Os problemas que o sector petrolífero acumulou nos últimos anos devido ao forte desinvestimento em novas pesquisas, à degradação da infra-estrutura petrolífera por falta de manutenção adequada e o desinteresse dos investidores, está a impedir o País de colher os benefícios da alta actual do crude nos mercados internacionais, sublinha a mais recente nota da Capital Economics, uma consultora com sede em Londres e que há alguns anos começou a avançar com análises à economia nacional.
De acordo com esta consultora britânica, o problema não está confinado à debilidade da produção nacional, vai muito além disso, porque os elevados preços da matéria-prima nos mercados internacionais está a encarecer fortemente os combustíveis que o País importa em grande quantidade devido à sua fraca capacidade interna de refinação.
"Os problemas na produção na Nigéria e Angola vão provavelmente impedir que os maiores produtores na África subsaariana beneficiem da recente recuperação nos preços, mas noutros locais, os preços elevados vão aumentar a conta das importações e aumentar as pressões sobre a inflação", escreveu a analista Virag Forizs, citado pela Lusa.
Quase ao mesmo tempo, a norte-americana FItch Solutions, que integra o mesmo grupo da agência de notação financeira FItch Ratings, avançou que reviu em baixa as perspectivas da economia nacional para 2021, antecipando agora uma recessão de 1,5 por cento contra um crescimento de 2,2 na anterior previsão.
Esta revisão em forte baixa aponta para 2022 uma subida de 2,7%, sendo, ainda assim, menos que os 3,3% anteriores.
As razões para esta diluição do vigor económico nacional apontadas pela Fitch Solutions vai no mesmo sentido das razões apontadas pela Capital Económics: a degradação da capacidade de resposta do sector petrolífero, que, recorde-se, já tinha sido exposta quando o País não foi capaz, sequer de dar resposta imediata ao aumento da sua quota no seio da OPEP e no âmbito do plano de elevar a produção do "cartel" em 400 mil barris por dia mensalmente até Dezembro.
Na nota aos clientes da FItch Solutions citada pela Lusa, esta consultora aponta no sentido de uma contracção do Produto Interno Bruto (PIB) real de 1,5% este ano, antes de crescer 2,7% em 2022, "o que é uma revisão em baixa face à nossa previsão anterior de um crescimento de 1,7% este ano e de 3,3% em 2022".
Esta revisão é justificada com "as novas previsões sobre a produção petrolífera", ou seja, para 2021 a produção média vai acabar em 1,25 milhões de barris por dia e 1,31 milhões em 2022, o que contrasta com a previsão anterior de 1,33 milhões este ano e 1,43 milhões no próximo ano.
"Isto acontece devido à expectativa do Governo de que alguns projetos entrem em funcionamento no segundo semestre deste ano, o que pode providenciar um modesto apoio à produção, que está em dificuldades", argumentam os analistas da Fitch.
Em 2022, os novos projetos da TotalEnergies e da BP, que foram adiados devido aos efeitos da pandemia de covid-19, vão ajudar a fazer a produção recuperar, conclui-se na nota da Fitch Solutions.
Além da revisão em baixa para este ano, que faz com que Angola enfrente o sexto ano consecutivo de recessão desde 2016, a Fitch Solutions aponta também que a média de crescimento da economia vai estar consistentemente abaixo da média de crescimento da região até final desta década.
"O PIB de Angola vai crescer 2,6% em média entre 2021 e 2030, abaixo da média a 10 anos para a África subsaariana, que é de 3,7%, devido ao crónico subinvestimento nos poços petrolíferos envelhecidos, que teve um efeito irreversível no setor petrolífero do país, e dificilmente Angola conseguirá regressar aos níveis de 1,5 milhões de barris diários registados antes da pandemia", concluem os analistas.
A nova previsão da Fitch Solutions surge dias depois de o Fundo Monetário Internacional ter revisto em baixa a estimativa de crescimento de Angola, apontando para uma recessão de 0,7%, e também na mesma altura em que o Governo baixou a previsão para um valor próximo de zero, com a ministra das Finanças a admitir que uma nova recessão este ano é possível.
A Capital Economics "dança" pelo mesmo diapasão
O País enfrenta não só o problema que resulta da sua incapacidade de usufruir dos vastos recursos proporcionados pelo actual momento dos mercados devido à sua perda de capacidade de produção acentuada nos últimos dois anos devido à pandemia mas que já estava devidamente identificada a partir de 2014, como ainda perde pelo lado da alta dos combustíveis refinados que adquire nos mercados internacionais devido à insuficiente capacidade da sua única refinaria.
