Neste momento, apesar de ser o primeiro interessado em correr com Zuma do poder porque quando isso acontecer é ele que assume a Presidência da República, Cyril Ramaphosa parece estar interessado em não humilhar excessivamente Jacob Zuma e tem, nas últimas horas, mantido com ele conversas que sublinhou como importantes e substanciadas na procura de soluções céleres para o problema, o que a imprensa sul-africana está a traduzir por "transferência de poder".
Tanto Ramaphosa como Zuma, segundo o primeiro, têm consciência da urgência de ultrapassar esta fase complexa da vida política na África do Sul, até porque como têm notado alguns analistas, esta contém os ingredientes suficientes para poder resvalar, deteriorando a solidez das instituições do Estado e revelar-se como a pior crise desde que em 1994 o país realizou as primeiras eleições democráticas do pós-apartheid.
Recorde-se que a densidade dos horrores que Zuma está a viver aumentou nos últimos dias com a saída a terreiro da Fundação Mandela para pedir a sua cabeça, o que é muito importante para este desfecho tendo em conta que juntou o nome do histórico líder a esta incandescente situação política.
Face a tudo isto, na África do Sul a questão já deixou de ser se Zuma abandona o poder antes das eleições de 2019 para passar a ser, em que dia desta semana ou da próxima anuncia a sua saída ou permite que os seus "inimigos" o façam por ele.
Por detrás desta humilhante situação para Zuma, perseguido em todas as frentes e sem apoio minimamente sólido no interior do seu partido, estão longos anos de suspeitas, essencialmente de corrupção, praticamente desde que assumiu o cargo de PR, em 2009, mas também de peculato e de violação.
Quem é Jacob Zuma?
O ainda Presidente da África do Sul, com 75 anos, é um veterano das lutas políticas sul-africanas e um dos homens das primeiras linhas de combate ao apartheid, regime político assumidamente racista, com a segregação racial como lei, que vigorou no país entre 1948 e 1991.
Desde finais da década de 1950 que Zuma tem actividade política registada, integrando o ANC em 1959, passou depois, em 1963, para o Partido Comunista da África do Sul (SACP), após o ANC ter sido banido pelo regime.
Nesse mesmo ano foi detido, por conspirar contra o regime racista, e é enviado para a cadeia de Roben Island, onde encontra, por exemplo, Nelson Mandela.
Esteve preso 10 anos e quando saiu, reintegrou o ANC com outro peso político depois de ter estado com Mandela e outros seniores do partido em Roben Island.
Em 1975 deixa o país e continua a luta contra o apartheid a partir do exterior, em países como Moçambique, apoiando e recebendo outros exilados, conhecendo nestas andanças, na Suazilândia, Thabo Mbeki, o homem que viria a destronar do ANC em 1977 e a quem ajudou a sair da Presidência da República pela porta dos fundos, tal como lhe está a acontecer a ele, de forma agravada, actualmente.
Entra para as estruturas maiores do ANC em 1977, no comité executivo nacional, e foi o representante oficioso do ANC em Moçambique durante vários anos.
As acusações que sobre ele pendem
Em 2005 foi acusado de corrupção num negócio que envolveu milhões de dólares ocorrido em 1999, tendo a acusação sido retirada pouco antes de ter sido eleito Presidente, em 2016 teve dois casos pesados, com um tribunal a ordenar a acusação por 18 crimes de corrupção e por usar dinheiro do Estado (peculato) para obras numa das suas casas privadas, e em 2017 a justiça sul-africana fez regressar o caso que envolve Zuma e a poderosa e multimilionária família Gupta. Actualmente corre um inquérito sobre esta questão.
Perante a lista de acusações e o que pode surgir após a sua saída do poder, alguns analistas admitem que estejam em curso negociações semelhantes às que tiveram lugar no Zimbabué com a saída imposta a Robert Mugabe, que assinou um acordo para resignar que lhe garante, e à sua família, total impunidade para todas as acusações, bem como a manutenção da fortuna acumulada nos longos anos de exercício de poder, parte dela comprovadamente ilegal.