Depois de claramente esgotados os processos de Luanda, que procurava um entendimento entre a RDC e o Ruanda, e o de Nairobi, Quénia, com foco nas negociações internas congolesas, a esperança mudou-se para Dar-es-Salam, na Tanzânia... por pouco tempo.
Sem grande surpresa, a Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da SADC (África Austral) e EAC (África Oriental), que teve lugar no passado Sábado, foi um fracasso, apesar de os Presidentes ruandês, Paul Kagame, e o congolês, Flelix Tshisekedi, terem participado, este último por videoconferência.
As duas organizações regionais apenas conseguiram emitir um comunicado onde ficou vincado um apelo ao cessar das hostilidades e à procura de soluções negociadas em vez daquilo que parece ser uma procura pelo M23 de controlar a maior parte do leste da RDC, desde logo o Kivu Norte e o Kivu Sul.
Esta aposta dos homens de Corneille Nangaa, antigo dirigente político em Kinshasa e ex-presidente da Comissão Eleitoral (CENI), e actual líder local do M23, com apoio logístico e em armas de Kigali, não ignora o facto de os dois Kivu serem o berço da maior parte dos recursos naturais estratégicos fortemente cobiçados pelas potências económicas ocidentais e asiáticas.
É no Kivu Norte e Kivu Sul que estão as principais minas de coltão, cobalto e terras raras congolesas, e é por elas que o Ruanda lançou o seu braço armado, o M23, contra as Forças Armadas da RDC (FARDC), aproveitando a sua fragilidade alimentada por anos a fio de corrupção e infiltração por elementos hostis ligados ao Ruanda e ao Uganda.
Apenas as unidades de combate da MONUSCO, a missão da ONU na RDC, e as forças do contingente da SADC enviadas em 2024 para conter os avanços do M23 e fazer valer o cessar-fogo acordado em Luanda (ver links em baixo), permitem alguma capacidade de resistência, porque as FARDC, como analistas locais notam, deixou de ter qualquer eficácia operacional devido à corrupção.
E é neste contexto, de falhanço atrás de falhanço regionais, que este conflito começa a ganhar "asas" estando já claramente a ferver entre o Ruanda e a África do Sul, com ameaças de guerra mútuas, e com as principais escaramuças locais a serem protagonizadas por unidades ruandesas e sul-africanas, com dezenas de mortos de um e do outro lado.
Mas é nos dois vizinhos que tocam geograficamente o epicentro do conflito, o Uganda, a norte, e o Burundi, a sul, que as coisas começam verdadeiramente a complicar-se, porque tanto Kapala como Bubumbura, ou Gitega, não escondem terem tropas no leste da RDC para defenderem os seus interesses.
Porém, se o argumento de Kampala é colocar forças na RDC para travar a guerrilha das Forças Democráticas Aliadas (ADF), com ligações ao `estado islâmico', o Uganda não tira debaixo cdo olho os territórios congoleses adjacentes às suas fronteiras.
O mesmo faz o Burundi, que enviou, segundo diversas fontes, entre dois a quatro batalhões (cerca de mil soldados cada) para proteger a região do Kivu Sul fronteiriça, mas com já provada presença na linha da frente a tentar ajudar a travar o avanço do M23 sobre Bukavu, a estratégica capital desta província, depois de há semana e meia terem tomado Goma, capital do Kivu Norte.
Se o Uganda, aparentemente, não tem uma postura de querer posicionar-se abertamente ao lado do Ruanda, as suas oscilantes relações históricas estão, nos últimos tempos, na mó de cima, enquanto o Burundi é claramente um aliado da RDC.
E, com o alargamento regional do conflito, quando o M23 começa a aproximar-se perigosamente de Bukavu, a capital do Kivu Sul, que é também uma praça económica importante para o vizinho Burundi, quando as forças de Bujumbura se empenham cada vez mais nos combates contra os guerrilheiros "ruandeses", a regionalização do conflito parece cada vez mais inevitável.
Essa mesma opinião tem o analista e professor universitário, Ben Luther Toure, explicada no programa televisivo Global Africa, onde defendeu que os países da região vão rapidamente perceber que o Presidente do Ruanda "não vai perceber outra linguagem que não seja a da guerra".
E isso é um caminho curto para a escalada regional do conflito, porque o Burundi não poderá aceitar que o M23 e as forças que o apoiam se instalem às suas portas, apontou este analista.
Sabendo do risco de um conflito regionalizado nesta geografia dos Grandes Lagos, marcada por três décadas de conflitos, com epicentro na RDC, especialmente na década subsequente ao genocídio do Ruanda, em 1994, tanto as organizações regionais, SADC e EAC, ou mesmo a CEEAC, como a União Africana e a ONU, têm agora como tema principal evitar que o pior aconteça.
Depois de falhados os palcos de Luanda e de Nairobi, e ainda de Dar-Es-Salem, a diplomacia vira-se agora para Adis Abeba, a capital etíope, onde decorrerá a 38ª Cimeira da União Africana, a 15 e 16 deste mês, na qual Angola assumirá a Presidência rotativa, e onde o seu Conselho de Segurança, logo depois, discutirá a efervescente questão congolesa.
Provavelmente, estes dias que faltam para a Cimeira da União Africana vão ser aproveitados pelo M23 e pelo Ruanda para ganhar posições estratégicas no leste congolês, aproveitando as notórias fragilidades das FARDC e incapacidade do Governo do Presidente Félix Tshisekedi em reunir apoios internacionais capazes de fazer pressão e travar Paul Kagame.