Logo às primeiras horas do dia, Fátima, de 10 anos, e o irmão, Desejo, de oito, caminham pelas ruas da Centralidade do Kilamba, em Luanda. Ela carrega consigo uma sacola plástica de cor preta para colocar o que conseguir "angariar" do contentor de lixo e de moradores, para levar para casa e compartilhar com mais cinco pessoas. É a segunda de quatro irmãos. Os seus pais não trabalham. "Bita Tanque" é o bairro onde a pequena Fátima e a família residem, uma localidade "despida" de energia eléctrica, de água potável, de jardins, onde as casas são, na maioria, casebres, realidade que contrasta com a vizinha Centralidade do Kilamba - cidade nova, com prédios, escolas, hospitais, água e energia eléctrica.

"Viemos aqui porque temos fome e estamos à procura de comida", revela Fátima à nossa reportagem. Nesse dia, teve a sorte de, logo pela manhã, receber um pedaço de pão de uma moradora.

Por falta de condições financeiras dos pais, Fátima e Desejo estão entre milhares de crianças angolanas fora do sistema de ensino e que dependem de doações para sobreviver. Desde Abril, os dois irmãos percorrem, diariamente, pelos mais de 100 prédios, à procura de comida.

Para além de se verificar nas ruas da cidade de Luanda, nas portas de restaurantes, de supermercados e nas bombas de combustíveis, o fenómeno ganha "força" nas novas centralidades.

No Sequele, por exemplo, encontrámos o adolescente José, de 13 anos, que, em troca de um prato de comida, deita o lixo produzido por alguns apartamentos. Diariamente, chega às 7 horas e só regressa quando o sol se "despede" do dia. José conta que chega a arrecadar, por dia, mil kwanzas, valor este que costuma a canalizar para a compra de alimentos para casa, onde vive com a mãe e seis irmãos. Frequentaria a 5.ª classe, se a sombra da escola não fosse substituída por horas debaixo do sol, realidade que o coloca muito distante do seu sonho de ser bombeiro. Órfão de pai, José, que também é engraxador, faz biscates e revela que a mãe se dedica a apanhar plásticos para revender.

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