Numa declaração à Nação, o Chefe de Estado francês disse saber que os franceses estão preocupados com a ameaça russa e que a França e os europeus não podem agora ficar na condição de espectadores porque isso "seria um enorme erro".
Das palavras de Macron depreende-se que está convencido que o Kremlin quer mesmo fazer avançar as suas forças militares sobre o resto da Europa ocidental depois de conquistar a Ucrânia porque a invasão russa "não conhece fronteiras".
"A agressão russa não conhece fronteiras e não vai parar na Ucrânia e é uma ameaça directa à França e à Europa que se deve preparar para esse cenário" caso os Estados Unidos abandonem o seu compromisso histórico de aliado dos europeus face à ameaça de Moscovo.
"A paz só regressará à Europa com uma Rússia pacificada", disse ainda Macron, sem explicar o que quer dizer uma "Rússia pacificada", dando azo a múltiplas interpretações, como, por exemplo, a defesa da desmilitarização da Federação Russa, o que só pode ser concretizado através da sua inapelável derrota militar, o que daria às palavras do líder francês contornos de declaração de guerra.
Alguns analistas já consideraram estas palavras de Macron como uma fuga para a frente de forma a contornar as crescentes dificuldades políticas internas, onde a sua popularidade é mínima historicamente, além da crise económica que a França atravessa, ao mesmo tempo que demonstram que Macron procura emergir como líder da Europa.
Há ainda quem sublinhe que esta declaração inesperada de Emmanuel Macron visa criar o ambiente propício para que os povos europeus aceitem os gigantescos sacrifícios sociais que vão ter de suportar para encaixar o igualmente gigantesco investimento da União Europeia na Defesa.
Isto, depois de a líder da Comissão Europeia, a alemã Ursula Leyen, ter vindo, esta semana, falar da urgência de "rearmar a Europa" face à ameaça de os EUA retirarem o seu chapéu protector, anunciado um investimento de 800 mil milhões de euros em armas, o que vai gerar cortes históricos no sector social, na saúde e na segurança social dos europeus...
A alegada ameaça russa de invadir a Europa Ocidental, apesar de os media europeus repetirem exaustivamente estar à Rússia à beira do colapso económico devido à guerra, mostrando uma fragilidade clara ao não ter conseguido ocupar mais de 20% da Ucrânia em três anos de guerra, está, no entanto a servir de justificação para a transformação da economia europeia numa economia de guerra.
Isto, apesar de quem se opõe à ideia de que Moscovo é efectivamente uma ameaça, questionar como é que os russos vão avançar sobre a Europa ocidental se não conseguiram até agora mais de 20% da Ucrânia?
Entretanto, face a estas palavras de Macron, onde este defende que os europeus se devem preparar para a ameaça russa, em Moscovo, o Presidente russo, Vladimir Putin, num aparte durante um fórum sobre segurança, ironizou com a ideia de que Macron não conseguiu ainda ultrapassar a derrota humilhante de Napoleão ao tentar invadir a Rússia, em 1812.
"Algumas pessoas não conseguem esquecer o que aconteceu a Napoleão e querem regressar a esse tempo de Napoleão, mas parecem esquecer como é que este acabou", disse ainda Putin.
Menos irónico, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, sublinhou que o discurso de Macron foi altamente confrontacional", o que revela que Paris está a admitir a possibilidade real de uma guerra com a Rússia.
E o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, recuperando o tom irónico, comparou Macron a Napoleão, lembrando que a intempestividade do imperador francês do século XIX ao tentar invadir a Rússia levou ao seu desaparecimento político.
Esta resposta russa, que parece mostrar que o Kremlin não está a levar a sério as declarações de Macron, desviando a retórica para a ironia histórica, tem como pano de fundo o início do século XIX.
Foi quando, depois de ter conquistado quase toda a Europa Ocidental, Napoleão Bonaparte virou o seu Exército de 700 mil homens em armas para a Rússia do Czar Alexandre I, onde foi impiedosamente derrotado numa das maiores humilhações históricas da França, perdendo, segundo alguns registos, mais de 60% da sua força militar.
Na sua aparição televisiva, o Presidente da França defendeu ainda o reforço do apoio militar da Europa à Ucrânia de forma a tapar o buraco deixado pelo fim do apoio norte-americano decidido pelo Presidente dos EUA, Donald Trump.
Isto, ainda depois de o Kremlin ter rejeitado cabalmente a proposta de cessar-fogo parcial feita pelos franceses e britânicos que contemplaria a paragem dos ataques mútuos às infra-estruturas energéticas, e os ataques realizados pela aviação e a partir do mar.
A Rússia mantém a exigência de um acordo de paz alargado e sob as suas condições (ver links em baixo) como única forma de parar as hostilidades.
EUA e Ucrânia procuram base de entendimento
Entretanto, depois do quase corte de relações entre Washington e Kiev, com a desastrosa visita de Volodymyr Zelensky à Casa Branca, na semana passada, e com a garantia do Presidente ucraniano que afinal vai assinar o acordo sobre a exploração de minerais ucranianos pelos EUA, os dois países voltam a aproximar-se.
O primeiro passo foi já dado com o anúncio de um encontro na Arábia Saudita entre negociadores norte-americanos e ucranianos, tendo o encontro sido anunciado por Steve Witkoff, o enviado especial de Donald Trump para o Médio Oriente.
Nas suas declarações aos jornalistas, Witkoff explicou que a agenda deste encontro terá como temas cimeiros a questão do acordo de paz e um inicial cessar-fogo.
Sobre este encontro, o Presidente americano disse que ele vai ter lugar tendo em conta que os ucranianos querem um acordo de paz "porque não têm escolha" e os russos, por razões diferentes, que diz serem apenas do seu conhecimento, "também não têm escolha".
Segundo os media, no encontro de Riade vão estar o chefe da diplomacia dos EUA, Marco Rubio, o conselheiro para a Segurança Nacional, Mike Waltz, e o Chefe de Gabinete de Zelensky, Andrey Yermack.
Uma das razões pelas quais o acordo dos minerais com os EUA pode contribuir para acelerar um acordo de paz é, segundo Trump, o facto de, quando as equipas estiverem no terreno, ninguém se atreverá a atacar essas áreas.
Porém, ao que se sabe e é público, quase todas as áreas mineiras de interesse, incluindo as de "terras raras", fundamentais para as indústrias de tecnologia 2.0, estão ou nos territórios já na posse dos russos ou nas regiões anexas em 2022, Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporizhia, mas com áreas ainda sob controlo ucraniano.
O grande risco, considerando as palavras de Trump, é se ocorrer um ataque russo sobre as áreas em exploração pelos norte-americanos...