A The Economist Intelligence Unit (EIU), a unidade de análise global da revista The Economist, tem um mapa onde expõe a sua perspectiva para a evolução da disseminação das vacinas que pode ser o pano de fundo para as recentes palavras do director-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, que fala de um "falhanço moral catastrófico" da humanidade com os ricos a terem campanhas de vacinação, e os pobres, com África na linha da frente desta distinção negativa, a ficarem cada vez mais para trás.

No mapa da The Economist Intelligence Unit (na foto) pode-se ver que apenas sete dos 54 países que integram a União Africana (UA) - África do Sul, Botsuana, Namíbia, Quénia, Tanzânia e Gabão e Líbia - vão ter, ainda em 2022, acesso generalizado a vacinas para a Covid-19, estando os restantes, incluindo Angola, destinados a terem apenas essa abrangente vacinação da população a partir de Abril de 2023.

Esta perspectiva não sustenta a ideia de que as vacinas só vão chegar a estes países em 2023, porque a vacinação dos grupos prioritários deverá acontecer ainda este ano, como em Angola foi garantido pela ministra da Saúde, Sílvia Lutucuta, mas a população indiferenciada está em risco de só poder ter acesso a uma vacina dentro de dois anos.

E é isso mesmo que Tedros Adhanom Ghebreyesus já veio sublinhar quando admitiu, na terça-feira, numa intervenção na sede da OMS, que o "falhanço moral", no caso de os países ricos se mantiverem indisponíveis para partilhar parte dos milhões de vacinas que adquiriram, está evidente no facto de os jovens saudáveis e de risco diminuto nos países mais ricos estarem para ser vacinados antes, por exemplo, dos profissionais que se encontram na linha da frente do combate à pandemia nos países pobres.

O responsável máximo da OMS não poupou nas palavras quando deixou em evidência que o preço que vai ser pago por este egoísmo não será traduzido em meros atrasos nas campanhas de vacinação, será, isso sim, traduzido em vidas humanas perdidas nos países menos desenvolvidos.

E transformou em números este trágico fracasso moral: "Em 49 países ricos já foram utilizadas 39 milhões de doses de vacinas anti-covid enquanto num país pobre foram apenas usadas 25 doses.

O que está em causa, explicou, é que os países mais ricos, antes de serem aprovadas as vacinas actualmente em uso, fizeram promessas de garantir a sua distribuição equitativa, mas, agora que estas estão disponíveis, assiste-se a uma corrida às vacinas onde o poder económico dita as regras e os acordos bilaterais com as farmacêuticas são a regra, provocando o colapso da ideia de uma distribuição globalmente justa através da rede "Covax", o que tem feito elevar os preços para patamares insuportáveis para os países mais débeis.

No limite, avisou, se este cenário não for alterado rapidamente, vai levar a um prolongamento perigoso para todos da pandemia, podendo mesmo, como o Novo Jornal sublinha nesta notícia, fazer com que o Sars CoV-2 se transforme em mais um vírus dos pobres.

Recorde-se que estes receios são fundamentados na projecção feita pela unidade de análise da revista britânica The Economist, que sustenta que as vacinas não vão estar disponíveis em quantidades suficientes nos próximos meses para constituírem um efectivo ponto de viragem, acrescentando a isso as dificuldades de logística e de despacho.

Nesta projecção, a EIU estima igualmente que também nos países ricos as vacinas só estarão largamente disponíveis a partir de Setembro deste ano, Março de 2022, vincando sempre a ideia de que o mundo já está a assistir a uma corrida às vacinas onde os mais ricos procuram garantir por todos os meios quantidades suficientes para as suas populações enquanto os países pobres ainda estão na fase de procurar fundos para comprar as suas doses.

E o resultado é evidente para os analistas da EIU, tal como está a ser para a OMS: os países pobres e em vias de desenvolvimento não vão conseguir vacinar as suas populações antes de 2022 e em algumas regiões do mundo, os mais desfavorecidos só a partir de 2023 conseguirão garantir o acesso universal às vacinas.

Como o mapa evidencia, África e o sudoeste-asiático são as geografias mais frágeis, pintadas a vermelho, condenadas a só verem o acesso generalizado às vacinas em 2023, enquanto a verde carregado, onde se destacam a Europa, o Japão e os EUA, os seus cidadãos terão generalizado acesso ao antídoto para a mais grave pandemia a que o mundo assistiu em muitas décadas já este ano.

Isto, apesar de um esforço que, por exemplo, o UNICEF, que tem em mãos a organização de uma gigantesca operação de logística para garantir condições de acesso à vacina em 92 países pobres, num esforço marcado para derrubar estes muros de injustiça, ou ainda a manutenção do empenho da União Africana que tem a funcionar uma plataforma que agrega os 54 países do continente numa procura de conseguir ganhos de competitividade na aquisição de vacinas através da junção de esforços dos Estados-membros.

E nada garante hoje que em alguns países, os mais pobres dos pobres, estas vacinas nunca cheguem ou cheguem apenas a uma parte da população, fazendo com que a Covid-19 se estabeleça como "doença endémica, tal como sucede com a malária ou a dengue.