A importância da estabilidade no Médio Oriente para os mercados petrolíferos é simples de perceber, mesmo para os menos atentos a este negócio global que, apesar da corrente transição energética forçada pelas alterações climáticas, ainda determina grande parte dos "humores" da economia global: ali é extraído 35% do crude consumido diariamente em todo o mundo.
E a guerra na Faixa de Gaza, entre uma das maiores potências militares da região, Israel, e o Hamas, com um desequilíbrio de forças traduzido por quase 29 mil palestinianos civis mortos, entre estes mais de 12 mil crianças e quase 9 mil mulheres, desde 07 de Outubro, é, como o é há décadas, o grande condutor da instabilidade geral na região.
É essa, retirar a perturbação do negócio da energia, uma das razões do empenhado envolvimento dos Estados Unidos nas negociações que envolvem ainda o Qatar e o Egipto para um cessar-fogo entre o Hamas e Israel, que se traduz na 5ª visita do secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, à região, e que, de novo, corre o risco de se traduzir num fracasso, porque Israel anunciou nas últimas horas que não aceita as condições do Hamas para cessar as hostilidades.
Assim que o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyhau, anunciou a recusa de Telavive para assinar o acordo de cessar-fogo, os mercados internacionais, onde a oferta e a procura se misturam com as expectativas de aumento da produção e o receio de falhas no fornecimento, receita para o preço diário da medida internacional, voltaram a temer disrupções futuras e o barril estava esta manhã, perto das 09:30, hora de Luanda, a valer já 79,50, a subir 0,3%.
A par do caos no Médio Oriente, onde o risco de uma faísca de Gaza atingir o Irão e dai incendiar tudo à volta com um confronto directo com Israel e os Estados Unidos, também uma desvalorização do dólar está a contribuir para a valorização do barril, porque, nesta "guerra", onde a moeda dos EUA ainda é o "calibre" internacional, os restantes países precisam de menos das suas moedas para adquirir os dólares com que adquirem o petróleo.
Para Angola, as contas...
Para Angola, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, ter o Brent nos 80 USD permite, embora não seja o antidoto definitivo, diluir alguns dos efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista, até porque o país enfrenta também o problema da persistente redução da produção diária.
Com OGE 2024 elaborado com um valor de referência médio para o barril de 65 USD, estes valores actuais permitem um relativo optimismo, mas aumentar a produção é o factor-chave, o que ficou mais fácil depois de Angola ter, em Dezembro passado, anunciado a saída de membro da OPEP, o que deixa um eventual acréscimo da produção fora dos limites impostos pelo cartel aos seus membros como forma de manter os mercados equilibrados entre oferta e procura.
O crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.
O Presidente da República, João Lourenço, deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,12 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.
O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.
Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.
Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.
A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.