Alguns factores contribuíram positivamente para que o pequeno país fosse bem-sucedido no contexto africano, nomeadamente o facto de ter sido Nação antes de ser Estado, a ausência de uma guerra civil e a inexistência de clivagens étnico-linguísticas.
O mesmo não se pode dizer de Moçambique, que, dias antes, ou seja, a 25 de Junho, comemorou meio século de independência, depois do fim de um longo período de colonização portuguesa naquele país do Índico.
Com o mesmo desagrado, o mesmo não se pode dizer de Angola, que, dentro de quatro meses, ou seja, o 11 de Novembro vai assinalar o seu jubileu dos 50 anos da Dipanda.
Apesar de não respirar saúde financeira, Moçambique deu-se ao "luxo" de ter convidado 32 Chefes de Estado, mas apenas quatro deles marcaram presença, numa cerimónia que juntou à mesma mesa os três antigos Presidentes da República, nomeadamente Joaquim Chissano, Armando Guebuza e Filipe Nyusy.
A festa do jubileu dos 50 anos de independência de Moçambique decorreu num contexto em que as feridas da crise pós-eleitoral, que causou centenas de mortes, milhares de feridos e inúmeras destruições de bens, ainda sagram.
O país do Índico tem sido marcado, nestes últimos tempos, por graves tensões políticas e sociais, mudanças climáticas e uma extenuante guerra contra o terrorismo no Norte, assim como por elevados níveis de miséria e desemprego, mormente entre a juventude.
Estes acontecimentos e outros episódios que não abonam a boa imagem do país deveriam levar as autoridades moçambicanas a uma séria reflexão, a um balanço real e desapaixonado dos 50 anos de independência.
Ninguém em sã consciência pode negar que Cabo Verde, um arquipélago de 10 ilhas salpicadas pelo oceano Atlântico, é um dos poucos exemplos de democracia em África e um dos países mais estáveis do continente.
A antiga colónia portuguesa, que tem no crioulo a língua de unidade nacional, teve a particularidade de promover políticas de inclusão, sem discriminar os seus milhares de filhos que vivem na diáspora.
Apesar de não possuir riquezas naturais, uma situação agravada pela adversidade climática (deserto do Sahel), este país tem registado um assinalável crescimento económico e social, devido, mormente, à gestão transparente dos seus recursos financeiros; a maior fatia dos recursos é proveniente do envio de remessas financeiras dos seus emigrantes que se encontram espalhados pelos quatro cantos do mundo, bem como das pescas e receitas do turismo.
Do ponto de vista político, o país tem realizado, com regularidade, eleições gerais e locais, com reconhecida transparência, sendo que a alternância de poder tem sido feita sem sobressaltos. É um dos poucos países em África onde nunca houve uma tentativa de golpe de Estado ou instabilidade política digna desse nome.
As autarquias que, ciclicamente, proporcionam a divisão do poder pela horizontal têm sido importantes na gestão das rés pública e na fiscalização do poder local.
Os cabo-verdianos, ou melhor, os "Flagelados do Vento Leste" - como um dos mais conceituados poetas daquele arquipélago descreveu o drama dos seus conterrâneos, a braços com os prolongados períodos de secas cíclicas - são, por excelência, emigrantes. Tanto assim que existem mais cabo-verdianos a viver no estrangeiro do que no país.
A gestão parcimoniosa dos recursos financeiros e as práticas da boa governação levaram em tempos o antigo primeiro-ministro, José Maria das Neves (hoje Presidente da República), a gabar-se de que "a transparência é o petróleo de Cabo Verde".
Na realidade, não há como não dar razão a este governante deste país, que, sem grandes potencialidades económicas nem recursos financeiros, fez do homem a sua principal riqueza, o centro das suas atenções.
Mais do que beber da boa experiência cabo-verdiana em matéria de experiência autárquica, eleições livres e transparentes, Angola deveria aprender com aquele país como gastar os parcos recursos financeiros em prol do seu povo.
Angola deveria olhar-se ao espelho, em vez de "torrar" uma fortuna de 35 milhões de dólares, convidar sete dezenas de Chefes de Estado e de Governo para a cerimónia dos 50 anos de Independência, quando o País tem mais de 10 milhões de angolanos a viverem na mais extrema miséria, muitos dependentes dos contentores de lixo.
Deveria beber da experiência desse arquipélago cujos "empregados" (governantes) respeitam o "patrão" (povo) e jamais ousariam trazer para o seu país a milionária Selecção da Argentina e a sua "estrela" mais cintilante, Leonel Messi, a troco de milhões de dólares.
Três anos depois de João Lourenço ter visitado oficialmente àquele país e publicamente manifestado a sua vontade de beber da experiência das autarquias cabo-verdianas, o facto é que Angola continua a marcar passo.

Nestes 50 anos de Dipanda, não restam dúvidas de que Cabo Verde é o Estado dos PALOP que mais ganhos alcançou com a independência, promoveu uma melhor distribuição da renda social, tem realizado eleições transparentes e exemplares, e possui uma democracia robusta, deixando para trás regimes autocráticos como os de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau.