Há já algumas semanas que países como os EUA, a China ou a União Europeia estão a pedir que a OPEP+ aumente a produção, uns mais efusivamente, como os norte-americanos, outros nos corredores, como a China, voltando a ameaçar investir biliões na produção local via fracking (petróleo de xisto), especialmente depois de o barril de crude ter ultrapassado os 70 USD tanto no Brent, que serve de referência às exportações das ramas nacionais, como no WTI, em Nova Iorque.

E é isso, essa pressão quase global, que poderá surgir reflectido na reunião mensal que os 23 membros da OPEP+, organização que agrega os Países Exportadores (OPEP) e 10 aliados chefiados pela Rússia, têm hoje para, mais uma vez, analisar os mercados e se o actual plano de retoma da produção, na casa dos 400 mil barris por dia, mensalmente, até ao final de 2021, deve ou não ser alterado face à realidade da economia global e como esta tem vindo a corresponder numa altura em que a pandemia da Covid-19 começa a diluir-se de forma evidente, pelo menos nos países mais desenvolvidos.

Para já, a expectativa matinal é que a OPEP+ não deverá alterar substancialmente o actual plano, que acrescenta 400 mbp todos os meses e até 31 de Dezembro, depois de cortes substanciais nos últimos 18 meses, por causa da crise.

Isto, porque, segundo alguns analistas, o "cartel" está a recuperar bem da crise que viveu desde Março de 2020 e porque a sua infra-estrutura produtiva não está a conseguir corresponder sequer a esta exigência, porque, como é o caso dos africanos Angola e Nigéria, mas não só, ao aumento em curso porque ocorreu um grande desinvestimento das multinacionais a partir de 2014 na pesquisa e manutenção, crise que se fortaleceu com o surgimento do Sars CoV-2.

No entanto, com o Brent nos 79.38 USD, +0.11% que no fecho de sexta-feira, e o WTI nos 75.96, +0.11%, ambos contratos para Novembro, a OPEP+ poderá ter uma margem relevante para tentar acrescentar alguns barris à produção, até porque isso é do interesse do cartel, visto que, com os actuais preços, os produtores do fracking norte-americano, com grande capacidade mas limitados por um breakeven muito alto, podem ser tentados a voltar aos mercados em grande quantidade, o que, de certa forma já está a mostrar sinais de suceder.

Enquanto isso...

Seja qual for a decisão a sair da reunião de hoje, certo, certo é que este é um dos grande momentos para a indústria petrolífera - muitos dizem que pode ser mesmo o canto do cisne deste sector face à emergência da transição energética e o problema das alterações climáticas onde os hidrocarbonetos são o alfa e o ómega de todo o mal - e que os países mais capazes estão a aproveitar de forma evidente nos países do Golfo, especialmente a Arábia Saudita, o Qatar, os Emirados Árabes Unidos, o Kuwait ou mesmo o Irão, apesar da sanções.

A saída da crise pandémica, a recuperação económica que se lhe sucedeu, o aumento generalizado da procura de crude, etc. tem estado a galvanizar os mercados mas, ao mesmo tempo, a criar um problema de oferta face à demanda que já não se via há longos meses e que se aproxima, globalmente, dos 100 milhões de barris por dia (mbpd) que existia em 2019, exigindo um aumento de oferta que os países da OPEP+ tardam em garantir, seja por causa do plano de acção do cartel, seja por causa de deficiências no down stream geradas pelo desinvestimento.

Para atingir os 5,8 mbpd retirados aos mercados no início da crise, a OPEP+ terá de forçar a sua capacidade instalada ao limite, o que, nalguns casos, não será evidente porque são muitos os estragos produzidos nas sucessivas crises que desde 2014 afectam o sector, especialmente nos países economicamente menos robustos, como Angola, onde as majors estão em claro fade out há já vários anos, apesar de algumas excepções e do esforço que o Executivo tem vindo a fazer para contrariar essa realidade através da criação de legislação amiga do sector.

Se Angola, Nigéria, Líbia ou Argélia, os grandes produtores africanos sofreram com a baixa do consumo, a recuperação não está a ser igualmente rápida, muito devido à fraca capacidade de resposta, de forma mais acentuada em Angola e na Nigéria, por causa da deterioração da sua infra-estrutura, do desinvestimento em pesquisa, em manutenção e já, também, resultado de uma desistência global do petróleo devido à poluição e o esforço mundial para uma transição energética que afaste a ameaça das alterações climáticas sobre a humanidade.

Mas o mesmo não se pode dizer dos países do Golfo, que tiveram melhor visão estratégica ao longo dos anos, investindo mais na diversificação e na manutenção dos seus campos, que, agora, estão a dar uma resposta adequada ao aumento da procura e a gerar optimismo entre os diversos sectores económicos, como é o caso da Arábia Saudita, cujo mercado bolsista cresceu mais de 42 por cento nos últimos 12 meses.

Este exemplo é ainda mais interessante porque o crescimento mais volumoso reflecte-se, segundo os media internacionais especializados, no sector não petrolífero, como as telecomunicações, o turismo, o comércio e a indústria química..., sendo que a petrolífera nacional, a ARAMCO, no mesmo período, ganhou uns meros 3,3%.

Mas esta lancinante recuperação, que já é vista como o milagre do Golfo, abrange ainda os Emirados Árabes Unidos, com o mercado bolsista a subir mais de 14%, com destaque para os sectores da saúde, da banca e do ensino privado, ou ainda das telecomunicações, entre outros.

E o cenário é muito semelhante, como se pode perceber pelos dados que estão a ser divulgados pelas agências, no Qatar, no Kuwait, Baharain ou mesmo no Irão, apesar deste país estar sujito à pressão adicional das sanções norte-americanas.

A ficar para trás

Entre os restantes exportadores de crude, a recuperação está a ser substancialmente mais lenta, como é o caso de Angola, onde a economia se debate com a pressão da inflação, que pode chegar, segundo o INE e o BNA, aos 27% nos próximos meses, uma crise social sem precedentes desde o fim da guerra, em 2002, e uma assinalável incapacidade para que os esforços da diversificação económica mostrem sinais de estar a produzir efeito.

Como pano de fundo para este cenário difícil, o País tem o acentuado declínio da sua produção de petróleo, que está actualmente abaixo dos 1,1 milhões de barris por dia e com tendência para diminuir ainda mais.

Tudo devido ao sobejamente conhecidos problemas do abandono de algumas das majors com investimentos no off shore nacional, face a uma "infecciosa" dependência do petróleo que, ao longo dos anos, criou uma inércia geral face à urgência de diversificar a economia apesar de ser bem conhecida essa urgência.

E o resultado é o que se sabia estar ao virar da esquina perante uma realidade em que o petróleo ainda é rei e senhor na economia nacional.

Sendo Angola um dos países na linha da frente das repercussões do sobe e desce dos mercados petrolíferos, devido à sua dependência das exportações de crude para o equilíbrio das suas contas - o petróleo ainda é responsável por mais de 94% das exportações e mais de 60 por cento dos gastos do Executivo e acima de 50% do PIB, este cenário de recuperação permite, ainda assim, algum optimismo nas contas nacionais mas ainda longe de um regresso ao patamar alcançado a partir de 2008, com o barril, como exemplo, a chegar aos 147 USD no Verão desse mesmo ano, permitindo um boom económico como nunca visto até ali.

A produção actual, em constante declínio, está abaixo dos 1,1 mbpd devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016, bem como devido ao esgotamento/envelhecimento dos campos mais activos.

Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção tem vindo a perder viço especialmente por causa da deterioração da infra-estrutura produtiva que desde 2014 viu os investimentos das "majors" descer, a fraca aposta na pesquisa por novas reservas e o envelhecimento de alguns dos mais importantes poços activos no offshore nacional.

Para já, com o barril acima dos 79 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de mais de 40 USD em cima dos 39 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.

E com a transição energética a impor cada vez mais a sua vontade, com o crude e os restantes hidrocarbonetos a ser olhado como uma infecção perigosa e contagiosa, o País tem agora de fazer o que não fez nos últimos 20 anos: diversificar a sua economia o mais rápido possível, porque o petróleo tem os dias contados. E são cada vez menos.