Ao fim de cerca de oito horas de conversações, na cidade saudita de Jeddah, as comitivas norte-americana e ucraniana, lideradas pelos respectivos chefes das suas diplomacias, anunciaram na terça-feira, 11, que tinham chegado a um acordo para um cessar-fogo de 30 dias.
Acordo esse que deixou o Presidente norte-americano, Donald Trump, visivelmente satisfeito, tendo anunciado, em declarações aos jornalistas, que o conteúdo do acordo será agora transmitido à parte russa, afirmando-se crente de que Vladimir Putin vai aceitar parar a guerra, estando dispoto a vestir a farda de trabalho para convencer o seu "amigo" russo.
Segundo o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, que liderou as negociações pela parte americana, em conjunto com Mike Walts, conselheiro para a Segurança Nacional da Casa Branca, a informação detalhada chegará a Moscovo num prazo de 48 horas, máximo.
Rubio afirmou ainda que Washington aguarda que o Kremlin dê indicações sobre se concorda com as condições do Presidente Trump para um cessar-fogo, e então as negociações de paz mais concretas poderão começar, incluindo as garantias de segurança exigidas por Kiev.
Consciente de que os russos têm feito saber de forma persistente e consistente que não aceitam qualquer cessar-fogo sem um acordo de paz sólido e abrangente, que cumpra as suas condições (ver links em baixo), Marco Rubio deixou saber que nesse caso a paz ficará mais longe.
Esta manhã de quarta-feira, 12, os media russos ainda não tinham quaisquer reacções do Kremlin a este anúncio do acordo entre americanos e ucranianos para um cessar-fogo, mas a TASS noticia que o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, afirmou num canal nas redes sociais que Moscovo apreciou o facto de os americanos terem dito que estão disponíveis para "negociações sérias" com Moscovo.
A agência de notícias estatal russa nota ainda que Lavrov está satisfeito pelo facto de a Casa Branca ter percebido que a Rússia tem "interesses nacionais" e que não deixa a defesa desses interesses nacionais nas mãos de terceiros.
Esta afirmação é um toque claro no actual contexto, em que os americanos acordaram numa proposta de cessar-fogo de 30 dias com Kiev que vão agora apresentar ao Kremlin sabendo que a Rússia sempre disse que tal não estaria em cima da mesa sem um acordo de paz global abrangendo ainda questões sobre segurança europeia.
O facto de não haver ainda uma reacção oficial do Kremlin a este acordo Washington-Kiev de Jeddah mostra que o Presidente Putin está a desenhar uma resposta que não comprometa o processo de normalização das relações com os norte-americanos.
Mas deixa em cima da mesa como mais certo que o entendimento russo de que um cessar-fogo temporário, que não esteja assente num acordo de paz substantivo, não é uma ferramenta de trabalho aceitável perante os "interesses nacionais" da Rússia de que fala Sergei Lavrov.
Entre esses interesses nacionais está o facto de o Kremlin não esconder que acredita que qualquer paragem temporária das hostilidades servirá apenas para que os aliados europeus de Kiev encham os paióis ucranianos de armas para a retoma do conflito com maior vigor.
Ainda assim, o Presidente dos EUA veio rapidamente, e após o anúncio do acordo com os ucranianos, dizer que deverá falar de novo com Putin ao telefone nas próximas horas, mostrando-se optimista sobre a resposta dos russos.
"Espero que Vladimir Putin também concorde com este acordo e acho que isso será 75% do caminho para a paz definitiva. Estou com confiança que tal vai acontecer, mas as negociações terão ainda de passar pelas posições no terreno das partes... etc", disse Trump, acrescentando que se Moscovo não aceitar, "continuaremos o caminho" e "muita gente continuará a morrer".
Porém estas palavras de Trump são apenas a moldura para um esperado encontro entre delegações dos EUA e da Federação Russa que deverá ter lugar nas próximas 48 horas, havendo um sinal relevante emitido por Moscovo que é o facto de a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Maria Zakharova, ter dito que "não pode ser descartado um encontro" entre americanos e russos em breve.
E, segundo a RT, que cita fontes próximas do Kremlin, uma conversa telefónica entre Putin e Trump deverá ocorrer já esta sexta-feira, 14, num quadro em que o norte-americano tem repetido que se sente mais "à-vontade a negociar com Putin que com os ucranianos".
O dado negativo visível neste contexto é que os media russos estão a colocar em destaque nas suas páginas principais o ataque ucraniano com mais de 300 drones sobre cidades russas, incluindo Moscovo, dirigido apenas a zonas residenciais sem visarem quaisquer alvos militarmente relevantes, coincidindo com as conversações entre EUA e Ucrânia na Arábia Saudita.
O ministro dos Negócios Estrangeiros considerou mesmo que se tratou de um "ataque bárbaro e cobarde" contra civis num momento em que negociavam com os americanos as condições para um cessar-fogo.
Outro sinal que confere menos optimismo a este contexto negocial é que o Kremlin fez saber nas últimas horas que é avisado não ter um "optimismo cego" sobre o curso do conflito na Ucrânia.
O porta-Voz do Kremlin, Dmitri Peskov, citado pela Tass, sem uma referência clara ao processo negocial lembrou que os ucranianos estão a mostrar atitudes de quem está a preparar o seu país para mais "longos meses de guerra".
E disse ainda que as decisões tomadas pelos EUA sobre o apoio militar à Ucrânia, reduzindo o volume de armas enviado para Kiev e travado o fornecimento de intelligentsia, "não pode ser visto com óculos cor-de-rosa", numa alusão clara ao risco de excesso de optimismo sobre uma mudança de trilho no conflito, garantindo que em Moscovo "se espera o melhor preparando-se para o pior".