O vírus vinha de longe. Provocava tantos estragos, que Tio Loifo, famoso ourives da Minerva, que tinha como sobrinho o meu amigo Lóló, filho do velho "Garrafosa", logo tratou de imaginar uma solução.

Descendente de chineses, mas natural de S. Tomé e Príncipe, Tio Loifo dizia alto e bom som que, uma vez Presidente da sua ilha, em dois tempos acabava com a "praga das reuniões".

Quando lhe solicitaram para revelar o segredo, a resposta não poderia ter sido mais original: "convoco uma reunião"!

Corria o ano de 1979. O movimento trabalhista na pátria nascente não resistia ao sequestro dessa força vulcânica que se instalou em todas as esferas da nossa vida com poderes tão improdutivos quanto nocivos e que dá pelo nome de "reunião".

Entre o trabalho e a reunião, quem mais ordenava passava a ser agora a ideologia. Entre o trabalho e a política, a cada viagem do Presidente, o Governo, por junto e atacado, parava para ir em manada ao aeroporto.

Entre o trabalho e a política não se faziam contas, eram comícios de manhã, reuniões intermináveis à tarde, o país era nosso, já não era necessário trabalhar.

Pelo trabalho ninguém se comovia. Pelas reuniões ninguém agia com racionalidade.

Às reuniões toda a gente se entregava com emoção. Ao trabalho toda a gente se entregava com lassidão. Sobrepondo-se a todos, as reuniões eram agora prioridade para tudo e para nada!

Mas, os tempos de reunião eram também tempos de ressaca política. Ressaca dos horrores de uma longa guerra civil sem enterro agendado. Ressaca das atrocidades militares celebradas em hasta pública.

Ressaca de um vazio tétrico que implorava por outro tipo de reuniões destinadas agora a estancar de vez a ira encubada que dera lugar, num passado de memória fresca, a sepulturas rasgadas a sangue frio.

Ou a funerais sem registo de óbito. E ainda a uma criminosa destruição do tecido infra-estrutural do país, que parecia não ter fim à vista.

O fim da utopia das utopias acelerava a marcha do tempo. Puxava-se pela reconstrução, mas as marcas das primeiras escoriações da guerra sulcavam o rosto da maioria das capitais de província.

A cidade do Uíje não escapara também aos arranhões provocados pelas investidas militares que opunham as tropas governamentais às forças opositoras do regime de partido único então instituído em Angola.

Depois de Malanje e do Cuando-Cubango, o Uíje preparava-se igualmente para receber em apoteose Agostinho Neto, mas ninguém imaginava que aquela seria a sua última viagem ao Norte do país.

Com a cidade esventrada pelos obuses e morteiradas de diversa proveniência, as autoridades trataram de mandar arranjar instalações para as colocar à altura de ilustre visitante.

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