Nos últimos largos anos, pelo menos recuando uma década,, não se vê este preço colado ao barril de Brent, que serve de referência às ramas exportadas por Angola, excepto por algumas horas a 09 de Março deste ano, devido ao efeito da invasão da Ucrânia, a 24 de Fevereiro.
Os 124,06 USD a que estava a ser vendido o barril de Brent na abertura dos mercados é uma consequência directa da decisão do bloco europeu de punir a Rússia pela invasão da Ucrânia com um embargo quase total ao seu petróleo.
Isso gerou de imediato, como se esperava, receios de que os países europeus que vão deixar de comprar o crude russo terão dificuldades em encontrar fornecedores alternativos devido às dificuldades existentes, que são sobejamente conhecidas no meio.
Uma das razões, por exemplo, é a reduzida capacidade de aumentar a produção em países que sofreram forte desinvestimento na produção e pesquisa nos últimos anos devido ao fraco valor da matéria-prima, especialmente desde 2014, onde Angola é apontado como um dos casos mais evidentes, a ponto de não estar sequer à altura de cumprir as quotas a que tem direito no seio da OPEP.
Angola tem vindo a assistir a uma progressiva diminuição da sua produção, prevendo-se agora que em 2022 consiga, em média, atingir os 1,14 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe dos valores de há pouco mais de uma década, onde chegava aos 1,8 mbpd, e tudo porque as majors a operar no off shore nacional iniciaram um sólido desinvestimento no País a partir de 2014, quando o barril sofreu uma queda abrupta deslizando de perto de 120 USD para menos de 30 USD em Fevereiro de 2016. A pandemia da Covid-19 contribuiu fortemente para agravar esse cenário, no início de 2020.
Agora, com este, apesar de esperado, anúncio do embargo europeu ao crude russo, os analistas admitiram mesmo que a resposta para suprimir este défice de fornecimento pudesse vir de países africanos como Angola e a Nigéria, mas isso dificilmente se verificará por causa de insuficiências estruturais provocadas pelo desinvestimento.
E a OPEP+, que junta, desde 2017, para equilibrar os mercados, os 13 Países Exportadores liderados de facto pela Arábia Saudita, (OPEP) e 10 desalinhados encabeçados pela Rússia, já veio deixar claro que esta situação criada pelos europeus não vai levar o "cartel" a alterar os seus planos de parcimoniosa recuperação da produção "queimada" pela pandemia.
Esta decisão dos 27 chega num momento particularmente melindroso porque coincide com um forte aumento do consumo de combustíveis nos Estados Unidos e na Europa, onde o Verão no Hemisfério Norte leva, tradicionalmente, a aumentos gigantescos das deslocações em viatura das famílias, o que provoca sazonais picos de consumo de petróleo.
Todavia, este embargo europeu não é de efeito imediato, tendo o bloco dos 27 determinado que a redução das importações do crude russo terá efeito mais concentrado à beira do fim de 2022, sendo que não é a totalidade das importações que está em causa no âmbito do 6º pacote de sanções aplicadas pela UE a Moscovo, tendo o grupo ultrapassado o diferendo que havia com as reticências da Hungria, o mais sólido aliado do Kremlin na União Europeia.
Apesar deste aumento robusto de quase 4,5 USD por barril em relação ao fecho de segunda-feira, os analistas não esperam uma valorização mais proeminente porque os mercados já tinham absorvido esta turbulência e tiveram tempo para, nas últimas duas semanas, amortecer o impacto desta decisão.
É igualmente certo que, actualmente a oferta está menos pressionada porque a China, o 2º maior consumidor e o destacado maior importador do mundo, tem vindo a reduzir as suas importações devido aos severos confinamentos por causa da pandemia da Covid-19, e, agora, já a partir de 4ª feira, esses confinamentos vão ser substancialmente aligeirados, prevendo-se um aumento de consumo de crude e de importações.
Se a China não terá problemas de acesso à matéria-prima, porque a Rússia já virou, há algum tempo, a sua exportação para a Ásia, especialmente China e a Índia, conquistando estes mercados com fortes descontos, na Europa existe um risco de confronto com uma escassa disponibilidade de crude de substituição das importações russas, o que pode levar a uma crise de proporções abertas no futuro breve.
Para piorar o cenário, na perspectiva dos países consumidores, sendo uma bênção para os exportadores, como é o caso de Angola, com este delay para o final de 2022 do embargo ao crude russo, os mercados vão estar em permanente tensão até lá, o que pode ser uma espécie de barreira contra eventuais movimentos de descida dos preços forçados por razões económicas.
Uma das questões que mais queima neste momento é antecipar a reacção da OPEP+, que tem esta quinta-feira a sua reunião mensal para análise de mercado é realinhamento do seus programa de retoma da produção, onde não são esperadas alterações ao previsto, que é mais 430 mil barris por dia em Julho, deixando na mão as potências económicas ocidentais que estavam a exigir uma aceleração na recuperação da produção do "cartel" que é liderado pelos sauditas e pelos russos e que, aparentemente, mantêm uma sólida parceria na defesa dos seus interesses estratégicos sem cedências, como sucedia no passado, às pressões de norte-americanos e britânicos.
O petróleo já ganhou mais de 55% este ano, esmagando os valores conseguidos em mais de uma década, com excepção dos 139 USD a que chegou a 09 de Março, por apenas algumas horas.
Ainda o Sars CoV-2
Ainda a contribuir para o aumento do valor do barril nos mercados está a diluição dos confinamentos na China, cujo impacto do fecho de dezenas de milhões de pessoas em suas casas devido à Covid-19, especialmente nas cidades de Pequim e Xangai, mas noutros de menor dimensão também, está a chegar aos dados da economia do gigante asiático, que pode, segundo, a Bloomberg, pode, este ano, ver o seu PIB, que sempre cresceu acima de 6% nas duas últimas décadas, ficar agora mesmo abaixo dos 3%.
Isto é aterrador para os mercados porque a China é, de longe, o maior importador de crude enquanto segunda maior economia mundial, e a sua actividade económica repercute-se em todo o mundo de imediato, estando mesmo o Governo de Xi Jinping a elaborar um plano de estímulos à economia que pode chegar aos 3 triliões de dólares, para inverter este cenário de perda de robustez.
Entretanto, também a desvalorização do dólar norte-americano está a gerar condições para a valorização do barril, porque tem vindo, nos últimos dias, a perder valor depois de uma valorização recorde de quase duas décadas, o que leva a que os países compradores, que pagam, com poucas excepções, o crude em moeda norte-americana, tenham de usar menor volume das suas moedas para adquirir mais dólares devido ao seu desviçamento cambial.
A crise económica à espreita
Há uma grave crise económica à espreita por causa da guerra na Ucrânia, embora existam outras, como o próprio FMI admite, incluindo o risco de uma receção nos EUA, com valores de inflação históricos também na Europa, com a média a passar já os dois dígitos, com um desemprego galopante e encolhimento gritante do consumo.
Para já, os mercados estão a valorizar mais os riscos que resultam do encolhimento da oferta do crude russo e o aumento do consumo nos EUA devido a questões não directamente relacionadas com a economia, como as férias familiares de Verão.
E isso é hoje, 30, claro ao analisar os mercados, que sobem em média mais de 1%, coerentemente com dois meses de transacções em alta, apertados pela continuação de uma oferta estreita face à procura, que nem sequer a libertação de milhões de barris das reservas estratégicas dos EUA e de países aliados, como Japão e Coreia do Sul, está a ajudar a alargar, sofrendo ainda do efeito de recuperação - diluído, apesar de tudo, pela guerra na Ucrânia - permitida pelo fade out da crise pandémica.
Com este incandescente momento nos mercados, Angola é um dos países exportadores mais beneficiados, de acordo com a Fitch Solutions.
É-o porque o petróleo representa cerca de 95% do total das exportações nacionais, mais de 35% do seu PIB e até 60% das receitas fiscais que garantem o funcionamento do Estado.