Alias, a analista da Capital Economics para os mercados africanos, Virag Forizs, nota mesmo que Angola, e também a Nigéria, integram o grupo de países que estão a ajudar à subida dos preços por causa da sua incapacidade de suprir as suas obrigações no seio da OPEP, que precisa do crude destes dois membros para aumentar a produção global do "cartel".
Quando Angola e a Nigéria tiverem resolvido o problema da produção escassa, nessa altura, provavelmente, os preços do barril estarão já em sentido descendente, o que implica que ambos os países terão visto passar uma oportunidade que pode não se repetir de amealhar os milhões que fazem falta para financiar a urgente diversificação das suas bases económicas.
Os dois países "deverão ver a produção aumentar durante o próximo ano, mas esse impulso será anulado pela queda nos preços do petróleo, por isso, de uma maneira ou de outra, os problemas no sector vão atrasar a recuperação nos principais produtores africanos", disse ainda a analista.
Por outro lado, o resto da região, aponta, "vai enfrentar despesas de importação e custos energéticos maiores, o que aumenta as pressões sobre a inflação", dando como exemplo a África do Sul, país onde a componente dos transportes foi a que mais contribuiu para a inflação na economia mais industrializada da região.
Crude, vale mesmo "ouro"
A tendência de alta no negócio do petróleo nos principais mercados é clara e não deve inverter tão cedo, porque a procura, com o diluir dos efeitos da pandemia da Covid-19 nas grandes economias globais e a chegada do Inverno ao hemisfério Norte estão a fazer aumentar o consumo de energia.
Com o mundo a assistir à consolidação do fim da mais severa crise económica em largas décadas, o petróleo, que foi a matéria-prima que mais sofreu com o surgimento da Covid-19 no início de 2020, está agora a recuperar a passos largos à medida que as grandes economias mostram sinais evidentes de recuperação, como é o caso dos EUA, da União Europeia, China, Índia... sendo, precisamente o alto preço dos combustíveis a ameaça mais directa a essa recuperação.
O barril de Brent, vendido em Londres, que norteia a evolução do valor das ramas exportadas por Angola, referente a contratos para Dezembro, estava hoje, perto das 10:30, hora de Luanda, a valer 85,53 USD, menos 0,50% que no fecho da anterior sessão, enquanto em Nova Iorque, no WTI, valia, à mesma hora, com contratos para Novembro, 83,22, menos 0,60%.
A valorização registada nos últimos dias, que não é diluída de forma significativa com a deve-se a um acelerado aumento da procura de combustíveis nos Estados Unidos, que, aliado à escassa oferta, tem estado a esvaziar os stocks norte-americanos, o que é um sinal para os mercados de que a matéria-prima é, cada vez mais, valiosa.
Os EUA são o maior consumidor global de petróleo e os valores actuais de combustíveis debitados pelas refinarias que alimentam o sector automóvel e o sector industrial não têm parado de subir, com um efeito esvaziador das reservas do país, apesar de a indústria extractiva ligada o fracking estar a tentar responder com uma crescente reabertura de unidades que foram encerradas em 2020 devido à crise pandémica.
Em fundo, os factores determinantes para a valorização continuam presentes, como seja a saída da crise pandémica com a crescente vacinação em todo o mundo, embora mais lenta nos países pobres, especialmente os africanos, e o apertado e, aparentemente, inamovível programa de retoma da produção na OPEP+, a organização que junta os 13 Países Exportadores (OPEP) e 10 aliados, com a Rússia à frente, que desde 2017 unem esforços para manter o mercado equilibrado.
Este programa de cortes e retoma da OPEP+ tem como marca determinante a manutenção de aumento de produção de 400 mil barris por dia mensalmente, até Dezembro, tendo começado em Julho, embora as grandes economias, como a União Europeia, esta a viver uma severa crise por causa do elevado preço do gás natural, e os EUA, mantenham uma pressão assinalável para que o "cartel" aumente de forma mais robusta a sua produção diária.
Note-se que os actuais preços são de modo a proporcionar uma interessante folga nas contas públicas nacionais porque o OGE 2021, em vigor, foi elaborado com o barril a um valor médio de referência de 39 USD, o que leva a que os actuais 86 permitam uma folga relevante.
Angola tem ainda nas exportações de crude um pilar estrutural da sua economia, valendo mais de 95% das exportações, 60% do dinheiro gasto pelo Estado e mais de 30% do seu PIB.