Este aumento da gravidade das acusações sobre Derek e os outros três agentes do Departamento de Polícia de Minneapolis, estado do Minnesota, que estiveram envolvidos, na terça-feira da semana passada, na morte de George Floyd, quando anteriormente apenas foram, o principal arguido, acusado de homicídio por negligência e os restantes apenas alvos de despedimento compulsivo, deveu-se à resistência nas ruas de mais de 70 cidades dos EUA onde milhões de pessoas clamam sem cessar por garantias de que não morrem mais negros às mãos da polícia de forma injustificada.
O delegado do Ministério Público do Minnesota, Keith Ellison, veio a público dizer que os desenvolvimentos no processo judicial, que implicam agora de forma severa os três colegas de Chuavin - Tou Thao, Thomas Lane e Alexander Kueng - contra os autores do homicídio de Floyd são "claramente no interesse da justiça, da sua família e da comunidade".
Mas o que está igualmente claro nove dias passados daquele momento de terror onde o mundo assistiu quase em directo à morte de um negro de 46 anos sob a força bruta de um polícia branco, de 44 anos, é que milhões e milhões de norte-americanos, de todas as raças e credos, querem acabar em definitivo com um ciclo de décadas onde periodicamente negros morrem sem razão alguma por disparos ou agressões violentas de polícias.
Barack Obama, mais um na rua
Entre os milhões de americanos, e muitos milhares em dezenas de cidades no resto do mundo, está agora o ex-Presidente dos EUA, Barack Obama, que optou por não ficar calado e, na quarta-feira, saiu a terreiro para agradecer aos jovens negros dos EUAe para os incitar a "sentirem-se esperançados mesmo que se sintam furiosos".
O que Obama pretendeu dizer, e disse-o, foi que sente que estão a chegar "tempos novos e diferentes", explicando que a vaga de protestos em curso pela morte de Floyd e a pandemia da Covid-19 são antecâmaras de "profundas e épicas mudanças" nos EUA, assegurando que serão de tal dimensão que "nunca foram vistas" ao longo da sua vida.
"Eu sei o suficiente para perceber que há algo de novo aqui", disse o ex-Presidente, sublinhando que esta vaga de manifestações é diferente, mais pesado e definitivo, que nas ocasiões anteriores onde também negros morreram por acção policial, apontando mesmo este momento como mais importante que as lutas pelos direitos civis da década de 1960, porque, justificou, "existe hoje uma muito mais abrangente coligação e representação social a manifestar-se nas ruas por mudança de forma pacífica".
E, perante o papel dúbio do Presidente Donald Trump, que tem feito sucessivas ameaças em tom considerado inadequado para a responsabilidade que o cargo exige, incluindo a de mandar o Exército para as ruas de forma a travar os protestos como se fossem uma guerra, Barack Obama, sem pronunciar o seu nome, aproveitou para dizer aos milhões de norte-americanos que essa mudança que antecipa pode ser ainda mais célere se as eleições Presidenciais de Novembro forem aproveitadas pela substituir o actual inquilino da Casa Branca por um Democrata.
Um exemplo da forma pouco "Presidencial" como Trump se tem comportado aconteceu na terça-feira, quando decidiu mandar as suas forças de segurança e os serviços secretos limpar a Avenida Pennsylvania, em Washington, onde está situada a Casa Branca, a sua residência oficial, que estava pejada de milhares de manifestantes, para a atravessar e ir à igreja no outro lado da via, onde ergueu uma Bíblia em direcção aos manifestantes, um gesto do agrado do seu eleitorado conservador.
O momento foi aproveitado pelo Democrata Joe Biden para lhe mandar um recado iminentemente político e de campanha eleitoral, elevando a questão para um nível mais denso politicamente: "Em vez de empunhar a Bíblia, o Presidente Trump devia antes procurar ler a Bíblia".
Entretanto, na moldura mais alargada deste movimento global face à violência policial contra os negros norte-americanos, sustentada com as iniciativas sociais geradas nas comunidades afro-americanas, como a "Black Lives Matter" ou ainda a mais recente, "I Can"t Breathe", ou seja, "a vida dos negros são importantes" ou "eu não consigo respirar", as derradeiras, a par de "mãe", palavras de Floyd quando a sua vida se desvanecia no asfalto de uma estrada de Minneapolis, continua a alargar-se a cada vez mais cidades do país e do mundo.
Por detrás deste recrudescer dos protestos está a convicção de que dificilmente a sociedade norte-americana terá outro momento tão propício para mudar de paradigma, para alterar a lei e a mentalidade que permita à sociedade mudar a forma como tem lidado com este problema de muitas décadas, que, na história do século XX ficou moldada de forma mais saliente pela forma brutal como foram mortos, às mãos de polícias brancos, alguns jovens negros que integravam os movimento cívicos e de luta pelos direitos civis nas décadas de 1950 e 1960.
Essa luta acabou por conduzir à famosa "Civil Rights Act - Lei dos Direitos Civis", de 1964, que foi proposta pelo Presidente John Kennedy, em 1963, mas, por ter sido assassinado, acabou por ser o seu sucessor, Lyndon Johnson, a pugnar pela sua aprovação e que Barack Obama considera que pode agora ser agora ultrapassada em consequências positivas para a sociedade norte-americana no seguimento destes protestos.
E, no entanto, esta lei, a "Civil Rights Ac" foi uma fronteira clara entre dois períodos distintos na história dos EUA, proibindo a discriminação racial, religiosa, cor ou origem geográfica, em ternos laborais, retirando quaisquer distinções raciais em matéria de emprego, voto, de ensino, de alojamento... nos Estados Unidos da América.
E o que os milhões de norte-americanos nas ruas exigem hoje é que a sociedade seja capaz de impor aos políticos uma ferramenta legislativa que tenha o mesmo tipo de influência para a mudança no quer toca ao uso da força policial contra as minorias que a Civil Rights Act teve contra a discriminação racial sobre os direitos civis a partir de 1964.