O Banco Central do Zimbabué introduziu, numa operação arriscada e sob forte polémica, na sua economia, notas de baixo valor nominal, denominadas no jargão economês "bond notes", como forma de resolver a extrema escassez de divisas no país, com destaque para o dólar norte-americano, que, desde finais de 2009, era a moeda corrente no país em substituição do extinto dólar zimbabueano, cujo valor era já mera ficção.

Para corrigir a escassez de "cash" na economia zimbabueana, o Banco Central do Zimbabué (BCZ) introduziu as novas notas com valor de 2 e 5 dólares, cujo câmbio oficial foi, no final de Novembro, estipulado em 1 USD por cada nova unidade monetária.

No entanto, dias depois desta medida correctiva, as novas "bond notes", ou novos dólares zimbabueanos, já estavam, como lembram analistas financeiros, a ser trocadas com desconto acentuado pela moeda norte-americana, nas ruas de Harare.

Imediatamente foram alertando para o risco de a medida poder destruir o que resta da economia do país, gerando ainda mais descrédito, tanto político, podendo mesmo levar à queda de Robert Mugabe, como económico, devido à sua "mais que provável ineficácia".

Inicialmente, segundo os media estatais zimbabueanos, o BCZ estipulou um máximo de 10 milhões de "notas", com um montante de levantamento diário por parte dos cidadãos de $50 e um máximo de $150 por semana, cum valor idêntico às notas de USD e são seguradas em 200 milhões de USD no African Export and Import Bank (Afreximbank).

A má moeda

O problema é que rapidamente os analistas financeiros mais pessimistas sobre esta medida correctiva do BCZ mostraram ter razão, fundamentalmente porque a lei de Gresham revelou-se actual. Segundo esta lei, que remonta ao século XVI, se duas moedas com o mesmo valor nominal circulam ao mesmo tempo, aquela que tiver mais ouro (USD) será guardada e a que tiver menos será usada, que é o caso do novo dólar zimabueano.

Isto, claro está, está a fazer desaparecer os USD da economia, sendo um excelente, teste para a velha lei de Gresham, provando a sua actualidade, o que pode ser trágico para o já depauperado país.

O Zimbabué, como se sabe, apresenta a mais alta taxa de inflação do mundo, com os preços a subir diariamente várias vezes, o que levou o BCZ a emitir notas cada vez de maior valor nominal, chegando aos 50 mil milhões de dólares zimabueanos num só bilhete.

Depois de abolida esta moeda nacional, foi definida pelo Governo a adopção do USD, o que permitiu uma ligeira recuperação, ao mesmo tempo que a hiperinflação era controlada...

Mas, já mais recentemente, a crise das matérias-primas que se seguiu e a seca extrema que está a devastar o país, levou ao enxaguamento do USD e, sem capacidade de emitir moeda própria, as autoridades zimbabueanas viram o Rand da África do Sul, o maior parceiro comercial do país, ser a moeda corrente.

A deflação tomou conta da economia zimbabueana, o dinheiro desapareceu de circulação e as pessoas foram-se amontoando, especialmente funcionários públicos, à porta dos bancos para tentarem reaver as suas parcas poupanças.

E é neste quadro que surgem as "bond notes" de 2 e 5 dólares, com valor igual ao dólar norte-americano, para aliviar a escassez de "cash"

Só que... o problema regressou sobre a forma da lei de Gresham. Todos aqueles que podem, trocam as suas "bond notes" por USD, o que levou a que, nas ruas, estas já sejam trocadas com forte desconto e, onde o câmbio se mantém o oficial, a corrida ao dólar "a sério" parece imparável. Os cambistas oficiosos que reapareceram nas ruas do país são a única actividade que está a florescer com a medida.

O que se passa, neste momento, é que os analistas estão divididos entre esta medida ser o último suspiro de um estado falhado ou à beira de o ser, e a possibilidade de a solução acabr por se impor, porque o Zimbabué tem um potencial económico que está apenas, e circunstancialmente, por causa das idiossincrasias de Mugabe, debaixo da lama...

Facto é que o Zimbabué, nos últimos anos, está a cair desamparado nas tabelas que medem a qualidade de vida e o índice de desenvolvimento humano, como o IDH do PNUD.

E, para piorar as coisas, uma das medidas imediatas a esta opção foi que as ONG a trabalhar no país foram "obrigadas", pelos doadores, a retirar o seus dinheiros, em divisas, dos bancos zimabueanos, como medida preventiva face ao eventual descalabro e caos que algum prevêem.