Os rebeldes do Movimento 23 de Março, apoiados pelo Ruanda, incluindo com unidades militares regulares enviadas por Kigali, como a ONU confirmou e o Governo de Kinshasa reafirmou no Conselho de Segurança da ONU, estão claramente a caminho de mais uma conquista territorial de grande valor estratégico para Kinshasa.

Se Bukavu, a capital do Kivu Sul cair, tal como Goma, a capital do Kivu Norte sucumbiu à pressão militar do M23 há duas semanas, o Governo congolês, do Presidente Félix Tshisekedi, perde uma vasta região do país onde estão concentradas gigantescas reservas de minerais estratégicos.

Apesar de o Presidente ruandês, Paul Kagame, insistir na recusa de ter o seu Exército a apoiar o M23, e destes serem os seus "pivots" para a extracção ilegal dos recursos minerais congoleses, a verdade é que o Ruanda tem há largos anos um robusto sistema de extracção de coltão no Kivu Norte baseado em explorações clandestinas que são seguras pelos guerrilheiros.

Isso mesmo ficou demonstrado em 2022, quando a ONU divulgou um relatório onde descreve o esquema ruandês de apoio ao M23, sendo igualmente parte de investigações diversas de media e organizações internacionais o facto de o coltão estar a ser exportado em grandes quantidades por Kigali sem que o Ruanda possua quaisquer reservas deste minério.

O coltão, tal como o cobalto, o lítio ou as mais difusas "terras raras", 17 minérios que existem em pequenas quantidades mas ocorrem na natureza em simultâneo, são minérios fundamentais e insubstituíveis, até agora, para as indústrias 2.0 das potências ocidentais.

Sem estes, áreas como as telecomunicações, a aeronáutica, a indústria espacial, as energias alternativas, as baterias de veículos eléctricos ou aparelhos electrónicos e telemóveis e computadores, sofreriam um recuo de décadas, visto que a RDC, nalguns casos, como o coltão, responde por 80% da sua produção mundial.

Essa a razão pela qual todas as grandes economias globais, como a chinesa, norte-americana, alemã... têm os olhos postos neste conflito que decorre no leste da RDC, porque se o M23 tomar mesmo, como já se adivinha, os Kivu Norte e Sul, então, provavelmente, esta guerra será ganha pelo ocidente. Que terá, em detrimento da China, acesso aos recursos do... Ruanda.

E é por isso que a conquista da cidade de Nyabibwe aparece neste contexto como um episódio relevante, porque confirma o que o Novo Jornal avançava aqui na semana passada (ver links em baixo), como deixa entender que o objectivo do M23/Ruanda só poderá ser travado pela via militar, visto que anula o cessar-fogo unilateral anunciado no início desta semana.

E esta cidade mineira está localizada a meio do percurso entre Goma e Bukavu, na estrada EN2, na margem do Lago Kivu, o que permite não apenas bloquear quaisquer avanços das Forças Armadas da RDC (FARDC), com quem travam combates diários, como permite, como parece ser o caso, avanços fulminantes na direcção de Bukavu e assentar forças na mais relevante zona mineira congolesa.

Entretanto, apesar do líder local do M23, em Goma, Corneille Nangaa, depois de assumir esta cidade, capital do Kivu Norte, ter garantido que os seus homens estavam ali para libertar a região da opressão de Kinshasa, esta quinta-feira, 06, a MONUSCO, a missão da ONU na RDC, anunciou que foram encontrados perto de 2900 corpos resultado dos combates com o M23 e os perto de 4 mil soldados ruandeses que os apoiam directamente.

Destes 2900, mais de 2000 corpos foram recuperados pela Cruz Vermelha e mais de 700 estavam em unidades de saúde da região, enquanto, segundo relatos feitos pelas agências de notícias internacionais, nos bairros e aldeias da vizinhança, as famílias continuavam, ininterruptamente, a enterrar os corpos dos seus familiares mortos no decurso dos combates.

Isto, quando se sabe que a pior e mais letal fase deste conflito poderá ainda estar para chegar, quando os rebeldes avançarem sobre Bukavu, agora, depois da experiência de Goma, melhor protegida pelas FARDC, pelas unidades de combate das MONUSCO, e pelas forças da SADC, para ali enviadas ao abrigo do Processo de Luanda, que parece estar cada vez mais fragilizado.

Além disso, se, como ameaçou Corneille Nangaa, depois de tomar Goma, ser "objectivo do M23 marchar sobre Kinshasa", então será uma marcha de mais de 1600 kms que dará lugar à estrada da morte na RDC.

Por estas declarações e pelo comando do M23, Corneille Nangaa, um antigo dirigente político congolês e líder da Comissão Nacional de Eleiçoes (CENI), entre 2015 e 2021, foi, nas últimas horas, visado pelo Tribunal de Justiça Militar da RDC com um mandato de captura, sob a acusação de cumplicidade em actos de tortura por unidades sob o seu comando.

Actualmente Nangaa é um dos líderes seniores rebeldes na RDC, dirigindo a chamada Aliança do Rio Congo (ARC), que agrega um conjunto de grupos de guerrilheiros, incluindo o M23, criado em 2012, tendo adormecido até 2021 (ver links em baixo nesta página), quando reemergiu das sombras com especial violência, quase unicamente constituído por elementos da etnia Tutsi, dispersa entre a RDC e o Ruanda.