Num contexto em que centenas de compatriotas nossos já se tornaram emigrantes ou deslocados climáticos devido a eventos como seca ou inundações que tornaram as suas zonas de origem em um mau lugar para se viver, é justo que se pergunte... Quantos dos nossos concidadãos têm noção desta triste realidade? O nosso clima já está a mudar e o impacto tem vindo a ser sentido, de modo muito duro, por muitas pessoas. Estima-se existir no mínimo um milhão de pessoas pobres e vulneráveis na região Sul de Angola. Assim, ao mesmo tempo que investimos num futuro auspicioso, por meio de projectos como os Planagrão, Planapecuária, Planapesca e tantos outros destinados a aumentar a produção e tornar Angola naquele país próspero, com que sempre se sonhou, temos de investir simultaneamente na criação de capacidades para que as comunidades locais estejam mais bem adaptadas e sejam muito mais resilientes aos impactos das alterações climáticas, porque adaptação e resiliência, num contexto de alterações climáticas, são duas faces da mesma moeda.

Por mais que se diga que, em Angola, estamos a investir e a construir um futuro, em que a economia seja mais diversificada e pouco dependente da exportação de petróleo bruto, gás natural e da extracção de variados recursos naturais, temos de perceber que todo este investimento pode ficar comprometido ou trará benefícios limitados lá onde não existem comunidades e pessoas resilientes às alterações climáticas, para que estejam mais bem preparadas para lidar com os impactos climáticos actuais e futuros. Estes impactos - estiagem prolongada, chuvas excessivas ou escassez, destruição de infra-estruturas vitais, interrupção do abastecimento de alimentos e água, inundação de casas, escolas e hospitais - afectam desproporcionadamente os mais pobres e vulneráveis. Por isso considero importante e oportuno que, o Executivo Angolano defina uma estratégia para impulsionar todos os esforços que se fazem no País em matéria de adaptação e resiliência às alterações climáticas. Para tal, bastava que tentasse estabelecer três áreas de foco: Em primeiro lugar, aumentando o financiamento directo às medidas de adaptação, assumindo com muita assertividade e coragem uma postura que coloca financiamento em medidas de adaptação ao mesmo nível dos nossos investimentos na atenuação dos impactos das alterações climáticas. Ou seja, ao invés de gastar enormes quantidades de dinheiro com medidas assistencialistas, tais como doações de bens de primeira necessidade, instalação de campos de refugiados, fornecimento de água, deveria actuar antes mesmo que os eventos dessem lugar a catástrofes.

Em segundo lugar, apoiar os municípios e governos provinciais que adoptarem uma abordagem integrada à adaptação, de modo que os riscos climáticos sejam geridos em todas as fases do planeamento de políticas, concepção de investimentos e implementação e não apenas no momento em que a desgraça acontece e o drama das vítimas seja mediatizado.

Em terceiro lugar, já é tempo do País desenvolver um conjunto de incentivos para investimentos, em adaptação e resiliência às alterações climáticas, de modo a permitir que mais actores, sobretudo do sector privado e de organizações não-governamentais, se sintam também atraídos a apoiar estas abordagens e não ficarem apenas seduzidos a actuarem quando a situação atinge extremos e se torna mais mediatizável a ajuda que prestam às populações, num verdadeiro show de caridade e assitencialismo.

Para enfrentar com êxito o desafio da adaptação e da resiliência, é imprescindível que se trabalhe com os governos locais, o sector privado, instituições académicas, organismos multilaterais e bilaterais de cooperação, a sociedade civil e as famílias mais vulneráveis na identificação das estratégias mais eficazes e na busca das melhores soluções para enfrentar os desafios inerentes às alterações climáticas. É vital que façamos da adaptação e da resiliência uma prioridade nacional.

Seria bom que cada um dos nossos líderes políticos, independentemente da formação política, devesse estar pessoalmente empenhado em criar uma consciência nacional da urgência crítica de agir, por meio do trabalho e da posição que exerce. A adaptação é importante, cabe a cada um de nós fazer tudo o que estiver ao alcance para fazer face às alterações climáticas e aos seus impactos devastadores. Estou convencido que se não o fizermos, os eventos resultantes deste fenómeno não perdoarão. Vamos mesmo esperar para depois apostar nas lamentações e no show de caridade típico das oportunidades mediáticas que o assistencialismo às vítimas das catástrofes naturais sempre facilitaram?

*Coordenador OPSA