Há muito que de forma escassamente científica se diz nos corredores da economia nacional que esta, pelo menos enquanto não ocorre a mirífica fuga à dependência do crude, só gera superavit suficiente para se fazer sentir no bolso das pessoas e nas contas-correntes das empresas com o barril de Brent acima dos 80 USD.
Ainda não está lá. O Brent, que sobe substancialmente há dias a fio, valia, hoje, 27, perto das 10:00 de Luanda, para contratos de Novembro, 79.01 USD, +1.15% que no fecho de sexta-feira, enquanto no WTI, em Nova Iorque, o barril valia 74.86 USD, +1.19% que no fecho da anterior sessão.
Mas é inevitável que chegue aos 80 e mais além, como, de resto, os oráculos de serviço, como a Goldman Sachs antecipa há largos meses, colocando mesmo como inevitável que o barril atinja os 100 USD, provavelmente ao longo de 2022.
Para já, o que está a gerar este remoinho é o afunilamento da oferta de crude por falta de investimento nos últimos anos nas áreas da pesquisa, como é disso exemplo Angola, que não está sequer a conseguir suprir a sua quota no seio da OPEP face ao declínio da produção nacional, e também do envelhecimento dos seus campos mais produtivos.
Face a uma crescente procura gerada no rasto da saída de cena da Covid-19, que provocou uma das mais pesadas crises globais em décadas, a OPEP+, que agrega os Países Exportadores (OPEP) e um grupo de 10 não-alinhados liderados pela Rússia, tem vindo a aumentar a produção, depois de pesados cortes para equilibrar o asfixiado mercado planetário pelo Sars CoV-2 em 2020, na ordem mensal dos 400 mil barris por dia a partir de Agosto e até final do ano.
Mas esse aumento tem-se revelado escasso para corresponder às necessidades, até porque alguns dos membros não estão a conseguir corresponder, como, já se disse, é o caso de Angola, mas também da Nigéria ou do Cazaquistão, sendo as causas muito semelhantes, falta de investimento em manutenção e na procura de novas jazidas, especialmente depois de 2014.
Face a este cenário, os países exportadores e, em especial, as economias mais petro-dependentes, têm mais que razões para sorrir, mas o tempo de manter essa satisfação visível tem os dias contados, pelo menos é o que pensam aqueles que lutam pela transição energética dos hidrocarbonetos para energias renováveis de forma a salvar o planeta do sufoco dos gases com efeito de estufa.
A indústria do petróleo está condenada...
É o que pensam alguns dos mais acérrimos defensores das energias verdes que acreditam que disso depende a salvação do planeta e da própria humanidade que dele fez casa.
Uma das vozes que tem essa percepção bem vincada é James Jampel, que dirige um hedge fund denominado HITE Carbon Offset, cujas mais valias dependem do sucesso da descarbonização da economia, e, citado pela Bloomberg, veio a público explicar porque é que, apesar deste momento de bonança no sector petrolífero, este tipo de energia tem os dias contados.
"Nada do que possa suceder este ano na escalada dos preços do petróleo contrariará esse declínio", disse, sublinhando que se trata mesmo de "sol de pouca duração" no Inverno que espera a indústria petrolífera, condenada pela emergência global de combater as alterações climáticas.
Jampel diz ainda que o petróleo vai ser o grande derrotado e o maior gerador de perdas em todo o mundo com o advento da transição energética.
E quem garante que este é o cenário que espera a indústria petrolífera é quem gere um fundo de centenas de milhões USD que espera ganhar com a diluição do valor na cadeia de valor do carbono.
Alguns especialistas admitem que o prazo limite para os investimentos no sector dos hidrocarbonetos está a aproximar-se a grande velocidade e alguns dos maiores bancos do mundo já deixaram de o fazer ou fixaram datas limite para que isso aconteça, nalguns países os carros de combustão interna deixam de poder circular nos próximos anos e na União Europeia, por exemplo, esse limite começa já em 2035.
Mas o pior, admitem os especialistas, no que diz respeito aos interesses imediatos das economias que dependem da exportação de crude, é que já em Novembro, em Glasgow, na Escócia, vai ter lugar a Cimeira do Clima mais importante de sempre e onde as grandes potências, como o Presidente dos EUA, Joe Biden já admitiu, poderão encolher estes prazos de forma radical.
O que, a acontecer, poderá deixar Angola em maus lençóis porque o País está a construir duas refinarias, Soyo e Cabinda, e prepara para avançar na do Lobito, investimentos de largas centenas de milhões de dólares.
Naturalmente que Angola poderá desenhar o seu próprio mapa de descarbonização, mantendo a valer estas infra-estruturas por muito tempo, mas isso poderá tornar-se inviável se a comunidade internacional criar, como se espera que venha a suceder, sanções para os países mais resilientes face à urgência de acelerar a transição energética.
O deve e o haver angolano
Sendo Angola um dos países na linha da frente das repercussões do sobe e desce dos mercados petrolíferos, devido à sua dependência das exportações de crude para o equilíbrio das suas contas - o petróleo ainda é responsável por mais de 94% das exportações e mais de 60 por cento dos gastos do Executivo e acima de 50% do PIB, este cenário de recuperação permite algum optimismo nas contas nacionais mas ainda longe de um regresso ao patamar alcançado a partir de 2008, com o barril, como exemplo, a chegar aos 147 USD no Verão desse mesmo ano, permitindo um boom económico como nunca visto até ali.
A produção actual, em constante declínio, está abaixo dos 1,2 mbpd devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016, bem como devido ao esgotamento / envelhecimento dos campos mais activos.
Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção tem vindo a perder viço especialmente por causa da deterioração da infra-estrutura produtiva que desde 2014 viu os investimentos das "majors" descer, a fraca aposta na pesquisa por novas reservas e o envelhecimento de alguns dos mais importantes poços activos no offshore nacional.
Para já, com o barril quase nos 80 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de quase 41 USD em cima dos 39 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.
E, no âmbito do esforço do Governo para que o País não deixe de estar no radar dos investidores, aprovou em Conselho de Ministros um diploma de define regras e procedimentos para a atribuição de concessões petrolíferas em Regime de Oferta Permanente.
Isto vai permitir a promoção e negociação de blocos licitados não adjudicados e, segundo o comunicado deste CM, o documento legal permitirá permanentemente "a promoção e negociação de blocos licitados não adjudicados, de áreas livres em blocos concessionados e de concessões atribuídas à Concessionária Nacional, para potencializar e atrair investimentos nas actividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, mediante o procedimento de concurso público".