Viajar para a Lunda-Norte por terra passando por Malanje não é apenas uma aventura, mas também um martírio, sobretudo nesta época chuvosa. De Luanda a Malanje, o trajecto faz-se sem grandes sobressaltos, devido ao razoável estado da via, mas depois desta última localidade em direcção ao Cuango "é um Deus nos acuda". A estrada é tão péssima que, às vezes, ficamos com a sensação de que há" mais buracos do que asfalto. Em muitos troços da via, o tapete asfáltico desapareceu totalmente e deu lugar à terra avermelhada, à lama.

O trajecto de 212 km que separa Malanje o Cuango é feito em 10 cansativas e penosas horas quando, em circunstâncias normais, a viagem não duraria mais de três horas.

Nesta fase do ano, o "fiscal" de obras, ou seja, as chuvas copiosas que se abatem sobre a região, trouxeram à superfície as debilidades das estradas, a má qualidade das obras, e as ravinas adormecidas ganharam corpo colocando em per- manente perigo à segurança rodoviária.

O motorista da Macon, uma empresa privada de transportes rodoviários, conduz com redobradas cautelas o autocarro que nos leva em direcção ao Cuango. À aproximação aos inúmeros buracos, leva os travões a fundo, mas nem com isso consegue evitar o impacto da depressão, numa estrada traiçoeira e polvilhada de armadilhas.

Pachorrento, o autocarro percorre vagaroso, abana a sua passagem, mas as hipóteses de fugir aos buracos e "crateras" são diminutas, apesar da perícia e da precaução do condutor.

Cada quilómetro da Estrada Nacional (EN) 230 tem uma história por contar. Às vezes, dolorosa e trágica, como foi a que aconteceu com o camião que, saído de Luanda, carregado de cimento tombou na via quando o motorista tentava desviá-lo de um buracão. Em desequilíbrio, o veículo pesado cedeu ao peso e tombou para um dos lados. Felizmente, o acidente não resultou em danos humanos, mas causou inúmeros prejuízos materiais.

Os automobilistas nas várias regiões das Lundas não se queixam apenas das péssimas condições das estradas, como também das cobranças ilegais feitas nos vários controlos policiais montados, onde cada viatura é obrigada a pagar 500 Kz nos "checks points".

Armando Dinis Muachicange, responsável da Associação dos Taxistas do Cuango, é um homem visivelmente revoltado e triste. Conhece como poucos as distintas estradas da província. Chamado a comentar o estado das vias, diz à nossa reportagem que as estradas, na sua generalidade, encontram-se em péssimas condições de circulação e que, apesar dos vários apelos para a sua reparação, os órgãos do poder local pouco ou nada têm feito. Ele acredita que o abandono das vias pode estar relacionado com o facto de os responsáveis e funcionários da Administração usarem a chamada "estrada da Mina, uma via alternativa", à qual o povo não tem acesso.

O responsável associativo crê^ que se todos usassem a mesma via, ou seja, "as estradas do povo", o cenário seria menos doloroso. "A separação faz com que eles não estejam preocupados em arranjar as estradas onde circulam os nossos carros que transportam o povo."

Sobre a cobrança de "gasosas" nos vários postos policiais montados nas vias, Armando Muachicange mostra-se indignado com facto de tais cobranças serem feitas à margem da lei, visto que os "taxistas pagam os impostos ao Estado e têm as suas viaturas legalizadas", lamenta. E adiciona: "Não dão nenhum papel que prove que a cobrança é legal".

A indignação aumenta de tom quando se refere às avarias constantes das viaturas devido ao "péssimo estado" das vias. "Não há" acessórios e peças sobressalentes e os carros são assistidos de dois em dois dias", acrescentou. Lamenta o facto de as empresas de exploração de diamantes não investirem os seus lucros na melhoria das condições de vida das populações. Diz que, para além das avarias constantes nos carros, os taxistas têm de suportar ainda a dor das "gasosas", pelo que chegam a pagar diariamente 1.500 kwanzas.

Em jeito de conclusão, Armando Dinis Muachicange denuncia: "Aqui na Lunda- -Norte não há" livre circulação de pessoas e bens".

Adormecer ao som dos geradores

O Cuango acorda tal como adormecera na véspera: ao som dos geradores, barulhentos e poluentes, que, à falta de energia elétrica da rede pública, têm suprido as carências energéticas em algumas residências e na única pensão do município.

A escuridão passeia-se pelas ruas e pelos bairros. Das 18 às 6 horas do dia seguinte, o barulho ensurdecer dos geradores toma conta do pequeno município que parece

perdido no tempo e espaço. Para os visitantes, é como se o mundo terminasse aí, rendido aos pés do Cuango. Apesar de o município possuir um rio com excelente debito, o Cuango - um dos afluentes do majestoso rio Congo - não dispõe de uma única fonte energética hídrica, ou seja, uma barragem, por mais pequena que seja.

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