulos indexados à taxa de câmbio, mas prever-se emissão de Obrigações do Tesouro em Moeda Estrangeira (OT-ME) no montante de 358 mil milhões de kwanzas".

E aponta: "no exercício de 2024 realizaram-se pelo menos duas emissões de OT-ME para levantar inclusive liquidez em moeda nacional. De igual modo, a limitação da concessão de garantias públicas está referida como um dos mecanismos de gestão dos risco do PAE 2025, mas o limite foi elevado de 330 mil milhões de kwanzas (OGE 2024) para 1,4 biliões de kwanzas (OGE 2025).

Disparidade entre o PAE e o OGE2025

O especialista alude ainda a uma discrepância entre o PAE e o OGE2025: "Os dados do PAE 2025 mostram desembolsos de 14,6 biliões de kwanzas e Amortizações de 8,5 biliões. O OGE 2025, entretanto, apresenta desembolsos de igual montante, mas amortizações de 12.4 biliões de kwanzas".

Segundo Neto Costa, a diferença entre as amortizações do OGE 2025 e do PAE 2025 é de 3,8 biliões de kwanzas, valor que se aproxima dos 3,7 biliões identificados no PAE 2025 como sendo de desembolsos por adiantamento de receita orçamental (ARO). "As operações de adiantamento de receitas são operações financeiras cujos desembolsos e as amortizações correspondentes devem ocorrer no mesmo exercício - constituindo, por isso, dívida flutuante -, de tal modo que tais desembolsos financiam défice de tesouraria e não défice orçamental, pelo que os seus fluxos não devem figurar no OGE. No PAE 2025, entretanto, não deveriam figurar apenas os desembolsos ARO mas também as amortizações correspondentes, mas identificadas como operações financeiras sem impacto orçamental (excepto para os juros a incorrer).

E explica: "Dos dados do PAE 2025 se deduz que os fluxos do OGE 2025 estão empolados em cerca de 3,8 biliões de kwanzas, tanto nos recebimentos como nos pagamentos e que dizem respeito aos desembolsos e amortizações, respectivamente". "Os fluxos do OGE 2025 calculam-se assim em cerca de 30,77 biliões de kwanzas - e não os cerca de 34,6 biliões que nele figuram - o que corresponde a um aumento de 25% em relação do OGE 2024 e próximo do mesmo nível executado em 2024".

Por isso é que "nessa circunstância, o serviço da dívida é de 13,0 biliões e não de 16,8 biliões e deverá absorver cerca de 65,5% das receitas próprias do Estado (e não 85%) e o seu peso nos pagamentos totais do ano serão de 42% (e não 49%)", explica.

Para as operações relevantes para o OGE, o PAE 2025 prevê um Endividamento Bruto (Desembolsos) de cerca de 10,9 biliões (exclui os Desembolsos para a tesouraria) e Amortizações de 8,5 biliões, o que, para Neto Costa, representa um aumento da dívida do Governo de 2,3 biliões, equivalentes a 2,6% do PIB.

"Com isso, a dívida do Governo no final do ano de 2025 deverá ser de 57,4 biliões, da qual cerca de 26% será interna e 74% externa", defende.

Nível de execução dos Desembolsos Internos "tem estado sistematicamente" acima dos 100% nos últimos três anos

Os montantes dos Desembolsos Internos (3,8 biliões, 34%) e Externos (7 biliões, 66%), correspondem a uma redução de 50% e a um aumento de 71%, respectivamente, em relação aos níveis de execução projectados de 2024, e, para Neto Costa, é de notar o facto do nível de execução dos Desembolsos Internos ter estado sistematicamente acima dos 100% nos últimos três anos entre 2022 e 2024 (com 113, 380 e 192%, respectivamente), e o dos Desembolsos Externos sistematicamente abaixo dos 100% (com 76, 86 e 67%, respectivamente).

"No seu Relatório sobre as Perspectivas Económicas de 2024 da África Sub-sahariana, o Fundo Monetário Internacional (FMI) considerou que as vulnerabilidades da dívida da sub-região eram elevadas, o que exigia uma acção política determinada em face dos compromissos difíceis, assim como relevou que o aperto de financiamento não tinha terminado pelo facto das taxas de juro se manterem elevadas e a rolagem da dívida constituir um desafio" lembra o economista, acrescentando, que "no relatório equivalente reportado a 2025, o FMI adianta que as condições de financiamento, tanto internas, quanto externas, mantêm-se apertadas, com muitos países incapazes de aceder ou pagar financiamentos. Deste modo, enquanto o montante dos Desembolsos Internos previstos no PAE 2025 se mostram subavaliados, o dos Desembolsos Externos parecem sobreavaliados. Então é de se esperar que venha acontecer o que ocorreu em 2024, quando o OGE previu um peso do financiamento interno de 38% e externo de 62%, mas a execução revelou financiamento interno de 64% e externo de 36%.