Um conjunto de grupos rebeldes, que as autoridades de Bangui e a comunidade internacional diz estarem a ser apoiados pelo antigo Presidente François Bozizé, que o Tribunal Constitucional impediu de se candidatar nestas eleições, têm procurado, nas últimas semanas, desestabilizar o país e entrar em Bangui para tomar o poder pela força.
Este ataque foi, no entanto, rechaçado pelas forças leais a Touadéra, que tem ao seu lado combatentes enviados pela Rússia e pelo Ruanda, ao mesmo tempo que a ONU mantém no país um forte contingente militar internacional de estabilização e manutenção de paz com ordem de uso da força perante ataques de rebeldes.
A Reuters escreve que o ataque simultâneo foi protagonizado por centenas de rebeldes, fortemente armados, sendo o seu financiamento garantido pelo ex-Presidente Bozizé e por forças regionais não identificadas, que visam poder usufruir das riquezas naturais da RCA, especialmente ouro e diamantes.
Um país cobiçado pelas riquezas naturais
A RCA, com mais de 4,5 milhões de habitantes, localiza-se geograficamente a norte do Congo-Democrático, fazendo ainda fronteira com o Chade, o Sudão, o Sudão do Sul e os Camarões, sofre historicamente da cobiça de grupos de guerrilha regionais devido à abundância de recursos e sofreu sucessivos golpes de estado, entrando numa espiral de violência especialmente grave desde que Bozizé foi deposto em 2013, também através de uma intentona.
É actualmente um país fortemente dividido e instável, apesar do contingente alargado de capacetes azuis da ONU no terreno, com dezenas de grupos armados, alguns de génese religiosa radical islâmica e cristã ou animista, a actuar em mais de dois terços do território.
As eleições tiveram lugar no Domingo, 27 de Dezembro e deram a vitória a Faustin-Archange Touadéra mas a oposição não reconheceu os resultados-
Faustin-Archange Touadéra conta com o apoio directo de algumas potenciais estrangeiras, como a Rússia ou o Ruanda, que deslocaram centenas de militares para Bangui antes das eleições como forma de procurar travar a ofensiva dos três grupos armados - são pelo menos 12 as forças milicianas activas no país - e vê agora ameaçada a periclitante estabilidade que conseguiu desde que em 2016 foi eleito.
Face ao clima de violência, gerada por disputas de grupos tribais, religiosas, cristão-animistas e islâmicos, Touadéra fez, antes das eleições, vários périplos pelos vizinhos africanos como forma de criar condições para forjar uma estabilidade política que se afigurava quase impossível depois de anos a fio de convulsões permanentes, incluindo pelo menos três deslocações a Luanda para conversações com o seu homólogo João Lourenço, a quem pediu, em Janeiro deste ano, apoio para que as Forças Armadas Angolanas (FAA) dessem formação às forças armadas do seu país, havendo rumores, por confirmar, de que Angola é um dos países que tem forças militares em Bangui.
Os problemas na RCA intensificaram-se a partir de 2017/18, quando ficou claro que o Presidente Faustin-Archange Touadéra não estava a conseguir estender o seu poder e o poder do Estado para fora da periferia de Bangui.
A importância reconhecida a Luanda
Sendo o país, rico em recursos naturais, desde logo o ouro e os diamantes - nas visitas a Luanda de governantes deste país uma das questões em cima da mesa foi a formação de quadros locais por Angola nestas indústrias extractivas -, a cobiça externa cresceu de forma significativa a ponto de Moscovo ser acusado de ter milhares de mercenários no país, ao mesmo tempo que a ONU enviava forças importantes, integradas na missão multidimensional denominada MINUSCA, entre estas portuguesas, senegalesas, francesas... para manutenção da paz, o que até hoje foi, apesar dos esforços, missão impossível.
As principais facções inimigas na RCA, as coligações alargadas mas escassamente homogéneas, actualmente ex-Seleka, maioritariamente islâmicos, e os anti-Balaka, formada por grupos geralmente cristão e ou animistas, nunca deixaram de se guerrear, apesar dos acordos firmados ao longo dos últimos anos, especialmente o último, em 2017, entre o Governo e mais de 10 grupos armados, fazendo deste país localizado no norte do Congo-Democrático, ladeado a este pelo Sudão do Sul e a Oeste pelos Camarões, tendo a norte o Chade, um dos mais instáveis do continente africano.
O Presidente centro-africano, no entanto, ideia que repetiu em Luanda, já este ano, em Janeiro, refutou sempre que a RCA não está a ser vítima de conflitos religiosos mas sim de natureza política.
Perante a evidente ausência de resultados, os grupos aramados mantiveram-se activos e fortemente rearmados, estando como principal suspeito por detrás deste ressurgimento da violência e do assalto a Bangui nos dias anteriores ao Domingo eleitoral, o ex-Presidente Bozizé, de 74 anos, que viu a sua candidatura recusada pelo Tribunal Constitucional e que governou o país de 2003 a 2013, depois de ter liderado um golpe de Estado onde destituiu o então Chefe de Estado Ange-Félix Patassé, através de um assalto à capital semelhante ao que está a suceder agora.
Este antigo oficial ao serviço do famoso ditador Jean-Bedél Bokassa está a ser apontado como o organizador destes ataques mas, desta feita, o tiro pode sair pela culatra, depois de uma reacção decidida em Moscovo e em Kigali, que enviaram contingentes para a RCA para apoiar Touadéra.